José Antônio Bicalho
Estava demorando. Na semana passada,
com a divulgação do tenebroso resultado das contas públicas em julho (déficit
primário de R$ 7,224 bilhões), da queda do PIB no segundo trimestre (-1,9%) e
da entrada do país em recessão técnica, o conservadorismo voltou a se agitar. E
a sanha se voltou, como sempre, contra os programas sociais e de distribuição
de renda e os direitos trabalhistas.
Reunidos em Campos do Jordão (SP), na
última sexta-feira, no Congresso Internacional de Mercados Financeiro e de
Capitais, a quintessência do liberalismo econômico brasileiro colocou na mesa
suas sugestões para cobrir o rombo das contas públicas. Vamos às que mais me
preocuparam.
Para o economista Samuel Pessôa,
pesquisador do ultraliberal Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da
Fundação Getúlio Vargas, “a sociedade (deveria) olhar o contrato social e ver
que precisa mudar, como por exemplo a idade mínima na Previdência”. Já Affonso
Celso Pastore, que participou da mesma mesa redonda, afirmou que “ainda que o
governo escolha gastar mais para o bem-estar social, há limites e eles já foram
ultrapassados”.
Economia é ciência e os argumentos
contra os avanços recentes do ‘contrato social’ e pela redução de direitos
trabalhistas podem ser corroborados matematicamente. Mas economia é antes de
tudo ciência humana e o componente da justiça social não pode ficar fora das
fórmulas que sustentam uma tese, pelo menos não num país tão injusto como o
Brasil.
Não entrarei no mérito de quanto os
programas de distribuição de renda aplicados nos últimos anos colaboraram para
a difícil situação atual das contas públicas. Mas é hipócrita apontar o dedo
para os gastos sociais do governo e para os direitos dos trabalhadores antes de
corrigir distorções como a aposentadoria diferenciada para funcionários
públicos, os salários astronômicos (e ilegais) pagos ao judiciário, os gastos
sem controle do legislativo, a não taxação de grandes riquezas, os impostos que
recaem mais pesadamente sobre os mais pobres e tantas outras.
É fato que a economia atravessa um
momento absolutamente delicado. Mas se formos prescrever um receituário de
reformas estruturais é preciso ter em mente que a doença estrutural continua
sendo a absurda distribuição de renda e a divisão da sociedade brasileira entre
cidadãos de primeira e de segunda categoria. Não se trata de cortar de quem tem
pouco, mas de taxar quem tem de
sobra.
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