Confira os principais trechos do discurso de despedida de Moro
Sarah Teófilo
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Ed Alves/CB/D.A Press Num pronunciamento longo à imprensa, no qual fez um
apanhado das ações no Ministério da Justiça e Segurança Pública, falou também
sobre passado e futuro, Sergio Moro se despediu da pasta à qual chegou como
superministro, com prometida carta branca para atuar. “Eu abandonei 22 anos de
magistratura. Infelizmente, é um caminho sem volta. Mas quando eu assumi, sabia
dos riscos”, admitiu, após passar 16 meses à frente da pasta.
O divórcio do governo é litigioso, com graves
acusações contra Bolsonaro, com as quais, conforme frisou Moro, não poderia
compactuar. Ele negou, mais uma vez, que tenha aceitado o cargo de ministro de
olho numa indicação para o Supremo Tribunal Federal e disse que a única
condição imposta para assumir a função foi de que sua família tivesse uma
pensão, caso algo acontecesse com ele enquanto estivesse à frente do
ministério. De acordo com ele, uma vez que abandonou a magistratura, perdeu a
contribuição feita até então à Previdência.
Sobre o futuro, Moro disse que vai “mais adiante”
procurar um emprego. “Não enriqueci no serviço público, nem como magistrado nem
como ministro. E quero dizer que, independentemente de onde eu esteja, sempre
vou estar à disposição do país para ajudar o que quer que seja”, frisou.
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ProtagonismoAo
anunciar a sua saída do ministério, Moro alegou que precisa preservar sua
biografia. Ele ganhou projeção nacional e internacional pela condução dos
processos relativos à Operação Lava-Jato. Atuava na 13ª Vara Federal de
Curitiba, especializada em julgar crimes financeiros e de lavagem ou ocultação
de bens.
Foi Moro quem determinou a prisão de figuras
importantes na política nacional, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, após condenação judicial em duas instâncias no caso do triplex no
Guarujá (SP). Entre os que foram parar atrás das grades estava também o
ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha.
A atuação de Moro também rendeu críticas, após o
site The Intercept divulgar trechos de conversas entre o então juiz e
integrantes da força-tarefa, mostrando intervenções dele no andamento das
investigações.
Moro deixa o governo com a popularidade em alta.
Pesquisa Datafolha de janeiro deste ano mostrou que ele é a personalidade
pública em que os brasileiros mais confiam. No levantamento, foram apresentadas
12 figuras políticas, incluindo Bolsonaro e Lula. Veja abaixa os principais
trechos do discurso de ontem do agora ex-ministro.
Honoris CausaSergio
Moro é mestre e doutor pela Universidade Federal do Paraná. Em 1998, cursou um
programa de aperfeiçoamento para advogados na escola de Direito da Universidade
de Harvard, nos Estados Unidos. Também no país, recebeu o título de Doutor
Honoris Causa da Universidade de Notre Dame.“O presidente me disse, mais de
uma vez, expressamente, que ele queria ter uma pessoa do contato pessoal dele,
que ele pudesse ligar, que ele pudesse colher informações, que ele pudesse
colher relatórios de inteligência, seja diretor, seja o superintendente”
Confira os
principais trechos
Lava-Jato“Antes de assumir o cargo de ministro da Justiça e
Segurança Pública, eu fui juiz federal por 22 anos, tive diversos casos
criminais relevantes. E, desde 2014, em particular, nós tivemos a Operação
Lava-Jato, que mudou o patamar de combate à corrupção no país. Claro que existe
