quinta-feira, 30 de julho de 2015

QUANDO O BRASIL SERÁ UM PAÍS EVOLUIDO



Em ruínas, cidade construída por Henry Ford na Amazônia aguarda tombamento como patrimônio histórico brasileiro
Vitor Nuzzi | Revista do Brasil | Fordlândia (PA) –

Fordlândia foi erguida no fim dos anos 1920 pelo magnata norte-americano, interessado nas seringueiras da floresta amazônica, e não vingou também por desprezo à cultura e à realidade locais, diz superintendente do Iphan




                                             Vista aérea de Fordlândia em 1933

Em 2015 completam-se sete décadas da ruína de um pedaço de império no meio da floresta amazônica. Era uma área extensa, de aproximadamente 15 mil quilômetros quadrados no sudoeste do Pará, na região de Santarém, a 800 quilômetros de Belém. Foi onde se construiu a Fordlândia, referência ao empresário norte-americano Henry Ford, que planejava estabelecer ali sua base de fornecimento de borracha. A aventura começou em 1927 e terminou em 1945, sem sucesso. A área hoje está em ruínas. No início deste ano, o Ministério Público Federal (MPF) solicitou rapidez ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico (Iphan) no processo de tombamento, mas ambos concordam que isso não será suficiente para recuperar e preservar o local.
Na primeira década do século passado, Henry Ford causou sensação com seu modelo T, pioneiro na fabricação em série. O modelo de produção inovador para a época foi batizado de fordismo. Surgia a linha de montagem. Para os pneus dos automóveis, ele precisava de borracha – e aí surge o projeto da Fordlândia.
O ciclo da borracha no Brasil já estava superado. No início do século 20, quem produzia eram colônias inglesas do Sudeste Asiático. O empresário viu na Amazônia oportunidade de investimento e de fornecimento contínuo e mais barato para seus produtos, fugindo do monopólio britânico. Adquiriu o terreno e, em pouco tempo, criou não apenas uma fábrica, mas uma típica cidade dos Estados Unidos em plena Amazônia, no fim dos anos 1920. Uma little town (cidadezinha) à beira do Rio Tapajós, que chegou a ter mais de 3 mil trabalhadores.
A produção da borracha, no entanto, nunca se firmou. As pragas atacaram as seringueiras e as plantações ainda foram transferidas – outra cidade foi erguida, em Belterra, que faz parte do processo de tombamento em análise pelo Iphan. Mas a indústria também já havia descoberto a borracha sintética. O projeto brasileiro perdia sentido.


[Escola da Vila Americana em 1933. Imagem: Benson Ford Research Center]

A empresa teve ainda problemas com seus funcionários brasileiros, ao tentar impor uma cultura norte-americana que não se limitava ao modelo de produção e incluía novos hábitos de comportamento e alimentares. Em 1930, por exemplo, houve uma rebelião de trabalhadores, que se batizou de Revolta das Panelas, descrita em detalhes pelo historiador norte-americano Greg Grandin, no livro “Fordlândia – Ascensão e Queda da Cidade Esquecida de Henry Ford na Selva”, lançado no Brasil cinco anos atrás.
Segundo a superintendente do Iphan no Pará, Maria Dorotéa de Lima, o processo de tombamento encontra-se “em vias de finalização”, com algumas pendências. Mas os problemas são muitos, acrescenta. “Na prática, quem responde pela gestão local é a prefeitura de Aveiro, pois Fordlândia é um distrito municipal. Porém, trata-se de área da União, o que dificulta a atuação do município no que se refere à fiscalização”, diz Dorotéa, que conta ter experimentado “sensações contraditórias de fascínio e desolação” ao visitar o local. “O desafio está em superar o isolamento e encontrar soluções que associem preservação, sustentabilidade e gestão.”
“Só o tombamento não vai resolver, se não houver outros canais de proteção”, afirma a procuradora Janaína Andrade, do MPF paraense, que vê necessidade de políticas públicas para cuidar efetivamente da área. “A situação é difícil. Com o passar do tempo, as intempéries vêm, e são perdas que não serão recompostas. E não é só esse patrimônio. Assim como na Fordlândia, infelizmente o patrimônio cultural não tem valor. O próprio Iphan não tem estrutura”, lamenta Janaína.
       Galpão de antiga fábrica de borracha em Fordlândia, hoje em ruínas
No começo de junho, a procuradora esteve em contato com a Secretaria do Patrimônio da União (SPU), que atua junto com o Iphan no caso. Foi feito um pedido de seis meses para conclusão do inventário. Apesar do prazo elevado, o Ministério Público tende a aceitar, até por uma questão prática: uma possível ação civil pública não teria efeito nenhum, porque não haveria como cumpri-la.
Para Janaína, é preciso tentar despertar a consciência da população. “A sociedade não valoriza o patrimônio que tem lá”, afirma. Uma ideia em estudo, que está sendo discutida com professores da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), é levar um curso de extensão (de Arqueologia) de Santarém para Aveiro, cidade onde fica a Fordlândia, com população estimada em 16 mil pessoas, segundo o IBGE.


