terça-feira, 22 de dezembro de 2015

DETALHES DA VIDA



  

Luiz Hippert




Duas cenas, duas madrugadas.
Um cara segue pela rua, está a pé e sozinho, meio apreensivo pela pouca iluminação. Lá na frente, o jogo de luzes alternadas revela uma viatura de polícia. O que deveria ser um alívio, sensação de segurança, vira uma crise de pânico. Ele está em dia com tudo, não deve nada a ninguém. Mas já pode prever a abordagem violenta. Torce para que, pelo menos, seja breve. Este homem é negro.
Um casal anda de mãos dadas pela rua. De vez em quando trocam selinhos, pequenas demonstrações de carinho. Lá na frente, percebem um grupo que se aproxima. Ruidoso, truculento. O que poderia gerar apenas um aceno amistoso – e talvez alegre – de boa noite, vira uma crise de pânico. Eles estão tranquilos, não devem nada a ninguém. Mas já podem prever a abordagem violenta. Torcem para que, pelo menos, saiam dali com vida Este é um casal gay.
Situações corriqueiras numa sociedade onde alguns grupos insistem em ser privilegiados. Vítimas profissionais, sempre reclamando do que não existe, nessa sociedade que criticam, mas que se mostra totalmente igualitária, a não ser pelos protestos e reclamações desse povo implicante. Racismo e homofobia não passam de fantasias, argumentos forjados por quem se sente detentor de direitos especiais e grita por leis exclusivas. Uma sociedade onde a igualdade de gêneros também é algo incontestável e o respeito chega a ser comovente.
São uns coitadinhos. Só que não.
Tá bom, mas coitadismos à parte, a coluna de hoje não deveria ser sobre o Natal? Afinal de contas, essa é uma data arrebatadora, e quando vai se aproximando, acaba tomando conta e se sobrepondo a todos os assuntos.
Tem quem aproveite a oportunidade para criticar. Protestos pelo consumismo, pelo esquecimento do “espírito de Natal”, pelo mero pretexto para o incremento das atividades comerciais. Tem também os que se queixam da crise, que chega para empobrecer, ou mesmo inviabilizar, a fartura da ceia e a montanha de presentes ao pé de pinheirinhos de plástico cobertos pela neve de algodão.
Mas tem ainda quem veja o lado mais humano e espiritual. A oportunidade única do ano, onde praticamente o mundo inteiro se encontra irmanado, ao mesmo tempo, no ideal da difusão do amor.
Então, estas são as nossas histórias de Natal, e a madrugada pode ter finais surpreendentes, desfechos que nos encantem pela gentileza e civilidade.
O policial acena para o homem negro, que lhe devolve um sorriso e o cumprimento solidário pelo plantão em pleno feriado. Segue o seu caminho, sentindo-se em segurança nas ruas desertas.
Os jovens em grupo barulhento rodeiam o casal gay, para dividir com eles a alegria meio bêbada de quem volta de uma confraternização familiar. Abraços são inevitáveis nessa noite de felicidade contagiante.
Duas pequenas histórias de final inventado.
Quem sabe, um dia, não se tornem reais. Feliz natal pra todos. Feliz Natal.

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