quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

GOVERNO NÃO ENVIARÁ MAIS PARA O CONGRESSO A REFORMA ADMINISTRATIVA


Governo decide que não vai enviar a reforma administrativa ao Congresso

Alessandra Azevedo




© Jefferson Rudy/Agencia Senado Fernando Bezerra Coelho disse que o presidente da Câmara prefere que o governo apresente a proposta Sem sinais encorajadores por parte do Congresso, o governo ensaiou, pelo menos por agora, recuar da ideia de enviar ao parlamento a reforma administrativa, prometida desde o ano passado. O desânimo do Executivo é, em parte, reação à falta de interesse dos parlamentares, que preferem evitar mais um tema impopular depois do desgaste com a reforma da Previdência. A vontade do governo ficou ainda menor após novos ataques do ministro da Economia, Paulo Guedes, aos funcionários públicos, o que pode resultar em novo adiamento no envio da proposta, caso ela prospere.
Além disso, desde o começo do ano, deputados e senadores alegam que, às vésperas das eleições municipais, não é um bom momento para mudar as regras do serviço público, especialmente quanto ao fim da estabilidade. O líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO) disse, porém, que ainda é muito cedo para falar sobre os próximos passos da reforma administrativa. “Eu não daria o caso como encerrado”, afirmou. Para ele, o que aconteceu foi mais um ajuste de timing político, que provocou outro adiamento do envio. Afinal, diante do desgaste gerado por Guedes, não fazia sentido encaminhar a matéria. “Nesta semana, não tem clima. Mas daqui a uma ou duas semanas... Eu não apostaria na desistência”, afirmou Gomes.
Por sua vez, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), negou a possibilidade de recuo e reafirmou, nesta terça-feira (11/2), que a intenção ainda é levar o assunto ao parlamento. Segundo o senador, a equipe econômica até cogitou a possibilidade de que as diretrizes fossem incluídas em alguma proposta de emenda à Constituição (PEC), já em andamento no Congresso, para acelerar a tramitação, mas a ideia acabou descartada.
Bezerra ressaltou que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), prefere que o governo apresente a proposta. Na quinta-feira passada, o deputado disse que a condução das reformas não pode ficar “nas costas do parlamento”. Em geral, deputados e senadores comentam que o ônus de levantar o assunto, bastante impopular, deve ser do Executivo. E, se o governo não assumir o risco, não haverá reforma administrativa neste ano. “Com tanto movimento contra, é muito difícil que um tema desses avance em ano eleitoral”, resumiu o deputado Marcelo Ramos (PL-AM).
A boa vontade do Congresso diminuiu ainda mais depois das críticas do ministro da Economia aos servidores. Na semana passada, o chefe da equipe econômica os classificou de “parasitas”. O comentário gerou uma onda de protestos, que chegou ao plenário da Câmara, nesta terça-feira (11/2). O pedido de desculpa posterior não foi suficiente para apaziguar os ânimos, e a movimentação contra Guedes — e, por extensão, aos projetos defendidos por ele — tomou força nos últimos dias.
Sem previsão
Apesar de reiterar que o governo vai levar para a frente a proposta, Bezerra não cravou uma data de envio. De acordo com ele, a PEC precisa ser encaminhada em duas semanas para que tenha condições de ser aprovada até julho, antes do recesso parlamentar. Depois, a probabilidade de avançar é ainda menor, com as eleições de outubro. “A minha expectativa é de que chegue na próxima semana”, afirmou o líder do governo no Senado.
Alguns parlamentares e técnicos do Ministério da Economia ainda defendem que seria menos desgastante colocar alguns pontos no parecer da PEC que cria gatilhos para casos de dificuldade no cumprimento do teto de gastos.
Coordenador da Frente Parlamentar Mista do Serviço Público, o deputado Professor Israel (PV-DF) se mostrou esperançoso com a eventual desistência da proposta, ou, pelo menos, com uma possível rodada de desidratação. “Tudo ainda é muito nublado, mas, como a nossa reação à fala de Guedes foi muito forte e a avaliação das redes sociais também negativa para o governo, eles podem ter percebido que foi um tiro no pé”, afirmou.
Regra de Ouro
Uma das matérias que receberiam pontos da reforma administrativa seria a PEC da Regra de Ouro, que prevê gatilhos de ajuste fiscal como a suspensão temporária das promoções e do reajuste do funcionalismo em caso de crise fiscal. O autor dessa PEC, o deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), que tem bom trânsito com a equipe econômica disse, contudo, que ainda não conversou com o governo sobre isso e mostrou resistência à proposta. “É complicado colocar um tema complexo de carona em outro”, ponderou.

“Fizemos a nossa parte”. Esse é o sentimento dentro da equipe econômica, ante a decisão do governo de travar o envio da proposta de PEC da reforma administrativa.
Diante do recuo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e seus assessores mais próximos, reforçam a interlocutores o discurso de que a proposta de reforma está pronta desde o fim do ano passado e que foi entregue ao presidente Jair Bolsonaro.
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Para a equipe de Guedes, a proposta é necessária, mas o “timing” e a estratégia para o envio, agora, estão nas mãos do presidente.
O Palácio do Planalto admite que a decisão de enviar ou não o texto está diretamente relacionado à proximidade das eleições municipais, em outubro.]


© Helvio Romero/Estadão O ministro Paulo Guedes em evento sobre a agenda ecômica em São Paulo.

A reforma administrativa é hoje considerada a mais difícil, devido ao poder de pressão e mobilização dos servidores no Congresso. Guedes mantém a estratégia que coloca a reforma administrativa como um dos principais pilares do ajuste fiscal em curso. Ele tem procurado mostrar ao presidente que a reforma tem apoio de 88% da população.
Essa não é a primeira vez que o governo recua em relação ao tema. No fim de novembro do ano passado, o Palácio do Planalto adiou o envio da proposta com temor de manifestações e resistências no Congresso. Bolsonaro quer uma agenda mais positiva de projetos da área econômica.
Segundo Jorge Oliveira, secretário-geral da Presidência, Bolsonaro havia dado “orientação clara de que não queria atingir os atuais servidores e nem os membros de outros poderes”. A ideia, comentou, era que as propostas tinham de nascer no âmbito de cada Poder.
“Essa não é uma equação fácil de se fazer. O Ministério da Economia fez o texto base, os demais ministérios colaboraram. Agora, há também uma conjunção política a ser feita com Câmara e Senado”, disse Jorge Oliveira. “Na reforma da Previdência, houve uma compreensão de que era, de fato, bom para o Estado brasileiro. O Executivo fez o seu papel e trabalhou isso com Câmara e Senado. Agora, se esta proposta da reforma administrativa vai nascer na Câmara, no Senado ou no Executivo, é algo que vai ser conversado em outro momento."
Pauta
O adiamento não significa que o governo desistiu do assunto. Uma das possibilidades analisadas é aproveitar matérias que já estejam em tramitação sobre o tema e enviar apenas uma “sugestão” aos parlamentares, após a criação da comissão especial que vai tratar da pauta. Seria uma estratégia semelhante à da reforma tributária. No final do ano passado, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que seria uma “tolice” encaminhar uma nova Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com mudanças no sistema tributário, considerando que já havia outras duas tramitando no Legislativo.
No Planalto, a leitura é de que Bolsonaro não quer cutucar o “vespeiro” agora, ao propor a reforma administrativa. O entendimento é de que, entre uma reforma que tem impacto imediato e outra que só vai repercutir daqui a dez anos, o melhor é centrar fogo no agora. / COLABOROU TÂNIA MONTEIRO


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