[Escritório utilizado pelos dirigentes de Fordlândia, hoje abandonado.   

                        A Fordlândia deixou de existir, definitivamente, em 1945. O governo brasileiro indenizou a empresa e ficou com a infraestrutura, que aos poucos se perdeu. O local chegou a receber instalações federais e fazendas, com casas habitadas por servidores do Ministério da Agricultura. Mas a área foi abandonada aos poucos e os prédios se deterioraram ou foram alvo de vandalismo. Ainda há moradores na região. Alguns ocuparam casas remanescentes da chamada Vila Americana.
Recentemente, o repórter Daniel Camargos, do jornal Estado de Minas, visitou o local. Sua descrição a respeito do hospital que funcionava ali ajuda a dar uma ideia do que aconteceu com o passar do tempo: “O projeto do hospital foi elaborado pelo arquiteto Albert Khan, o mesmo que projetou as fábricas da Ford em Highland e River Rouge, nos Estados Unidos. A capacidade era de 100 leitos e foi um dos mais modernos do país, sendo o primeiro a realizar um transplante de pele. Hoje, é só mato e ruínas. No local abandonado, somente o zumbido de mosquito interrompe o silêncio”.




[Escritório utilizado pelos dirigentes de Fordlândia, hoje abandonado.
 
Dorotéa considera que a experiência pioneira, no sentido de implementação de um grande projeto internacional na Amazônia, não deve ser desprezada, mas faz ressalvas. “Os muitos estudos e trabalhos a respeito revelam que o desprezo do componente cultural e da realidade local muito contribuiu para os desacertos”, analisa a superintendente do Iphan. “Muitos projetos vieram depois e, apesar de outro entendimento da região e do componente local, pode-se dizer que continuamos a ser meros fornecedores de matéria-prima, inclusive no caso da energia. Muitas vezes o que fica na região é apenas o lado perverso desses investimentos: desmatamento, poluição, aumento da população nas periferias dos projetos em áreas de ocupação irregular, inchando as cidades que, em geral, não têm as condições devidas para atendê-las.”
Henry Ford morreu em 1947, sem conhecer sua cidade amazônica.
Matéria original publicada na Revista do Brasil.

INTERESSANTE


JUSTIÇA - SEJA JUSTA



  

Manoel Hygino


Mais uma vez, a nação vive uma crise: econômica, social e institucional, já sem nos referirmos à moral e ética. A degradação de costumes, de um modo geral, fere os homens probos que ainda acreditam no bem e no bom, no legal e no justo. Age-se sorrateiramente, em grandes negócios, escondendo-se o escuso nas entrelinhas de contratos vultosíssimos.

A elasticidade da legislação – é lei dura mas estica – permite que bons escritórios de advocacia e profissionais conceituados e de elevados honorários consigam a procrastinação das decisões. E aí, mais uma causa da desconfiança do cidadão e da sociedade. A ocasião faz o ladrão, mas a impunidade o estimula. E eis que, no Brasil, a ousadia dos gatunos de alto coturno, aliada à atuação de defensores de incontestáveis méritos, tem impedido que os responsáveis por crimes de efetiva magnitude sejam levados ao cumprimento de rigorosas penas. Poder-se-ia contar nos dedos os que se viram por sua ação iníqua, sobretudo contra o erário e o patrimônio público, serem levados às prisões.

