sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

AUXÍLIO EMERGENCIAL DEVERÁ TER QUATRO PARCELAS

 

Novo auxílio deve ter quatro parcelas de R$ 250; contrapartidas virão em 2 PECs

Corte de despesas e de renúncias, cobrado por Paulo Guedes, será dividido em duas etapas; a ‘PEC de guerra’ terá versão mais compacta de medidas fiscais e outra PEC terá propostas mais duras de corte de gastos

Adriana Fernandes, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – Governo e lideranças do Congresso avançaram nas negociações para a concessão de mais uma etapa do auxílio emergencial com valor de R$ 250 em quatro parcelas, com custo total de cerca de R$ 30 bilhões. O benefício deve começar a ser concedido em março com término em junho.

Já há entendimento político de que a concessão do auxílio terá de ser dada por meio da aprovação de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) de orçamento de guerra, semelhante, mas não igual à aprovada em 2020. Na prática, o orçamento de guerra permitiu que o governo ampliasse os gastos no combate à pandemia livre das “amarras” das regras fiscais.

Pagamento do auxílio emergencial deve começar em março, disse Bolsonaro. Foto: Gabriela Biló/Estadão

Agora, as medidas de contrapartidas de corte de despesas e de renúncias fiscais, cobradas pelo ministro da EconomiaPaulo Guedes, serão divididas em duas etapas.

A “PEC de guerra”, que se espera esteja aprovada até a primeira semana de março, conterá uma versão mais compacta de medidas fiscais com base em um texto que já está no Senado, o do pacto federativo, que tem como relator o senador Márcio Bittar (MDB-AC).

Essa PEC terá a cláusula de calamidade e permitirá que os gastos para o pagamento do auxílio não sejam incluídos no espaço no teto de gastos, a regra que impede o crescimento das despesas acima da inflação, nem no Orçamento de 2021.

A segunda PEC conterá a outra parte das medidas mais duras de corte de despesas, com o objetivo de sustentar a sobrevivência do teto de gastos até 2026. As lideranças buscam fechar um compromisso para que essa segunda PEC fiscal esteja aprovada até junho, quando terminará o pagamento do auxílio. A ideia é consolidar o que os líderes do governo têm chamado de “fortalecimento das âncoras fiscal e monetária”, com a garantia da sobrevivência do teto de gastos e aprovação da autonomia formal do BC.

A expectativa é de que até o fim da próxima semana a divisão das medidas entre as duas PECs esteja concluída. Segundo fontes envolvidas nas negociações, esta semana de discussões entre Guedes e lideranças do Congresso termina com o consenso de que o instrumento legal para o pagamento do auxílio emergencial é via “PEC de guerra”. Pareceres da área jurídica do Ministério da Economia e da Advocacia-Geral da União (AGU) apontaram essa necessidade. Consultoria do Senado também deverá apresentar parece nessa direção.

Nessa primeira PEC, será retomado o estado de calamidade com as medidas de ajuste. Detalhes técnicos do que será aproveitado da PEC que deu origem ao orçamento de guerra ainda estão sendo discutidos entre o governo e os presidentes da CâmaraArthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

O mundo político queria o valor do auxílio em R$ 300 em seis parcelas, enquanto o ministro Guedes de R$ 200 em três parcelas. O meio termo deve prevalecer, segundo apurou a reportagem. Ou seja, devem ser pagas quatro parcelas de R$ 250. O presidente Jair Bolsonaro em discurso ontem deu o tom da estratégia ao falar que “não basta apenas conceder mais uma período de auxílio, mas é preciso ter responsabilidade fiscal”. Bolsonaro disse que uma nova rodada do auxílio emergencial deve ser paga a partir de março e por um período de até quatro meses. A leitura na área econômica é de que as medidas fiscais serão aprovadas na primeira e na segunda PEC.

Bolsa Família

Está descartado o movimento inicialmente de ampliação agora do Bolsa Família, que ficará para o segundo semestre depois do fim do auxílio. Até o fim da semana que vem, também deverão estar fechados os parâmetros do público-alvo do novo auxílio.