muito ainda a ser feito, mas aquela grande corrupção que, em geral, era impune,
esse cenário foi modificado. Isso foi um trabalho no Judiciário, no Ministério
Público, de outros órgãos e, na parte da investigação, principalmente da
Polícia Federal” PT“Foi garantida a autonomia da Polícia Federal
durante esses trabalhos lá de investigação. É certo que o governo da época
tinha inúmeros defeitos, aqueles crimes gigantescos de corrupção que
aconteceram naquela época. Mas foi fundamental a manutenção da autonomia da PF
para que fosse possível realizar esses trabalho. Seja de bom grado, seja pela
pressão da sociedade, essa autonomia foi mantida e isso permitiu que os resultados
fossem alcançados” Carta branca“Final de 2018, essa é uma história
um pouco repetida, eu recebi convite do então eleito presidente da República,
Jair Bolsonaro, a ser ministro da Justiça e da Segurança Pública. O que foi
conversado com o presidente, lembro que foi em 1º de novembro, que nós teríamos
o compromisso com o combate à corrupção, ao crime organizado e à criminalidade
violenta. Inclusive, me foi prometido, na ocasião, carta branca para nomear
todos os assessores, inclusive desses órgãos policiais, como Polícia Rodoviária
Federal e a própria Polícia Federal” STF“Na ocasião, foi divulgado,
equivocadamente, por algumas pessoas, que eu teria estabelecido como condição
para assumir o Ministério da Justiça uma nomeação ao Supremo Tribunal Federal. Nunca
houve essa condição, até porque seria algo de aceitar um cargo de ministro da
Justiça pensando em outro. Isso não é da minha natureza” Superintendente“A
partir do segundo semestre do ano passado, passou a haver uma insistência do
presidente da troca do comando da Polícia Federal. Houve, primeiro, um desejo
de trocar um superintendente da Polícia Federal do Rio de Janeiro.
Sinceramente, não havia nenhum motivo para essa substituição, mas, conversando
com o superintendente em questão, ele queria sair do cargo por questões
exclusivamente pessoais. Então, nesse cenário acabemos concordando, eu e o
diretor-geral, em promover essa troca com uma substituição técnica, com uma
substituição de um indicado pela polícia” Diretor-geral“O
presidente, no entanto, passou a insistir também na troca do diretor-geral. O
que eu sempre disse ao presidente: ‘Eu não tenho nenhum problema em trocar o
diretor-geral da Polícia Federal, mas preciso de uma causa’. E uma causa
normalmente relacionada a uma insuficiência de desempenho, um erro grave. No
entanto, o que eu vi durante todo esse período, e até pelo histórico do próprio
diretor-geral, que é um trabalho bem-feito. Não é uma questão do nome. Tem
outros bons nomes para assumir o cargo de diretor da Polícia Federal. Há outros
delegados igualmente competentes. O grande problema de realizar essa troca,
primeiro: haveria uma violação de uma promessa que me foi feita inicialmente,
que eu teria carta branca. Em segundo lugar, não haveria uma causa para essa
substituição, e estaria claro que estaria havendo ali uma interferência
política na Polícia Federal, que gera um abalo na credibilidade, não minha, mas
minha também, mas também do governo. Não aconteceu durante a Lava-Jato, a
despeito de todos os problemas de corrupção dos governos anteriores” Insistência“Dialoguei
muito tempo pelo presidente, busquei postergar essa decisão, às vezes até
sinalizando que poderia concordar no futuro com essa possibilidade (…). Ontem
(quinta), conversei com o presidente. Houve essa insistência do presidente.
