Aristóteles
Atheniensis
Vários advogados, juristas e
professores publicaram uma “carta aberta de repúdio pela supressão episódica de
direitos e garantias” que estaria havendo na operação Lava Jato. As críticas
foram duras e severas: estaria desmontado o estado de direito no Brasil. Não
haveria mais presunção de inocência, direito pleno de defesa, garantia de imparcialidade,
juiz natural, uso devido da prisão provisória, vazamento seletivo de
documentos, e por aí vai. Conclui a carta o amplo rol de violações, com a
afirmativa de que há em curso uma “neoinquisição”.
A acusação merece reflexões,
principalmente quando se diz violado o próprio estado democrático de direito,
conquistado depois de tanto sacrifício, para o retorno à democracia. O que
assusta na Lava Jato é a mudança cultural de um padrão longamente adotado no
curso de nossa história: a inabalável convicção de que cadeia só existia para
pobre e a Justiça só funcionava a favor dos ricos.
Esta crença está sendo derrubada pela
confluência de três fatores convergentes: um Judiciário atuante, um Ministério
Público vigilante e ativo e uma polícia (Polícia Federal) competente e
compromissada. Todos estes fatores fixaram-se na solidez de um fato social que
numa democracia é tudo: o apoio da vontade popular, cansada da impunidade.
Por isto é que as providências tomadas
às vezes choca-me, à primeira vista, parecem arbitrárias. As prisões provisória
e preventiva foram usadas dentro dos padrões legais. Ninguém foi forçado a
firmar delação premiada. A decisão foi tomada porque a iminência de condenação
severa levou os réus a optar pela colaboração, pela verdade dos fatos, em vez
de ocultá-los. E vão ter o benefício que a lei lhes outorga. Em sua grande
maioria, as prisões têm sido mantidas pelos tribunais superiores. Então,
pergunta-se: todo o Judiciário brasileiro, em todas as instâncias, é submisso e
corrupto?
A resposta é negativa. O Judiciário
brasileiro tem muitos defeitos, mas a honestidade pessoal é um atributo
elogiável da maioria de seus juízes. Se houve a opção de manter réus presos é
porque a legalidade permitiu. O advogado Técio Lins e Silva criticou severamente
a Lava Jato, afirmando que vivemos um momento pior do que os idos da ditadura.
Mas é ele próprio que afirma que seu cliente e muitos outros réus foram soltos
pelo STF. Logo o estado de direito e a Justiça funcionaram corretamente. Se a
situação de fato for a mesma, outros terão a idêntica sina e o julgamento vai
dizer quem deve cumprir pena.
Estávamos acostumados a outra
realidade. Sempre que havia um escândalo de corrupção, forma-se a tal “batalha
jurídica”, disparando-se pelos defensores dos réus a bateria de intermináveis
recursos por quatro instâncias, até que os crimes prescrevessem ou os réus
fossem absolvidos por falta de provas. Se os recursos existem, não se pode
acusar o advogado de usá-los. Agora a situação mudou e o resultado todos estão
vendo. O estado de direito também precisa de defesa e ela está atuando.
O “sagrado direito de defesa” tem como
contraposto o igualmente sagrado direito do autor. É dever do Estado fazer
valer o ordenamento jurídico, reprimir os furtos e roubos dos cofres públicos e
mostrar ao povo que o dinheiro dos tributos está sendo empregado para o
bem-estar coletivo e não mais guardado no bolso de gatunos.
Resta agora ao Congresso completar a
mudança: aprovar a emenda Peluso, limitando-se a duas, e não mais a quatro, as
instâncias. Dotar o país de leis penais simples e objetivas que permitam
inocentar e culpar, como a mesma rapidez, os acusados, para mostrar ao povo que
vivemos novos tempos. Se não formos capazes disto, a corrupção tomará conta de
tudo. Então não haverá salvação para ninguém.
*Professor titular da Faculdade de Direito da UFMG
*Professor titular da Faculdade de Direito da UFMG
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