terça-feira, 3 de novembro de 2015

POLÍTICO É IGUAL VACA



  

Malco Camargos


Quem trabalha em fazendas sabe que, caso a vaca esteja estressada, ela “esconde” o leite que só poderá ser retirado em uma próxima ordenha ou com uso de remédios. Para permitir que o tratador retire seu leite, a vaca deve ser tratada com carinho. A pesquisa Datafolha noticiada pelo Hoje em Dia, no último dia 31, revela este mesmo comportamento dos parlamentares brasileiros.
Entre os dias 19 e 28 de outubro de 2015, o Datafolha entrevistou pessoalmente, por telefone ou através de link na internet, 375 parlamentares, sendo 324 deputados federais e 51 senadores (63% do total) sobre a posição em relação a um possível impeachment da presidente Dilma e também sobre a cassação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha.
Segundo o Datafolha, todos os parlamentares foram contatados, mas mesmo com a garantia da não identificação do respondente e com os variados meios de coleta, 37% deles preferiram não responder à pesquisa. Além disso, entre os que responderam, 18% dos deputados e 12% dos senadores não se posicionaram em relação ao impeachment da presidente Dilma. Esse percentual de respostas deixa dúvidas em relação ao posicionamento da Casa sobre o principal tema em debate hoje no país.
Como se faz em pesquisas de opinião, recalculamos os resultados divulgados pelo Datafolha considerando apenas os votos válidos, ou seja, aqueles que responderam e se posicionaram sobre o tema. Entre estes – 45% do total –, mesmo sendo a maioria aqueles que defendem o impeachment, dentro da Casa o cenário ainda é relativamente confortável para a presidente, uma vez que os ritos impõem a necessidade de 2/3 dos votos (66%) para abertura do processo.
Na Câmara dos Deputados, considerando apenas os votos válidos, 55% afirmaram que, se o Plenário da Câmara apreciar a abertura do processo, votariam a favor e 45% disseram que votariam contra.
Já no Senado, onde o julgamento deve ocorrer caso seja iniciado na Câmara, também seriam necessários 66% dos votos para condenação. Conforme revelado pelo Datafolha, considerando apenas os votos válidos, a situação da presidente é mais confortável pois, entre os que se posicionaram, a presidente seria absolvida por 54% da Casa e condenada por 46%.
Contudo, este resultado nem de longe traz paz ao Planalto. O posicionamento daqueles que não responderam ou não se posicionaram é capaz de mudar os resultados do processo tanto em uma direção quanto em outra, nas duas casas legislativas.
Um eleitor indeciso em uma pesquisa de opinião, em geral, tem sua preferência desconsiderada e as estimativas de votos válidos são bem assertivas. Mas quando falamos das elites políticas, desconsiderar aqueles que não se posicionaram é um risco alto. Eles podem, assim como as vacas na hora da ordenha, estar em busca de carinho para soltar o leite. E esse carinho, em geral, custa bem mais do que afagos do tratador. Elites políticas querem também afagos, mas principalmente cargos e dinheiro. Com estes nas mãos, não escondem seu leite.
*Doutor em Ciência Política, professor da PUC Minas e diretor do Instituto Ver

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