Governo decide que não vai enviar a reforma administrativa ao Congresso
Alessandra Azevedo
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Jefferson Rudy/Agencia Senado Fernando Bezerra Coelho disse que o presidente da
Câmara prefere que o governo apresente a proposta Sem sinais encorajadores por
parte do Congresso, o governo ensaiou, pelo menos por agora, recuar da
ideia de enviar ao parlamento a reforma administrativa, prometida desde
o ano passado. O desânimo do Executivo é, em parte, reação à falta de interesse
dos parlamentares, que preferem evitar mais um tema impopular depois do
desgaste com a reforma da Previdência. A vontade do governo ficou ainda menor
após novos ataques do ministro da Economia, Paulo Guedes, aos
funcionários públicos, o que pode resultar em novo adiamento no envio da
proposta, caso ela prospere.
Além disso, desde o começo do ano, deputados e
senadores alegam que, às vésperas das eleições municipais, não é um bom momento
para mudar as regras do serviço público, especialmente quanto ao fim da
estabilidade. O líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO) disse,
porém, que ainda é muito cedo para falar sobre os próximos passos da reforma
administrativa. “Eu não daria o caso como encerrado”, afirmou. Para ele, o que
aconteceu foi mais um ajuste de timing político, que provocou outro adiamento
do envio. Afinal, diante do desgaste gerado por Guedes, não fazia sentido
encaminhar a matéria. “Nesta semana, não tem clima. Mas daqui a uma ou duas
semanas... Eu não apostaria na desistência”, afirmou Gomes.
Por sua vez, o líder do governo no Senado, Fernando
Bezerra Coelho (MDB-PE), negou a possibilidade de recuo e reafirmou, nesta
terça-feira (11/2), que a intenção ainda é levar o assunto ao parlamento.
Segundo o senador, a equipe econômica até cogitou a possibilidade de que as
diretrizes fossem incluídas em alguma proposta de emenda à Constituição (PEC),
já em andamento no Congresso, para acelerar a tramitação, mas a ideia acabou
descartada.
Bezerra ressaltou que o presidente da Câmara,
Rodrigo Maia (DEM-RJ), prefere que o governo apresente a proposta. Na
quinta-feira passada, o deputado disse que a condução das reformas não pode
ficar “nas costas do parlamento”. Em geral, deputados e senadores comentam que
o ônus de levantar o assunto, bastante impopular, deve ser do Executivo. E, se
o governo não assumir o risco, não haverá reforma administrativa neste ano.
“Com tanto movimento contra, é muito difícil que um tema desses avance em ano
eleitoral”, resumiu o deputado Marcelo Ramos (PL-AM).
A boa vontade do Congresso diminuiu ainda mais
depois das críticas do ministro da Economia aos servidores. Na semana passada,
o chefe da equipe econômica os classificou de “parasitas”. O comentário gerou
uma onda de protestos, que chegou ao plenário da Câmara, nesta terça-feira
(11/2). O pedido de desculpa posterior não foi suficiente para apaziguar os
ânimos, e a movimentação contra Guedes — e, por extensão, aos projetos defendidos
por ele — tomou força nos últimos dias.
Sem previsão
Apesar de reiterar que o governo vai
levar para a frente a proposta, Bezerra não cravou uma data de envio. De acordo
com ele, a PEC precisa ser encaminhada em duas semanas para que tenha condições
de ser aprovada até julho, antes do recesso parlamentar. Depois, a
probabilidade de avançar é ainda menor, com as eleições de outubro. “A minha
expectativa é de que chegue na próxima semana”, afirmou o líder do governo no
Senado.
Alguns parlamentares e técnicos do Ministério da
Economia ainda defendem que seria menos desgastante colocar alguns pontos no
parecer da PEC que cria gatilhos para casos de dificuldade no cumprimento do
teto de gastos.
