NO BRASIL, UMA DAS
PIORES PROFISSÕES É A DE PROFESSOR, SEJA DE QUALQUER GRADUAÇÃO. COMPARANDO COM
OUTRAS PROFISSÕES, UM PROFESSOR UNIVERSITÁRIO DEVERIA GANHAR O MESMO SALÁRIO DE
UM MINISTRO DO STF (R$ 30.000,00) E UM PROFESSOR DO ENSINO MÉDIO (R$ 9.000,00).
NÃO É EXAGERO - EM OUTROS PAÍSES, COMO
COREIA DO SUL, O SALÁRIO DE UM PROFESSOR SECUNDÁRIO É O MAIOR DO PAÍS.
Salários melhores para
professores? O ensino precisa de mais ação do governo.
Desempenho das escolas não está relacionado
diretamente ao piso da profissão
O senso
comum liga, frequentemente, os baixos salários dos professores brasileiros ao
mau desempenho dos alunos. Mas a verdade é que, embora importante, o dinheiro
que vai para o bolso dos docentes não o único fator a pesar nessa
equação. É o que apontam especialistas da educação. As condições de
trabalho dos profissionais e a infraestrutura das escolas também precisam ser
melhoradas. O salário teria mais peso, sim, na hora de influenciar os
jovens a escolherem a profissão.
Os
últimos dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) (2013),
que mede o desempenho dos alunos dos anos iniciais e finais do ensino fundamental
e ensino médio, ilustram que não há mesmo um padrão na relação dos
salários pagos nos Estados brasileiros com o desempenho das escolas. O
Distrito Federal, por exemplo, que paga o melhor salário inicial do Brasil (R$
4.508,67, segundo levantamento feito pela Agência Cartola no início de
2014), está bem classificado nos três índices do Ideb, ficando em segundo lugar
no ensino médio, com 4 pontos; em quinto nos anos iniciais do fundamental, com
5,9 pontos e em sétimo nos anos finais, com 4,4 pontos.
Já os
estados que ocupam o segundo e terceiro lugares no maior valor dos salários,
Mato Grosso (R$ 3.138,33) e o Espírito Santo (R$ 3.035,20) respectivamente, não
estão tão bem colocados no Ideb. O Mato Grosso está em 23º lugar no ensino
médio e o Espírito Santo, em 11º nos anos finais do ensino fundamental, por
exemplo. O Rio Grande do Sul, um dos estados que não chegam nem a pagar o piso
nacional, com R$ 977,05 por 40 horas, não está mal colocado no Ideb: é o
sexto melhor no ensino médio, com 3,9 pontos, o sétimo nos anos
iniciais, com 5,6 pontos e 12º nos anos finais, com 4,2 pontos.
Para a
coordenadora pedagógica da Fundação Victor Civita, Regina Scarpa, o principal
impacto na qualidade educacional é a formação do docente, o quanto o professor
está preparado e se sabe realmente ensinar e alfabetizar seus alunos. “O que
tem sido um elemento de maior relevância nesse quesito são as condições para
ensinar que o professor tem encontrado na escola. Até que ponto eles têm acesso
à formação continuada, por exemplo.”
Regina
acredita que o salário afete mais diretamente a atratividade da
carreira, que é pequena no País e que acaba desvalorizando a profissão. “Uma
pesquisa da Fundação Victor Civita, feita em parceria com a Fundação Carlos
Chagas, mostra que só 2% dos alunos de ensino médio pretendem ser professores e
que a maioria deles é das classes C e D. A carreira é ainda um pouco atrativa
para as pessoas que têm uma formação mais precária. Não adianta só melhorar a
remuneração. Também é preciso revisar a carreira do docente, para que comece a
ser atrativa para os jovens.” Ela cita como exemplo de atratividade na carreira
a Finlândia, considerada um exemplo para a educação mundial. No país, ser
professor é a profissão mais atrativa e os jovens com maiores talentos querem
ensinar. A especialista explica que isso acontece porque existe um bom plano de
carreira, além do salário.
A
vice-presidente do Centro dos Professores do Rio Grande do Sul (Cpers), Solange
da Silva Carvalho, acrescenta que é histórico os professores estarem sempre
lutando por seus direitos ou reivindicando melhores salários, e isso faz com
que os estudantes pensem que é só difícil ser professor. “Além disso, os
desrespeitos em sala de aula também ajudam a criar um clima de que não é fácil
ser professor, que tem que gostar do que faz, ter uma dedicação grande e ainda
assim ganhar pouco, criando uma imagem ruim.”
