Malco Camargos
Quem trabalha em fazendas sabe que,
caso a vaca esteja estressada, ela “esconde” o leite que só poderá ser retirado
em uma próxima ordenha ou com uso de remédios. Para permitir que o tratador
retire seu leite, a vaca deve ser tratada com carinho. A pesquisa Datafolha
noticiada pelo Hoje em Dia, no último dia 31, revela este mesmo comportamento
dos parlamentares brasileiros.
Entre os dias 19 e 28 de outubro de
2015, o Datafolha entrevistou pessoalmente, por telefone ou através de link na
internet, 375 parlamentares, sendo 324 deputados federais e 51 senadores (63%
do total) sobre a posição em relação a um possível impeachment da presidente
Dilma e também sobre a cassação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha.
Segundo o Datafolha, todos os
parlamentares foram contatados, mas mesmo com a garantia da não identificação
do respondente e com os variados meios de coleta, 37% deles preferiram não
responder à pesquisa. Além disso, entre os que responderam, 18% dos deputados e
12% dos senadores não se posicionaram em relação ao impeachment da presidente
Dilma. Esse percentual de respostas deixa dúvidas em relação ao posicionamento
da Casa sobre o principal tema em debate hoje no país.
Como se faz em pesquisas de opinião,
recalculamos os resultados divulgados pelo Datafolha considerando apenas os
votos válidos, ou seja, aqueles que responderam e se posicionaram sobre o tema.
Entre estes – 45% do total –, mesmo sendo a maioria aqueles que defendem o
impeachment, dentro da Casa o cenário ainda é relativamente confortável para a
presidente, uma vez que os ritos impõem a necessidade de 2/3 dos votos (66%)
para abertura do processo.
Na Câmara dos Deputados, considerando
apenas os votos válidos, 55% afirmaram que, se o Plenário da Câmara apreciar a
abertura do processo, votariam a favor e 45% disseram que votariam contra.
Já no Senado, onde o julgamento deve
ocorrer caso seja iniciado na Câmara, também seriam necessários 66% dos votos
para condenação. Conforme revelado pelo Datafolha, considerando apenas os votos
válidos, a situação da presidente é mais confortável pois, entre os que se
posicionaram, a presidente seria absolvida por 54% da Casa e condenada por 46%.
Contudo, este resultado nem de longe
traz paz ao Planalto. O posicionamento daqueles que não responderam ou não se
posicionaram é capaz de mudar os resultados do processo tanto em uma direção
quanto em outra, nas duas casas legislativas.
Um eleitor indeciso em uma pesquisa de
opinião, em geral, tem sua preferência desconsiderada e as estimativas de votos
válidos são bem assertivas. Mas quando falamos das elites políticas,
desconsiderar aqueles que não se posicionaram é um risco alto. Eles podem,
assim como as vacas na hora da ordenha, estar em busca de carinho para soltar o
leite. E esse carinho, em geral, custa bem mais do que afagos do tratador.
Elites políticas querem também afagos, mas principalmente cargos e dinheiro.
Com estes nas mãos, não escondem seu leite.
*Doutor em Ciência Política, professor
da PUC Minas e diretor do Instituto Ver
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