O Judiciário tem sido repetidamente falho nas condenações, não só pela abertura da legislação, mas ainda pela própria situação de magistrados, escolhidos pelos chefes de Executivo. Favores e benefícios marcam os julgamentos, às vezes, minuciosamente arquitetados desde a escolha dos integrantes de tribunais.

O sistema, incontestavelmente pernicioso às mais nobres aspirações de uma nação, conduziu o Brasil ao que ora é, acompanhado com suspeição no concerto mundial. Os recentes acontecimentos, que vêm desde o mensalão – uma experiência de grande significação para nossos costumes políticos e administrativos – evidentemente ferem interesses de pessoas e grupos. Mas é o que deve prevalecer por ser o mais válido e mais servirem ao futuro.

Vivemos um período grave da vida nacional, do qual se deve extrair lições. Não se pode perder ensejo tão doloroso e traumático, para o qual, aliás, recorro a ideias de José Saramago:

“A Justiça continuou e continua a morrer todos os dias. Agora mesmo, neste instante em que vos falo, longe ou aqui ao lado, à porta da nossa casa, alguém a está matando. De cada vez que morre, é como se afinal nunca tivesse existido para aqueles que nela tinham confiado, para aqueles que dela esperavam o que da Justiça todos temos o direito de esperar: justiça, simplesmente justiça. Não a que se envolve em túnicas de teatro e nos confunde com flores de vã retórica judicialista, não a que permitiu que lhe vendassem os olhos e viciassem os pesos da balança, não a da espada que sempre corta mais para um lado que para o outro, mas uma justiça pedestre, uma justiça companheira quotidiana dos homens, uma justiça para quem o justo seria o mais exato e rigoroso sinônimo do ético, uma justiça que chegasse a ser tão indispensável à felicidade do espírito como indispensável à vida e o alimento do corpo...”

O Judiciário tem sido repetidamente falho nas condenações

NEGÓCIOS SEM VERGONHA



  

José Antônio Bicalho


Era apenas questão de tempo. A operação “Lava Jato” chegou efetivamente ao setor elétrico com a prisão do presidente licenciado da Eletronuclear, Othon Luiz Pinheiro da Silva, delatado por corrupção pelo ex-executivo da Camargo Corrêa, Dalton Avancini.

E já que o assunto é setor elétrico e Camargo Corrêa, contarei outra história nebulosa envolvendo os mesmos personagens e mais um: a Cemig. Já tratei do assunto na coluna publicada em 18/11 do ano passado, que pode ser acessada pelo portal do Hoje em Dia.

A história é a seguinte: em junho do ano passado, a Andrade Gutierrez Participações vendeu 83% da sua participação na megausina de Santo Antônio (12,4% do capital total), em construção em Rondônia, para o fundo FIP Melbourne, integrado por Cemig e outros investidores. A Cemig, que já era dona de 10% de Santo Antônio, foi quem comprou a maior parte das ações da Andrade Gutierrez (86,7%). Pagou R$ 835,8 milhões em duas parcelas. A participação da Cemig passou a equivaler a R$ 3,617 bilhões, ou 17,7% do valor patrimonial da usina.

Naquele momento, a usina de Santo Antônio atravessava um momento complicado. No auge da crise hídrica, as obras da usina estavam atrasadas. O consórcio responsável pela construção e operação da usina, o Santo Antônio Energia, estava ameaçado de arcar com o prejuízo bilionário que estava causando às distribuidoras com as quais havia firmado contratos de fornecimento de energia.

Pulando fora

É neste momento difícil que a Andrade Gutierrez resolve pular fora do barco e, a Cemig, aumentar sua participação. Coincidentemente, a Andrade Gutierrez é o maior acionista da Cemig depois do governo de Minas, detendo 33% do capital da estatal. Pela importância dessa participação, a Andrade Gutierrez indicava o diretor de Novos Negócios, ou seja, a pessoa que decidiria onde a Cemig deveria ou não investir.

Em 21 de outubro, quatro meses depois do negócio entre Cemig e Andrade Gutierrez, a Assembleia de Acionistas da Santo Antônio Energia aprovou uma chamada de capital junto aos sócios, de R$ 1,59 bilhão, a maior parte a ser usada no pagamento das dívidas com as empreiteiras, que chegavam a R$ 700 milhões. E adivinha quem estava entre as construtoras? Andrade Gutierrez, sim, e mais a Odebrecht.