“O fato
de o piso ser muito baixo comparado com outras profissões, de saída já
desestimula os jovens a entrar na carreira, porque acham que nunca conseguirão
ganhar um salário satisfatório. É possível mudar essa atratividade baixa”,
afirma Regina. Como exemplo, a especialista conta que na Colômbia, uma das
profissões mais atrativas é a de bibliotecário e isso se devo ao investimento
feito há anos no país em projetos de formação de bibliotecas, além da criação
de um Sistema Nacional dos locais.
Carga
horária excessiva
Os professores brasileiros dos anos finais do ensino fundamental gastam, em média, 25 horas por semana lecionando, seis horas a mais do que outros países do mundo. O dado é da Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem 2013 (Talis, na sigla em inglês), desenvolvida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgada em junho deste ano. Os professores brasileiros estão entre os que passam o maior número de horas por semana ensinando. A pesquisa também mostra que os brasileiros entrevistados declararam se dedicar de 10% a 22% mais tempo que a média da Talis em outras atividades como orientação de alunos e correção de trabalhos. Foram analisados informações de cerca de 30 países, totalizando aproximadamente quatro milhões de professores e diretores dos anos finais do ensino fundamental. Só no Brasil, 14,2 mil professores e cerca de mil diretores responderam ao questionário.
Os professores brasileiros dos anos finais do ensino fundamental gastam, em média, 25 horas por semana lecionando, seis horas a mais do que outros países do mundo. O dado é da Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem 2013 (Talis, na sigla em inglês), desenvolvida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgada em junho deste ano. Os professores brasileiros estão entre os que passam o maior número de horas por semana ensinando. A pesquisa também mostra que os brasileiros entrevistados declararam se dedicar de 10% a 22% mais tempo que a média da Talis em outras atividades como orientação de alunos e correção de trabalhos. Foram analisados informações de cerca de 30 países, totalizando aproximadamente quatro milhões de professores e diretores dos anos finais do ensino fundamental. Só no Brasil, 14,2 mil professores e cerca de mil diretores responderam ao questionário.
Uma das
causas desse contexto pode ser o salário baixo do Brasil, pois ele pode fazer
com que profissionais tenham de trabalhar mais para conseguir um pagamento
digno, o que pode prejudicar a dedicação para uma só escola. “Se o salário for
muito baixo, os professores acabam pegando mais de um trabalho, a carga horária
fica mais pesada”, diz Solange, da Cpers. Regina, da Fundação Victor
Civita, explica que a Lei do Piso prevê que um terço do pagamento do
docente envolve tempo para ele se reunir com seus colegas e gestores para
planejar o ensino e estudar. “Será que isso está acontecendo? A curto prazo
pode fazer uma grande diferença se for feito. Um professor que faz uma dupla ou
tripla jornada com certeza não vai conseguir cumprir esse um terço de
trabalho coletivo em todas as escolas onde atua e vai conseguir muito pouca
identidade com os locais onde trabalha”, aponta.
No
salário inicial, com o treinamento mínimo necessário, o professor brasileiro
ganha em média US$ 10.375 por ano. São dados de 2012, de outra pesquisa da OCDE
que compara os salários de diversos países do mundo, de professores dos anos
iniciais do ensino fundamental, divulgada em 2014, e que leva em consideração
salários anuais de instituições públicas, convertidos em dólares americanos e o
índice de Paridade de Poder de Compra (PPP na sigla em inglês) para analisar o
consumo privado dos profissionais. Na Finlândia, por exemplo, esse mesmo perfil
de profissional recebe US$ 34.720. O país que mais bem paga os docentes é
Luxemburgo, totalizando US$ 76.658 ao ano, seguido pela Alemanha, US$ 55.700,
pela Dinamarca, US$ 44.131 e pela Suíça, que remunera seus docentes em US$
55.485.
Quanto à
bonificação para o professor quando o aluno tem um bom desempenho, Regina
aponta que a efetividade desse método de valorizar o trabalho do professor tem
muitas variáveis. “A pessoa que ganhar o bônus vai ficar muito animada e
se empenhar cada vez mais por isso? E quem não atinge a meta e não ganha, vai
ficar desanimado e não vai se esforçar? São tantos fatores e as pesquisas ainda
estão tentando achar respostas para esses questionamentos. Já o conjunto de
fatores como formação, plano de carreira e infraestrutura, é uma política
pública que sabemos que pode melhorar e precisa ser revista”, afirma.
