domingo, 25 de outubro de 2015

CARA DE PAU



  

Ricardo Galuppo


Abraçado a seu mandato com a força de um náufrago que se agarra ao primeiro pedaço de madeira capaz de boiar no mar revolto, o deputado Eduardo Cunha deu na semana passada mais uma prova de que já não sabe o que fazer para se segurar na presidência da Câmara. Ao dizer pela quinquagésima nona vez que não renunciará ao cargo nem que a porca torça o rabo, Cunha garantiu que não precisa do apoio da situação para se manter ali. Logo na sequência, assegurou que também não conta com a oposição para se segurar na cadeira. Em qualquer parlamento sério do mundo, uma declaração como essa causaria, no mínimo, espanto. Afinal, se Cunha não precisa da situação e dispensa ajuda da oposição, quem, afinal, o apoia?

Não há nada de engraçado nem de folclórico nessa dúvida. Ela é, talvez, o retrato sem retoques daquilo em que se transformou o Congresso desde que o toma-lá-dá-cá passou a ditar o ritmo do jogo. Existe, sim, um grupo de parlamentares que não é a favor nem contra, desde que tire vantagens dos impasses políticos. Um dos problemas da política brasileira é que a falta de clareza e a capacidade de dissimulação são vistas por Suas Excelências como qualidades capazes de lhes garantir vantagens num tabuleiro sobre o qual o que menos conta são os interesses da população.

Sem culpados

Idealmente, o eleitor escolhe o político com a esperança de que ele dance conforme a música que a sociedade deseja ouvir. No Brasil, onde os políticos impõem o ritmo da banda, a sociedade é que vem sendo pega de surpresa por atitudes capazes de provar, como dizia o velho Kafunga, que “o errado é que está certo”. A coleção de exemplos nessa linha é fenomenal. Dentro de uma semana ou duas, pode apostar, ninguém mais se lembrará do papelão do deputado Luiz Sérgio — que na semana passada teve o desplante de concluir o relatório dessa CPI convocada para “investigar” a corrupção na Petrobrás afirmando que ninguém é culpado. Ou melhor: para o petista, os únicos culpados foram os empreiteiros gananciosos, que se uniram para iludir a boa fé dos pobres, inocentes e honestíssimos companheiros que, nos últimos 12 anos dirigiram a maior companhia do país.

Também escorrerá pelo ralo do esquecimento a decisão do presidente do Senado, Renan Calheiros, que estendeu por mais 45 dias o prazo para o Planalto explicar aquilo que o Brasil inteiro está careca de saber. Ou seja, as tais pedaladas fiscais que ajudaram o governo a torrar o dinheiro do povo a torto e a direito para ajudar a reeleger Dilma no ano passado.

Cara de pau

Os movimentos de Cunha, o descaramento de Luiz Sérgio e a desfaçatez de Calheiros seriam, em qualquer parlamento que se levasse a sério, razões suficientes para que esses personagens saíssem da política pela porta dos fundos e nunca mais tivessem coragem de concorrer a uma eleição. No Brasil, não.

Tudo isso é muito grave. Agindo da forma como tem agido, o parlamento brasileiro vai abdicando da própria importância e do próprio papel e se apequenando aos olhos da sociedade. Ninguém ali parece minimamente interessado em contribuir para a solução de uma crise econômica que se mostra a cada dia mais profunda e que já projeta para 2016 um cenário tão ruim quanto o de 2015. Assim, fica difícil. Muito difícil.

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