Ou seja, a Andrade Gutierrez recebeu pela venda de sua participação para a Cemig, se livrou da nova chamada de capital e recebeu seus atrasados como construtora. Já a Cemig pagou pela participação e foi obrigada a colocar mais dinheiro em Santo Antônio.

Resultado

O resultado se viu no balanço da Cemig do terceiro trimestre do ano passado, que trouxe o impacto da compra. De julho a setembro, o lucro líquido da Cemig foi de R$ 29,1 milhões, 96% menor que os R$ 788,8 milhões apurados no mesmo período do ano anterior. E o resultado da equivalência patrimonial ficou negativo em R$ 102,1 milhões, enquanto no mesmo período do ano passado foi positivo em R$ 349,1 milhões.

A antiga diretoria da Cemig sempre defendeu o investimento em Santo Antônio como importante para fazer frente à ameaça de ter que devolver grandes usinas que se aproximam do fim do prazo de concessão. Ok, mas não me convenceram de que precisava ter sido feito daquela forma, com aquela empresa e naquele momento.

INVESTIGAÇÃO NO BNDES



  

Márcio Doti


Ao entrar agosto, veremos se de fato promessas serão cumpridas, seja pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, seja por todos os outros parlamentares comprometidos com a missão de representar o interesse do povo, no sentido de fazer andar uma investigação no BNDES. É preciso passar a limpo as transações do órgão que nasceu para fomentar o desenvolvimento do país em busca de empregos, de impostos, de economia aquecida e saudável.

Hoje, a imagem está longe de ser boa e livre de suspeitas. As ações começaram com a vinda da Polícia Federal a Belo Horizonte, sem conseguir entrar no escritório e na casa do governador Pimentel, na sede do PT, na Petrobras e no BNDES por falta de autorização da Justiça.

Mas, o que ficou sem explicação foi o esfriamento das investigações a partir das reações de Pimentel e das ameaças feitas pelo PT ao próprio Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, criticado vergonhosamente por deixar que as investigações chegassem tão longe, atingindo até um governador. Como se cargos estivessem imunes a apurações e investigações, principalmente em se tratando de um governador que foi ministro da pasta que comanda o BNDES, hoje sob a mira do interesse público e de muitas suspeitas, porque foi de lá que saíram bilhões de reais para financiar as obras internacionais da Construtora Odebrecht e certamente que de outras mais, em condições que precisam ser esmiuçadas a ponto de afastar qualquer possibilidade de grandes desvios.

Já basta que o Brasil estivesse financiando obras em países amigos com um dinheiro que chegou a faltar até para pagar o seguro desemprego e o financiamento do ensino superior, tratado a pão e água em matéria de repasse de verbas, mas servindo de grande alavanca de votos, como foi o caso do Pronatec. As investigações derivaram para as bandas de Angra 3 e ainda bem que o comando disso tudo não é Brasília, pelo menos por enquanto, tudo vem do Paraná, um juiz corajoso e um Ministério Público Federal também, dando apoio ao trabalho da Polícia Federal.

Ligações perigosas

Será que aparece outro juiz corajoso para cuidar do BNDES? Sem tender para qualquer lado, mentes sensatas já perceberam que as investigações em cima do BNDES são indispensáveis até mesmo para livrar quem for inocente de um enorme peso de suspeita surgida a partir de ligações perigosas entre a esposa de Pimentel, Carolina, e o empresário Bené, e ainda, também as ligações da própria primeira dama do Estado com o BNDES, de onde era funcionária, mas trabalhando com o então Ministro de Desenvolvimento e hoje governador de Minas.

Uma CPI bem conduzida e um trabalho sério como o que se realiza no Paraná, pela justiça, são indispensáveis por tudo isso e mais pelos contratos de financiamento de alto vulto beneficiando países vizinhos, a construtora Odebrecht, restando saber se nada disso foi feito com prejuízo para o dinheiro dos brasileiros.

Mas, para finalizar, não se pode deixar de pensar que tudo isto ia ficar na conta do sigilo, ninguém ia saber de nada se o Supremo não tivesse derrubado o decreto que protegia as transações de qualquer divulgação ou conhecimento até do Tribunal de Contas da União. Imagina!