A ideia é pagar para todas as famílias que são elegíveis ao Bolsa Família (cerca de 19 milhões) mais 11 milhões de informais que, se calcula, estão ainda enfrentando dificuldade por conta da pandemia. A dificuldade maior é identificar quem de fato nesse grupo precisa do auxílio agora. Vários recortes de público estão sendo feitos com base nos dados do Cadastro Único e nos pagamentos que foram feitos no auxílio anterior.

Com a PEC aprovada, o pagamento do auxílio será feito por meio de contratação de dívida, sem que as despesas passem pelo Orçamento de 2021.

STF JULGOU DIREITO AO ESQUECIMENTO

 

Análise: Julgamento sobre direito ao esquecimento reafirma garantias individuais

O plenário do STF reiterou o sistema de liberdades públicas presente no texto constitucional

  •  Guilherme Amorim Campos da Silva*, O Estado de S.Paulo

Supremo Tribunal Federal decidiu por maioria de votos nesta quinta-feira, 11, contra o reconhecimento do chamado “direito ao esquecimento”, no âmbito do julgamento de um recurso extraordinário com repercussão geral. A ação, como amplamente divulgado, foi ajuizada por familiares da vítima de um crime ocorrido há mais de 50 anos que se opunham à exibição de um programa televisivo que revolveria fatos, informações, imagens e detalhes dos acontecimentos, inclusive com reconstituições cênicas.

O estabelecimento de efeitos do julgamento com repercussão geral implica afirmar que a decisão colegiada orientará e vinculará normativamente todas as demais instâncias do Poder Judiciário nacional. À luz das normas confrontadas da Constituição Federal, portanto, isto significa estabelecer o alcance dos seus efeitos normativos a partir da interpretação que o plenário do Supremo Tribunal Federal estabeleceu com este julgamento em relação aos dispositivos constitucionais tidos por violados.

O presidente do STF, Luiz Fux, durante julgamento sobre o direito ao esquecimento Foto: Nelson Jr./STF

Por 9 x 1, o plenário do Supremo Tribunal Federal entendeu que o denominado “direito ao esquecimento” é incompatível com a Constituição Federal. Não votou o ministro Luís Roberto Barroso e ficou vencido o ministro Edson Fachin.

Todos os ministros que votaram no sentido de reconhecer a incompatibilidade da existência de um direito ao esquecimento concordaram que a discussão recai sobre normas constitucionais protetoras de direitos e garantias individuais.

De um lado, ao se buscar a proteção da privacidade e da possibilidade de se apagar dados relativos ao indivíduo de bancos de dados públicos, a partir de requerimentos de particulares, a discussão sobre a extensão dos direitos assegurados no artigo 5, X da Constituição que preserva a inviolabilidade do direito à intimidade, à vida privada e à imagem das pessoas.

De outro lado, parecendo confrontar esta possibilidade, a ampla liberdade de manifestação do pensamento e da liberdade de informação, com vedação da censura, também assegurada em dispositivos constitucionais, no artigo 5º, incisos IV, IX, XIV e artigo 220, §§1º e 2º da Constituição Federal.

Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes abordou, de forma expressa, a impossibilidade de se utilizar como parâmetros as normativas existentes no Regulamento (UE) 2016/679, de 27 de abril de 2016, da União Europeia, que afirma a existência de um direito ao esquecimento sobre dados disponíveis e consentidos, mas que os ressalva justamente em relação ao exercício da liberdade de expressão e de informação (artigo 17º).

O plenário do Supremo Tribunal Federal reafirmou o sistema de liberdades públicas presente no texto constitucional, pressuposto de um regime de responsabilidade democrática no exercício de direitos: é ampla a liberdade de informação, manifestação do pensamento, sendo que qualquer restrição prévia se assemelha ou equivale à censura. Este é o teor do conjunto normativo que orienta a manifestação da Corte. E é neste sentido que se reconhece a incompatibilidade de um direito ao esquecimento: pela impossibilidade de evitar o consequente daquela premissa. A verificação do exercício do direito, que pressupõe sempre a responsabilização do seu autor pelos excessos e abusos eventualmente cometidos.