O papel
do salário
A remuneração não deixa de ser importante na melhora da qualidade, mas não é o único fator. O piso do professor continua sendo baixo comparado com outras carreiras e profissões. Atualmente, o piso nacional está no valor de R$ 1.697,37, para 40 horas, e alguns estados como o Rio Grande do Sul, Alagoas e Maranhão não atingem nem esse mínimo.
A remuneração não deixa de ser importante na melhora da qualidade, mas não é o único fator. O piso do professor continua sendo baixo comparado com outras carreiras e profissões. Atualmente, o piso nacional está no valor de R$ 1.697,37, para 40 horas, e alguns estados como o Rio Grande do Sul, Alagoas e Maranhão não atingem nem esse mínimo.
A
vice-presidente do Centro dos Professores do Rio Grande do Sul
(Cpers) acredita que o salário tenha uma grande contribuição na qualidade,
porque professores bem remunerados tem maior acesso a facilidades e condições
dignas de vida. Ela ressalta que não quer dizer que os docentes se esforcem
menos por ganhar menos e define os fatores em um tripé: além do salário,
condição estrutural das escolas e alunos bem fisica e mentalmente. “A
remuneração é muito importante para a saúde mental e financeira dos docentes,
mas as condições de trabalho também interferem no rendimento dos alunos. Até
mesmo o bem-estar dos alunos pode interferir em seu desempenho, se for em uma
região mais carente que eles cheguem à escola com fome, por exemplo”. Os
outros fatores além do salário, são citados por Solange para explicar o
baixo salário do Estado gaúcho e o desempenho no Ideb. “Não estamos nem na pior
posição do ensino e nem na melhor. Existem regiões em que os professores
trabalham em até três turnos, em escolas particulares e municípios,
sobrecarregando e atrapalhando seu rendimento”, diz.
Um
pagamento maior contribui para que se forneçam profissionais mais qualificados
para ensinar. A pesquisadora do núcleo de políticas educacionais da
Universidade Federal do Paraná (UFPR) Andréa Barbosa Gouveia alerta que
literaturas internacionais que não colocam o salário como fator de influência,
como a americana, devem ser analisadas com cuidado, pois elas partem de conclusões
baseadas em salários maiores do que o brasileiro. “No nosso contexto, valorizar
pela remuneração faz com o que o professor tenha mais tempo para se informar,
se dedicar e estudar fora da sala de aula”, afirma.
Para ela,
duas estratégias presentes no Plano Nacional de Educação, sancionado pela
presidente Dilma Rousseff neste ano, são fundamentais para que se amplie o
salário e, consequentemente, se melhore a educação brasileira. Uma delas é o
cumprimento do piso e a diminuição da desigualdade do que é pago entre os
estados e municípios. A outra é a perspectiva da equiparação dos salários dos
professores com os de outras profissões, para que se construa uma cultura de
valorização da profissão - e o salário tem um bom peso nesse ponto.
Outras
formas de valorização
Como outros fatores que podem valorizar o professor, foram citados pelos especialistas a redefinição da formação dos professores, o esforço para que se valorize mais a carreira e a maior proximidade das universidades que formam os docentes das escolas públicas. Regina, da Fundação Victor Civita, cita como exemplo de valorização um programa que existe na França, onde os professores passam um mês por ano em universidades para se atualizar e os estudantes de graduação assumem seus lugares nas escolas, propiciando uma maior proximidade dos professores em formação com a prática do ensino.
Como outros fatores que podem valorizar o professor, foram citados pelos especialistas a redefinição da formação dos professores, o esforço para que se valorize mais a carreira e a maior proximidade das universidades que formam os docentes das escolas públicas. Regina, da Fundação Victor Civita, cita como exemplo de valorização um programa que existe na França, onde os professores passam um mês por ano em universidades para se atualizar e os estudantes de graduação assumem seus lugares nas escolas, propiciando uma maior proximidade dos professores em formação com a prática do ensino.
Andréa,
da UFPR, ressalta que o professor precisa enxergar que o trabalho e a
experiência que vai construindo durante sua carreira no ensino serão
valorizados. “É preciso ficar os bons profissionais dentro das redes. Além de trazer
bons quadros docentes, temos de manter esses quadros, mantendo a capacidade de
desenvolver autonomia do profissional aliado a condições de trabalho como
número adequado de alunos por sala, espaço para o professor sentar e estudar na
escola. A escola é pensada só como um lugar onde o aluno estuda e não deve ser
assim”, afirma.