A FIFA NÃO
GASTA NADA – SÓ ARRECADA E LUCRA MUITO
Por que as estruturas temporárias viraram o
"pepino" da Copa
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Faltando dois meses
e meio para o início da Copa do Mundo, uma nova preocupação nas obras para o
Mundial surgiu para "atormentar" a Fifa em duas das 12 cidades-sede
do torneio. As chamadas estruturas temporárias são exigências para as arenas e
o entorno delas e envolvem desde geradores de energia elétrica e estrutura de
telecomunicações até os centros de mídia e de voluntários, passando por áreas
dedicadas à interação entre patrocinadores oficiais do evento e o público.
As instalações, que
serão usadas somente no Mundial, viraram um "pepino" de última hora
para as cidades-sede, adicionando uma conta que pode variar de R$ 30 milhões a
R$ 60 milhões no orçamento de quem se predispôs a receber jogos da Copa - tanto
as cidades quanto os clubes donos de estádios.
Mas por que esse
"problema inesperado" de última hora? A explicação principal está no
contrato firmado entre a Fifa e os donos dos estádios da Copa, ainda em 2009.
"A autoridade
do estádio se compromete a alugar, construir (se necessário) e providenciar
para a Fifa e o COL (...) o espaço requisitado para o uso exclusivo no período
da Copa e a removê-los (se necessário) depois do uso pela Fifa e pelo COL, sob
o custo da autoridade do estádio", é o que diz o documento ("Stadium
Agreement") assinado pelas 12 "autoridades de estádio" da Copa.
É justamente no
contrato firmado cinco anos atrás que o "pepino" começa. Com o poder
de barganha de quem é dona do maior evento esportivo do mundo, a Fifa consegue
aprovar contratos que, do ponto de vista jurídico, podem ser considerados
"excepcionais".
As próprias
estruturas temporárias, por exemplo, foram incluídas no acordo firmado em 2009,
mas não foram plenamente especificadas, item a item. Sem saber qual seria o
gasto exato com que estavam se comprometendo, os clubes e as cidades-sede
aceitaram as exigências e agora se viram "amarrados" com os custos
extras de instalações que serviriam apenas para a Copa e não ficarãm como
legado após o torneio.
Em 9 das 12
capitais brasileiras que sediarão a Copa, não houve muito o que discutir, já
que os estádios são públicos e, portanto, tanto a cidade-sede quanto o
"dono" da arena têm a mesma fonte de recursos.
Mas em Curitiba
(Arena da Baixada), Porto Alegre (Beira-Rio) e São Paulo (Itaquerão), os
proprietários dos estádios são os clubes - Atlético-PR, Internacional e
Corinthians, respectivamente - e nenhum deles quis arcar sozinho com as
despesas.
A consequência de
não cumprir com a obrigação do contrato às vésperas do torneio poderia ser até
mesmo a não realização da Copa naquela cidade ou estádio. Por isso,
cidades-sede e clubes se viram pressionados para chegar a um acordo.
"A Fifa pode
dizer: 'Eu sou o dono da bola, então não vai ter jogo no Beira-Rio'. O poder de
barganha dela é muito maior, porque Porto Alegre perde muito mais se ficar sem
a Copa (do que a Fifa se ficar sem Porto Alegre)", afirmou à BBC o
advogado André Zonaro Giacchetta, sócio do escritório Pinheiro Neto e
especialista em propriedade intelectual, entretenimento e lazer.
Além das estruturas
temporárias, a Fifa poderia fazer também outras exigências aos donos de
estádios ou cidades-sede a qualquer momento desde a assinatura do contrato.
É o que garante uma
das cláusulas do documento, que diz que a entidade pode modificar
"quaisquer diretrizes e outras orientações ora contidas e de acrescentar
exigências da Fifa a qualquer tempo a seu exclusivo critério".
Outra cláusula
determina a renúncia por parte das cidades-sede de qualquer pedido de
indenização em caso de cancelamento do evento por parte da Fifa.
"Tudo o que
você pensar em relação a esse evento é excepcional. A Fifa é dona de um evento
que os países se oferecem e se digladiam para sediar", disse Giacchetta.
"Ela tem um
contrato padrão, essas coisas foram negociadas em outros países mais
desenvolvidos também. E é simples: ou as cláusulas são aceitas ou ela não
realiza o evento".
Impasses
Os grandes impasses
com relação às estruturas temporárias aconteceram em Porto Alegre e São Paulo -
já que, em Curitiba, o Atlético-PR fez um acordo prévio com a prefeitura para
que ela bancasse as obras. Na capital gaúcha, o problema começou quando o
Internacional, clube que administra o Beira-Rio, entregou a arena pronta e se
posicionou dizendo que não teria recursos para pagar as obras complementares
pedidas pela Fifa.
Pelo contrato, o
próprio Inter seria o responsável pelos gastos, mas o clube argumentou.
"Os contratos foram acertados para o proprietário do estádio como ente
público. Nós, do Inter, consideramos que demos uma contribuição já para o ente
público com o contrato privado para a reforma do estádio", explicou a vice-presidente
do Internacional, Diana Oliveira, à BBC Brasil.
Com o impasse, a
solução veio com o investimento do governo estadual. Na última terça-feira, a
Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul aprovou um projeto de lei que
isenta do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) as empresas
que decidirem bancar as tais estruturas a serem construídas nas dependências do
Beira-Rio.
Assim, uma empresa
que tenha interesse em "ajudar" o Inter a bancar as estruturas poderá
investir o dinheiro equivalente ao que pagaria de ICMS e estará isenta do
imposto com o governo. O valor total que o clube colorado precisa arrecadar com
esse incentivo é de R$ 25 milhões. Questionada se haveria empresas interessadas
no investimento, a vice-presidente do Inter garantiu que sim.
"Muitas
empresas têm mostrado interesse. A natureza da rivalidade entre Inter e Grêmio
aqui no Sul faz com que tenham grandes empresas ligadas ao Inter querendo
colaborar."
Para completar os
R$30 milhões necessários, a prefeitura de Porto Alegre irá colaborar comprando
equipamentos, como geradores e ar condicionados, que podem ser reutilizados
depois da Copa.
Sem solução
Já na Arena
Corinthians, palco da abertura do Mundial, o impasse continua, com a diferença
de que a cidade de São Paulo já se isentou de qualquer investimento extra para
financiar as obras temporárias. A prefeitura da capital até se propôs a
oferecer parte das estruturas cedendo espaços públicos em Itaquera para abrigar
algumas delas, mas não se compromete com qualquer outro gasto.
"Nós temos
alguns contratos muito claros e definidores de quem responde pelo quê. Cada um
vai cumprir seu contrato", disse a vice-prefeita Nádia Campeão.
Em nota à BBC, o
governo estadual também afirmou que não arcará com os custos das estruturas.
"O Governo do
Estado de São Paulo não investirá recursos públicos em estruturas próprias do
estádio que abrirá a Copa do Mundo, sejam elas estruturas provisórias ou
definitivas. O compromisso assumido pelo Governo do Estado foi o de investir na
infraestrutura da região, fora do estádio, em ações que constituam um legado
para São Paulo."
A discussão agora
está entre o Corinthians, dono do estádio, e a Fifa. O secretário geral da
entidade, Jérôme Valcke está no Rio de Janeiro nesta semana e se mostrou otimista
por uma solução. "Estou bem confiante, temos uma companhia muito forte
trabalhando lá, a Odebrecht, e temos muita confiança que a empresa vai achar
uma solução", disse.
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