Papa recebe Maduro, e
Vaticano anuncia diálogo na Venezuela
Estadão Conteúdo
Em meio ao acirramento da crise política na Venezuela, o papa Francisco
recebeu nesta segunda (24), no Vaticano, o presidente Nicolás
Maduro. Durante a audiência, que teve caráter "privado" e não
tinha sido anunciada, o papa incentivou "o diálogo sincero e
construtivo" entre governo e oposição da Venezuela, com a finalidade de
"aliviar o sofrimento" das pessoas e promover "a coesão
social", afirmou, em nota, a Santa Sé.
O papa, "que leva todos os venezuelanos no coração, deseja
continuar a oferecer a sua contribuição a favor da institucionalidade deste
país", diz o comunicado, publicado em italiano.
Durante o encontro, que não teve a duração divulgada, Francisco convidou
o presidente venezuelano a iniciar "com coragem a via do diálogo sincero e
construtivo para aliviar o sofrimento do povo."
Pouco depois, o enviado de Francisco à Venezuela anunciou que governo e
oposição concordaram em iniciar um diálogo formal para superar a crise
política. A primeira reunião está prevista para o próximo domingo (30), na Isla
Margarita, ilha venezuelana no Caribe.
O núncio apostólico argentino Emil Paul Tscherrig afirmou que o encontro
entre chavistas e opositores nesta segunda "transcorreu em um clima de
respeito, cordialidade e vontade política para fazer avançar esse
processo".
"Espero que se coloque o tema econômico da recuperação da Venezuela
como ponto central. Espero que se imponha o respeito à Constituição e se
abandone o caminho do golpismo", disse Maduro em Roma.
PROTESTOS
Policiais e estudantes venezuelanos entraram em confronto nesta segunda
durante protesto em uma universidade em Caracas para exigir a realização do
referendo revogatório contra Maduro.
Ao menos dois estudantes ficaram feridos após a polícia usar bombas de
gás lacrimogêneo e balas de borracha para impedir que o ato deixasse o campus
da Universidade Central da Venezuela. Manifestações estudantis também foram
registradas em outras cidades.
GOLPE
Em sessão tensa, suspensa rapidamente pela invasão do local por
chavistas, a Assembleia Nacional declarou, no domingo (23), que houve
"ruptura da ordem constitucional" cometida pelo "regime" de
Maduro e pediu uma "rebelião popular" no país.
Líderes opositores convocaram novos protestos para esta quarta-feira
(24).
O Parlamento denunciou um "golpe de Estado" depois que o CNE
(Conselho Nacional Eleitoral) suspendeu, na semana passada, a segunda fase de
convocação de um referendo sobre o mandato de Maduro, que termina em 2019.
O órgão eleitoral -que a oposição acusa de estar a serviço do chavismo-
tomou a decisão depois que tribunais penais de cinco Estados anularam as
assinaturas coletadas pela coalizão opositora MUD (Mesa da Unidade Democrática)
em maio, na primeira fase do processo, alegando fraudes.
Na primeira rodada, era preciso recolher 200 mil firmas (a oposição conseguiu
1,9 milhão). Na segunda, que seria realizada nesta semana, era preciso coletar
4 milhões.
A oposição acusa o governo de manobrar para que a consulta seja
realizada apenas em 2017. Se o referendo ocorrer depois de 10 de janeiro, e
Maduro for derrotado nas urnas, assume o vice-presidente, Aristóbulo Istúriz.
Mas se a votação acontecer antes dessa data, novas eleições são
convocadas em caso de derrota do presidente. Segundo o instituto Datanálisis,
60% dos venezuelanos votariam para destituir Maduro no referendo.
A suspensão do processo deixou ainda mais tenso o clima político em um
país que sofre com severa escassez de alimentos e remédios. O FMI (Fundo
Monetário Internacional) projeta inflação de 475% para a Venezuela neste ano.
A ONG Human Rights Watch, em relatório divulgado nesta segunda,
constatou que o cuidado médico no país se deteriorou significativamente nos
últimos dois anos. O documento cita a falta de medicamentos básicos como
antibióticos e analgésicos, e suprimentos como gaze, luvas cirúrgicas e álcool
médico. A oposição sustenta que a solução para a crise é a saída de Maduro.
MERCOSUL
O país corre ainda o risco de ser suspenso do Mercosul se não cumprir,
até 1º de dezembro, compromissos assumidos há quatro anos. Caracas está
marginalizada no bloco desde agosto, quando deveria ter assumido a presidência
passada pelo Uruguai, respeitando-se o critério da ordem alfabética.
Argentina, Brasil e Paraguai se opuseram à transferência, alegando que
Caracas não respeita regras democráticas e viola direitos humanos. "Nesses
termos, a Venezuela não pode ser parte do Mercosul porque lá não se respeitam
os direitos humanos", disse nesta segunda o presidente argentino, Mauricio
Macri.
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