segunda-feira, 26 de outubro de 2015

NÃO DEVEMOS TER ILUSÃO DE COISA MELHOR



  

Paulo Haddad


As decisões de política econômica normalmente não têm repercussão imediata. Quando o Banco Central eleva a taxa básica de juros, por exemplo, há um período de alguns meses de defasagem antes que os impactos dessa decisão afetem as despesas de consumo e de investimento. Nesse caso, a repercussão mais imediata ocorre principalmente no jogo especulativo dos mercados financeiros de moedas, de títulos, de ações e de derivativos. Na verdade, esses mercados procuram precificar antecipadamente nos valores de seus produtos e serviços até mesmo as expectativas racionais sobre o que pode ocorrer com os macro preços no futuro.
Do lado real da economia - o lado que analisa os impactos das decisões das políticas econômicas sobre os níveis da renda e do emprego das famílias – há que considerar a interação do multiplicador com o acelerador. O multiplicador ocorre por causa da interdependência estrutural da economia. Os setores produtivos estão interligados por relações de compras e vendas nos mercados de insumos, produtos e serviços de fatores. Assim, quando as exportações da indústria automobilística caem, esta diminui a demanda de insumos (aço, energia elétrica, vidros, tintas, etc.) de vários setores produtivos, os quais acabam por diminuir também a demanda dos insumos que necessitam (minérios, produtos químicos, carvão vegetal, etc.) e assim por diante. Toda economia acaba por se transformar num sistema de vasos comunicantes.
Quando esses setores percebem que a queda da demanda é persistente porque ela é resultante de uma política de ajuste fiscal que objetiva reduzir a demanda agregada da economia (corte dos gastos públicos, diminuição dos salários, subsídios e transferências de renda, etc.) para controlar a inflação, as empresas põem em marcha o desemprego de sua mão de obra excedente. Usualmente, tomam essa decisão a contragosto pois estão dispensando o seu capital humano formado através de muito treinamento e de muita experiência acumulada. Os desempregados diminuem a sua procura nos mercados de bens e serviços de consumo, aprofundando a insuficiência da demanda agregada da economia, configurando-se, assim, o início de uma recessão.
O quadro recessivo se agrava por causa do efeito acelerador, o qual ocorre quando os empresários percebem que há capacidade ociosa de produção nas suas instalações, máquinas e equipamentos. A partir daí, decidem postergar ou cancelar os projetos de investimento, o que repercute adversamente sobre as indústrias de bens de capital e de construção civil bem como sobre as empresas de engenharia e de consultoria de projetos e, finalmente, sobre os mercados de trabalho. Como resultado, dá-se mais um empurrão na economia ladeira abaixo.
Esse processo de interação entre os efeitos perversos do multiplicador e do acelerador ainda se encontra numa primeira fase na atual conjuntura econômica do país, que passa por uma experiência de ajuste fiscal tecnicamente mal concebida e politicamente inviável. Espera-se que a taxa de crescimento do PIB venha a cair para um negativo de três por cento e a taxa oficial de desemprego ultrapasse brevemente um positivo de dez por cento.
Essa combinação de taxas contrapostas impõe sacrifícios socialmente dramáticos para a nossa população. E nossa experiência histórica mostra que um período prolongado de uma combinação de retrocesso econômico, com desemprego elevado e com as desigualdades sociais e a corrupção epidêmica se aguçando é um dos caminhos mais prováveis para a ocorrência de profundas convulsões sociais e políticas em nossos centros metropolitanos.

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