Na fronteira da depressão
econômica
Paulo Haddad
Vamos completar o terceiro ano em que a economia brasileira entrou em
recessão. A experiência histórica mostra que, em alguns casos, a recessão pode
se tornar mais severa e prolongada e transitar na direção de uma depressão
econômica. Todos os romances, novelas e ensaios literários que foram escritos
sobre a realidade humana numa sociedade em regime de depressão econômica
descrevem com clareza o mal-estar e os dramas que acometem as famílias e os
diferentes grupos sociais nesse contexto histórico. Retratam melhor o que
apenas a frieza dos indicadores econômicos não demonstra, pois esse tipo de
crise atinge a saúde mental e o comportamento psicossocial dos desempregados,
dos desalentados e dos socialmente marginalizados.
Mas a depressão econômica é uma construção social, não é uma maldição
natural. Ela é a resultante das políticas econômicas mal concebidas e
implementadas, do voluntarismo populista de governantes ineptos e de
estratégias equivocadas diante de choques exógenos na economia. Ela acontece,
principalmente, quando as políticas econômicas são formuladas sem refletir
sobre as lições das experiências históricas de catástrofes sociais semelhantes
e de como foram enfrentadas.
Vejam, por exemplo, como os Estados Unidos evitaram que a recessão
econômica de 2008 se transformasse numa grande depressão como a de 1929. Em
1933, a taxa de desemprego chegou em 25,2% na economia norte-americana; o PIB
real caiu de US$ 203 bilhões em 1929 para US$ 141 bilhões em 1933;
cresceu enormemente o número de suicídios, de doenças mentais e do consumo de
álcool e drogas naquele país. Em contraste, em 2008 foi evitada a Grande
Depressão e as suas mazelas sociais. Em 2009 houve uma queda substantiva no PIB
dos EE.UU., mas o crescimento tornou-se positivo nos anos seguintes mesmo que
com magnitudes menos expressivas. Atualmente, a economia norte-americana ensaia
o início de um novo ciclo de prosperidade, graças às políticas fiscal,
monetária e de crescimento ativas, inteligentemente arquitetadas e
implementadas.
No caso brasileiro, a situação é bem diferente. A perspectiva da
recessão econômica para os próximos meses é ainda pior do que o atual quadro
degradado do desemprego, da queda na renda familiar e da melancolia dos agentes
econômicos. O problema central é do nosso subdesenvolvimento político, o qual
se exprime pela incapacidade dos partidos e dos protagonistas políticos
colocarem o interesse público acima dos interesses privatistas, pela
incapacidade de negociar soluções consensualizadas para superar a crise
econômica e pela incapacidade de realizar uma gestão administrativa da coisa
pública sem contaminá-la com interesses velados e fisiológicos. Dessa forma,
aumentam-se as chances de passarmos de um contexto de recessão para um regime
de depressão econômica.
Grandes transformações econômicas e sociais são incontornáveis neste
momento de nossa história. É preciso buscar ideias que sejam capazes, em
períodos de crise, de reduzir incertezas, de tornar possíveis pactos e coalizões,
de reconstruir instituições com estabilidade. Mas, em última instância, a
responsabilidade final pela situação do país está também no comportamento da
população diante das várias rodadas eleitorais. Pois, como diz Carlos Drummond
de Andrade “A ignorância, a cobiça e a má fé também elegem seus representantes
políticos”.
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