Coordenador da Frente Parlamentar Mista do Serviço
Público, o deputado Professor Israel (PV-DF) se mostrou esperançoso com a
eventual desistência da proposta, ou, pelo menos, com uma possível rodada de
desidratação. “Tudo ainda é muito nublado, mas, como a nossa reação à fala de
Guedes foi muito forte e a avaliação das redes sociais também negativa para o
governo, eles podem ter percebido que foi um tiro no pé”, afirmou.
Regra de Ouro
Uma das matérias que receberiam pontos
da reforma administrativa seria a PEC da Regra de Ouro, que prevê gatilhos de
ajuste fiscal como a suspensão temporária das promoções e do reajuste do funcionalismo
em caso de crise fiscal. O autor dessa PEC, o deputado Pedro Paulo (DEM-RJ),
que tem bom trânsito com a equipe econômica disse, contudo, que ainda não
conversou com o governo sobre isso e mostrou resistência à proposta. “É
complicado colocar um tema complexo de carona em outro”, ponderou.
“Fizemos a nossa
parte”. Esse é o sentimento dentro da equipe econômica, ante a decisão do governo de travar o envio da proposta de PEC da reforma
administrativa.
Diante do recuo, o
ministro da Economia, Paulo Guedes,
e seus assessores mais próximos, reforçam a interlocutores o discurso de que a
proposta de reforma está pronta desde o fim do ano passado e que foi entregue
ao presidente Jair Bolsonaro.
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Para a equipe de
Guedes, a proposta é necessária, mas o “timing” e a estratégia para o envio,
agora, estão nas mãos do presidente.
O Palácio do
Planalto admite que a decisão de enviar ou não o texto está diretamente
relacionado à proximidade das eleições municipais, em outubro.]
© Helvio Romero/Estadão O ministro
Paulo Guedes em evento sobre a agenda ecômica em São Paulo.
A reforma
administrativa é hoje considerada a mais difícil, devido ao
poder de pressão e mobilização dos servidores no Congresso. Guedes mantém a
estratégia que coloca a reforma administrativa como um dos principais pilares
do ajuste fiscal em curso. Ele tem procurado mostrar ao presidente que a
reforma tem apoio de 88% da população.
Essa não é a
primeira vez que o governo recua em relação ao tema. No fim de novembro do ano
passado, o Palácio do Planalto adiou o envio da proposta com temor de
manifestações e resistências no Congresso. Bolsonaro quer uma agenda mais
positiva de projetos da área econômica.
Segundo Jorge
Oliveira, secretário-geral da Presidência, Bolsonaro havia dado “orientação
clara de que não queria atingir os atuais servidores e nem os membros de outros
poderes”. A ideia, comentou, era que as propostas tinham de nascer no âmbito de
cada Poder.
“Essa não é uma
equação fácil de se fazer. O Ministério da Economia fez o texto base, os demais
ministérios colaboraram. Agora, há também uma conjunção política a ser feita
com Câmara e Senado”, disse Jorge Oliveira. “Na reforma da Previdência, houve
uma compreensão de que era, de fato, bom para o Estado brasileiro. O Executivo
fez o seu papel e trabalhou isso com Câmara e Senado. Agora, se esta proposta
da reforma administrativa vai nascer na Câmara, no Senado ou no Executivo, é
algo que vai ser conversado em outro momento."
Pauta
O adiamento não
significa que o governo desistiu do assunto. Uma das possibilidades analisadas
é aproveitar matérias que já estejam em tramitação sobre o tema e enviar apenas
uma “sugestão” aos parlamentares, após a criação da comissão especial que vai
tratar da pauta. Seria uma estratégia semelhante à da reforma tributária. No
final do ano passado, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que seria
uma “tolice” encaminhar uma nova Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com mudanças
no sistema tributário, considerando que já havia outras duas tramitando no
Legislativo.
No Planalto, a
leitura é de que Bolsonaro não quer cutucar o “vespeiro” agora, ao propor a
reforma administrativa. O entendimento é de que, entre uma reforma que tem
impacto imediato e outra que só vai repercutir daqui a dez anos, o melhor é
centrar fogo no agora. / COLABOROU TÂNIA MONTEIRO