Especialistas
desqualificam estudo que indica desertificação no Norte de Minas
Igor
Guimarães - Hoje em Dia
VIDAS
SECAS – Sem água e pasto, gado não resiste às condições climáticas severas e
morrem
O resultado de um estudo encomendado há cinco anos
pelo Ministério do Meio Ambiente praticamente condenou o Norte de Minas “à
morte”. Caso medidas urgentes – e caras – de contingenciamento da seca não
fossem tomadas a partir de então, os sertões e veredas de Guimarães Rosa
evoluiriam para um deserto estéril até 2030. Faltando agora 15 anos para o
“juízo final”, especialistas põem areia nesse cenário catastrófico.
O primeiro argumento desmistificador está no fato
de a região ser a mais preservada do estado, com 57% da vegetação original
intacta. O Triângulo Mineiro, por exemplo, tem em torno de 7%. “A área apontada
com risco de desertificação é onde se tem mais verde. Então, existe uma
controvérsia nesse estudo”, diz o secretário de Desenvolvimento do Norte e
Nordeste de Minas (Sednor), Paulo Guedes.
Em mesmo a estiagem prolongada é vista como um
sinal desse processo de esterilização do solo. A seca dos últimos quatro anos é
o ápice de um ciclo climático, explica Reinaldo Nunes de Oliveira,
coordenador-técnico regional da Emater.
Segundo ele, em períodos que variam entre 80 e cem
anos, a porção Norte do estado passa por estiagens extremas, influência da
maior atividade solar e das correntes quentes provenientes do Atlântico. A
última, segundo ele, ocorreu em 1932. Portanto, espera-se que, em breve, a água
volte a cair.
“A gente do Norte de Minas é acostumado a conviver
com a seca. É um fenômeno que todos nós já passamos. De uma forma ou de outra,
resistimos”, diz Oliveira.
Degradação
O fato de o êxodo de 2,2 milhões de habitantes
ainda não ter começado nos 177 mil km² de área do semiárido mineiro, conforme
prenunciou o relatório do MMA, também depõe contra o cataclismo. “Quando se
tinha seca prolongada há 20 anos, 30, 40 anos, era inevitável a fome e milhares
de pessoas migrando. Temos quatro anos agora de seca seguidos, a maior da
história, e as pessoas continuam onde estão”, afirma Guedes.
Para o coordenador do Centro de Convivência com o
Semiárido, Expedito José Ferreira, o termo “desertificação” é muito forte para
ser usado. “Vejo que não se enquadra. Estamos, sim, num estado de degradação
acelerada, o que é algo distinto. Não alcançamos a desertifica-ção”, acredita.
Professor do Departamento de Geociências da
Unimontes, Ferreira reconhece que essa devastação ambiental, se continuada,
potencializa a desertifica-ção, mas deixa claro que a “transição” acontece em
situações bem mais críticas. Por isso, diz ele, tanto se insiste na preservação
de nascentes, na despoluição de rios e na recuperação das matas ciliares.
Tal mudança de olhar sobre o Norte de Minas não
representa menos investimentos, garante a Sednor. Conforme a secretaria, serão
construídas 962 barragens na região nos próximos anos, a um custo de R$ 101
milhões, a partir de convênio com o governo federal. O intuito é beneficiar
pequenos produtores e comunidades. A primeira etapa deve ser licitada até o fim
de 2015.
Está em curso também a implantação de 516 sistemas
de abastecimento de água nos municípios mais castigados pela seca, localizados
na Serra Geral, como Porteirinha e Janaúba. O investimento é de R$ 83 milhões,
numa parceria entre o Estado e Secretaria de Integração Nacional.
“Sabemos da escassez hídrica e da necessidade de
uma série de investimentos para recuperar nascentes e matas ciliares, construir
barragens, controlar melhor do uso da água. Porém, é um tanto apressado falar
em desertificação”, reforça Guedes.
Resposta
O Ministério do Meio Ambiente informou que o Plano
Estadual de Combate à Desertificação, de 2011, foi elaborado de forma
participativa, com a coordenação do governo de Minas. No momento, o Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) realiza um mapeamento que possibilitará
ajustes territoriais das áreas mapeadas em 2011.
Estiagem eterniza drama de produtores rurais
Mesmo para o sertanejo mais calejado, a seca dos
últimos quatro anos tem sido difícil de suportar. A lavoura sucumbiu há tempos.
“A chuva foi embora cedo. Já chegou a hora de ela voltar e até agora, nada”,
lamenta o trabalhador rural Sávio Soares, de 58 anos.
Na zona rural de Montes Claros, ele tentou plantar
milho, feijão e até arroz, cultura que exige justamente muita água. “Usei uma
área perto do rio, mas ele secou”. A expectativa é a de que o longo período de
estiagem cesse neste ano. “O povo fala que essa seca toda é culpa do
desmatamento”, diz Soares, que neste ano, por insistência, prepara a terra para
plantar mais uma vez.
O estudo do Ministério do Meio Ambiente prevê um
aumento considerável nas temperaturas do Norte de Minas nas próximas décadas,
variando de 1,3°C a 3,8°C, em média, o suficiente para alterar ainda mais o
regime de chuvas.
Para a especialistas, não há outro caminho senão o
de preservar o verde que resta. “Se você pega uma pequena área para recuperar,
vai resolver localmente e ainda vai sair caríssimo. Então, é melhor preservar
e, em caso de exploração econômica, fazer de maneira sustentável”, afirma a
professora do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará,
Vládia Oliveira.
Para ela, que acompanhou de perto a elaboração do
relatório sobre desertificação no Nordeste, a crise econômica no país afetará
investimentos em projetos ambientais. “É onde se corta primeiro”.
A implantação de parques estaduais deve preservar
grandes áreas; os maiores estão previstos para Januária (400 mil hectares),
Bonito de Minas (300 mil hectares) e Cônego Marinho (200 mil hectares)


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