Por esta razão que a tese afirmada no plenário nesta quinta-feira repisa a lógica de que “eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais, especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral, e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível”, mesmo em relação àquelas notícias ou eventos que abordem fatos ou personagens distantes no tempo, desde que o tratamento da informação tenha sido obtido de forma lícita, ou em banco de dados público.

A decisão plenária ainda traz outra consequência, a par de vincular instâncias do Poder Judiciário nacional: previne eventual processo legislativo que venha produzir normas disciplinadoras de tratamento de dados, em banco de dados públicos, em sítios, mídias eletrônicas ou digitais que possam tangenciar o conceito referenciado no direito ao esquecimento.

Isto porque, em que pese a tese pronunciada deixar claro que o sistema constitucional trabalha de forma repressiva, caso a caso, mediante uma lógica de eventual reparação de abusos, vinculou, também, a incompatibilidade normativa do denominado direito ao esquecimento com o sistema constitucional.

Isto implica a afirmação de que qualquer conteúdo normativo que, de forma geral, procure disciplinar o trato de informação que possa ter repercussão pública ou perante terceiros configura, em tese, controle prévio de informação e, portanto, é antijurídico à luz da ampla liberdade de acesso à informação e divulgação de ideias assegurado no texto constitucional.

Evidência desta lógica deôntica está presente no raciocínio externado pela ministra Cármen Lúcia, quando afirmou como ínsito a um princípio da solidariedade às gerações (próprio do capítulo do Meio Ambiente, mas que, segundo a ministra, perpassa toda a Constituição) a impossibilidade do reconhecimento sistêmico a um prolatado direito ao esquecimento, pois isto se constituiria em censura presente de fato passado.

O julgamento revela a reafirmação em peso, por parte da amplíssima maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal, do conjunto de direitos e garantias individuais previstos na Constituição Federal como conjunto normativo fundante e vetor de orientação para os poderes constituídos da República.

*SÓCIO DE RUBENS NAVES, SANTOS JR. ADVOGADOS. DOUTOR EM DIREITO, ADVOGADO. AUTOR DO LIVRO ‘USO DE PRECEDENTE ESTRANGEIRO PELA JUSTIÇA CONSTITUCIONAL’

GENERAL VILLAS BÔAS SUGERE EM LIVRO QUE SE O LULA FOSSE LIBERTADO HAVERIA GOLPE

 

Em livro, Villas Bôas diz que tuíte na véspera de julgamento de Lula foi planejado com Alto Comando

Uma dia antes da Corte julgar um habeas corpus do ex-presidente, o chefe militar postou que a Força compartilhava ‘o anseio de todos os cidadãos de bem’

Caio Sartori, O Estado de S.Paulo

RIO – O general Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército nos governos Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB), revelou em livro ter planejado com o Alto Comando da Força o tuíte que foi interpretado como pressão para que o Supremo Tribunal Federal (STF) não favorecesse o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2018. Na ocasião, um dia antes da Corte julgar um habeas corpus ajuizado pelo petista, o chefe militar primeiro tuitou que a Força compartilhava “o anseio de todos os cidadãos de bem”. Depois, divulgou novo tuíte citando as instituições, com tom ainda mais político.

“Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do País e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?”, dizia. O texto chegou a ser interpretado como ameaça de golpe, caso Lula fosse libertado. O ex-presidente cumpria pena estabelecida pelo juiz Sérgio Moro, no processo do triplex do Guarujá. Sua libertação poderia ter influência na campanha eleitoral. A disputa foi vencida, no segundo turno, por Jair Bolsonaro, derrotando o petista Fernando Haddad.

A versão está no livro General Villas Bôas: Conversa com o Comandante, lançado pela Editora FGV a partir de uma longa entrevista dada ao pesquisador Celso Castro. Nela, o militar detalha, do seu ponto de vista, como se deu a construção daquele recado. Para ele, não foi uma ameaça, e sim um “alerta”.