Falei ao presidente que seria uma intervenção política, ele disse que seria
mesmo. Falei que isso teria um impacto para todos, que seria negativo. Mas para
evitar uma crise durante uma pandemia (…), eu sinalizei: vamos substituir o
Valeixo por alguém que represente a continuidade dos trabalhos, alguém com
perfil absolutamente técnico e que fosse uma sugestão minha também. Na verdade,
nem minha, uma sugestão da própria Polícia Federal” Interferência“Mas
o grande problema é que não é tanto essa questão de quem colocar. O problema é:
por que trocar? E permitir que seja feita a interferência política no âmbito da
Polícia Federal. O presidente me disse, mais de uma vez, expressamente, que ele
queria ter uma pessoa do contato pessoal dele, que ele pudesse ligar, que ele
pudesse colher informações, que ele pudesse colher relatórios de inteligência,
seja diretor, seja o superintendente. E realmente não é o papel da Polícia
Federal prestar esse tipo de informação. As investigações têm de ser
preservadas. Imaginem durante a própria Lava-Jato, o ministro, o diretor-geral,
a então presidente Dilma, o ex-presidente Luís ficassem ligando para o
superintendente em Curitiba para colher informações sobre as investigações em
andamento. Então, o grande problema não é quem entra, mas por que entra. E se
esse alguém não conseguiu dizer ‘não’ ao presidente, a uma proposta dessa
espécie, eu fico na dúvida se vai conseguir dizer ‘não’ em relação a outros
temas” Valeixo“Há uma possibilidade que se afirma que o Maurício
Valeixo gostaria de sair. Mas isso não é totalmente verdadeiro. O ápice da
carreira de qualquer policial federal é a direção-geral da Polícia Federal. E
ele entrou com uma missão. Claro que depois de tantas pressões para que saísse,
ele, de fato, até manifestou a mim: ‘olha, talvez seja melhor eu sair para
diminuir essa cisma e nós conseguirmos realizar uma substituição adequada’. Mas
nunca isso voluntariamente, sim, decorrente dessa pressão” Inquéritos“O
presidente também me informou que tinha preocupação com inquéritos em curso no
Supremo Tribunal Federal e que a troca também seria oportuna da Polícia Federal
por esse motivo. Também não é uma razão que justifique a substituição, é até
algo que gera uma grande preocupação. Enfim, eu sinto que tenho o dever de tentar
proteger a instituição, a Polícia Federal, e, por todos esses motivos, ainda
busquei uma solução alternativa para tentar evitar uma crise política durante
uma pandemia. Acho que o foco deveria ser o combate à pandemia, mas entendi que
eu não podia deixar de lado esse meu compromisso com o Estado de direito” Exoneração“A
exoneração que foi publicada, eu fiquei sabendo pelo Diário Oficial, pela
madrugada. Eu não assinei esse decreto. Em nenhum momento isso foi trazido, em
nenhum momento o diretor-geral da Polícia Federal apresentou um pedido formal
de exoneração. Depois, ele me comunicou que ontem à noite (quinta) recebeu uma
ligação dizendo que ia ser exoneração a pedido e se ele concordava. Ele disse:
‘Como é que eu vou concordar com alguma coisa, eu vou fazer o que, né?’ Se ele
já está sujeito à exoneração a pedido. Mas o fato é que não existe nenhum
pedido que foi feito de maneira formal. Eu, sinceramente, fui surpreendido,
achei que isso foi ofensivo. Vi que depois a Secom (Secretaria de Comunicação) afirmou
que houve essa exoneração a pedido, mas isso, de fato, não é verdadeiro” Biografia“Tenho
que preservar a minha biografia, mas, acima de tudo, tenho que preservar o
compromisso, que foi o compromisso que eu assumi inicialmente com o próprio
presidente de que nós seríamos firmes no combate à corrupção, ao crime
organizado e à criminalidade violenta. E um pressuposto necessário para isso é
que nós temos de garantir o respeito à lei, à própria autonomia da Polícia
Federal contra interferências políticas. Poderia ser alterado o diretor-geral,
desde que tivesse uma causa consistente. Não tendo uma causa consistente e
percebendo que essa interferência política pode levar a relações impróprias
entre o diretor-geral, entre os superintendentes com o presidente da República,
é algo que realmente eu não posso concordar” Resistência“(...) A
Polícia Federal tem um histórico, ela vai também resistir a qualquer espécie de
interferência política. Tenho crença nisso. E que seja indicado alguém que
possa realizar um trabalho autônomo, independente, alguém que não concorde em
trocar superintendentes ou delegados por motivos não justificados”
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