O general Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército Foto: Daniel Teixeira

“O País, desde algum tempo, vive uma maturidade institucional não suscetível a possíveis rupturas da normalidade. Ademais, eu estaria sendo incoerente em relação ao pilar da ‘legalidade’ (citado no tuíte). Tratava-se de um alerta, muito antes que uma ameaça”, afirma Villas Bôas no livro.

Segundo o general, houve duas motivações para a mensagem. Uma era o que chamou de insatisfação da população com o País. A outra era a demanda que chegava ao Exército por uma intervenção militar – Villas Bôas afirmou considerar essa medida impensável. Além de planejado com o Alto Comando, o recado, segundo o general, passou por revisão dos comandantes militares de área, seus subordinados. Contudo, na formulação do tuíte de ampla repercussão, o então ministro da Defesa, Raul Jungmann, ao qual Villas Bôas era formalmente subordinado, não foi ouvido.

O comandante alegou que não tinha a intenção de mudar o voto de nenhum ministro. Àquela altura, o mistério envolvia a posição da ministra Rosa Weber, que decidiria a votação.  Para o general, poderia haver um “sentimento generalizado de insatisfação” dentro do Exército caso o resultado do julgamento fosse favorável a Lula. Mas, segundo ele, a disciplina continuaria inalterada.

Além do tuíte em si, o general contou no livro que implantou no Exército uma nova estratégia de comunicação. O objetivo era normalizar posições políticas da força. “Estabeleci como meta que o Exército voltasse a ser ouvido com naturalidade. Teríamos de romper um patrulhamento que agia toda vez que um militar se pronunciava, rotulando de imediato como quebra da disciplina ou ameaça de golpe.”

Esse planejamento se deu com o general Rêgo Barros, que era chefe do Centro de Comunicação Social do Exército (CComSEx) e depois foi porta-voz do governo de Jair Bolsonaro. Deixou o cargo em outubro de 2020, depois de ter suas funções esvaziadas, e tornou-se crítico do governo.

General fala de combate ao ‘politicamente correto’ para explicar Bolsonaro

Villas Bôas também comentou no livro a eleição de Jair Bolsonaro e seu governo, repleto de militares. Segundo o ex-comandante, a vitória eleitoral do ex-capitão do Exército se deu por causa da ênfase ao “combate ao politicamente correto”. Apesar de vago e sem lastro acadêmico, o termo tem sido usado nos últimos anos para criticar supostos filtros impostos a determinados assuntos.

“Bolsonaro deu ênfase ao combate ao politicamente correto, do qual a população estava cansada. A Globo, reino do politicamente correto, foi o mais importante cabo eleitoral do presidente eleito”, opina.

O general diz que o presidente Bolsonaro despertou entusiasmo entre os militares por manifestar certas posições até então esquecidas, “indo ao encontro da ansiedade de muitos”. Perguntado se Fernando Haddad conseguiria assumir sem problemas o governo caso vencesse a eleição, Villas Bôas garantiu que sim.

Para o comandante, o governo Bolsonaro não representa uma volta dos militares ao poder, mesmo havendo generais em altos postos. As nomeações e exonerações, diz, não têm relação com o Exército como instituição.

Demonstrando alinhamento com o governo, o general defende um dos ministros civis mais controversos: Ricardo Salles, do Meio Ambiente. Para Villas Bôas, Salles é alvo de um “massacre de acusações” com origem “até mesmo no exterior”. O ex-comandante disse que o ministro “corajosamente, desde que assumiu sua pasta, vem lutando para desmontar estruturas aparelhadas, ineficientes e corrompidas, que criaram um ambiente favorável à dissipação de recursos financeiros, sem que se produzam os efeitos pretendidos”.

Villas Bôas relatou ainda insatisfação do Exército com a presidente Dilma Rousseff. Além de citar as acusações de corrupção e a deterioração econômica, mencionou com desgosto a Comissão da Verdade. O grupo foi criado para apurar os crimes do Estado brasileiro na ditadura militar.

Sem reconhecer a culpa dos militares pelo regime de exceção responsável por torturas e desaparecimento de opositores, o ex-comandante atribuiu o período à Guerra Fria e criticou a luta armada. Para Villas Bôas, a Comissão da Verdade soou como um “revanchismo” dos derrotados pelo regime militar.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

AUXÍLIO EMERGENCIAL SOLUÇÃO FICA APÓS O CARNAVAL

 

Solução para fim do auxílio emergencial vai ficar para depois do carnaval

Tempo que se perde rodando em círculos significa mais gente passando necessidade em todo País

Adriana Fernandes*, O Estado de S.Paulo

O recuo de 6,1% das vendas do varejo de novembro para dezembro surpreendeu negativamente e mostrou que a segunda perna da retomada em V da economia está cambaleando. Um carimbo a mais para sinalizar a perspectiva pior para a economia no primeiro trimestre deste ano.

A razão do aumento da pressão pelo retorno auxílio emergencial deriva muito mais desse diagnóstico econômico do que uma preocupação genuína dos parlamentares com a situação de pobreza e dificuldade que passam milhões de brasileiros sem trabalho e renda nessa segunda onda da pandemia, com cepas mais perigosas do vírus, lentidão da vacinação e média móvel de mortes acima de mil pelo 21.º dia seguido.

Fosse o contrário, governo e parlamentares já teriam corrido para dar uma solução para o problema muito antes de o auxílio emergencial acabar. Era tudo previsível. Agora, a solução ficou para depois do carnaval, mesmo após dez dias do resultado das eleições do Congresso. Esse tempo que se perde rodando em círculos significa gente passando necessidade.

Dinheiro do auxílio foi direto para o consumo e sustentou a arrecadação. Foto: Wilton Júnior/Estadão

Boa parte da pressão a alimentar a movimentação dessa semana pró-auxílio vem de deputados, prefeitos e governadores aliados desesperados por uma injeção de estímulo para a economia. Isso fez o presidente Jair Bolsonaro tirar a fantasia antes mesmo de o carnaval começar e dizer que a medida é para ontem (até então ele se mostrava contrário à prorrogação). O dinheiro do auxílio que foi direto para o consumo sustentou a arrecadação e, agora, a sua redução, a partir do fim do ano, mostra forte impacto econômico.

Todos os políticos que correm agora para defender a urgência do auxílio (parlamentares e administradores públicos de todos os Poderes) deveriam estar preocupados também em reforçar o planejamento das restrições de isolamento para barrar o avanço da covid-19.

Até agora, infelizmente, toda a discussão em torno da prorrogação do auxílio está desconectada de medidas restritivas. Elas só acontecem nos locais quando a situação de colapso e caos se instalou. E mesmo assim meia-boca.

Sem essa conexão, o auxílio, mesmo que necessário e urgente, se revela tão somente como uma medida de transferência de renda aos pobres, que já podia ter sido desenhada desde o ano passado e aprovada pelo Congresso.

Por que não aproveitar as negociações da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) de orçamento de guerra, que o ministro Paulo Guedes exige para dar o auxílio, para cobrar dos prefeitos algum tipo de compromisso nessa direção?

Se Bolsonaro é contra, o Congresso poderia assumir essa campanha e responsabilidade. A vacinação deu esperança, mas é lenta e tem servido para mais afrouxamento do já escasso isolamento social. Um plano desse tipo resultaria em menos mortes e, com certeza, em menor custo para o governo. Na Alemanha, o governo anunciou que prorrogará o lockdown em vigor até o dia 7 de março. Um acordo fechado entre a chanceler Angela Merkel e os governadores já prevendo de antemão flexibilizações. Aqui no Brasil, seguimos nesse rastro de insensatez. Até locais com restrições mais sérias, como Belo Horizonte, já flexibilizaram.

Por enquanto, é certo que muitos daqueles que nada fizeram para ampliar o nível de isolamento da população vão bater na porta do Tesouro para pedir mais estímulos. Não vai parar no auxílio. Estão sendo cobradas também a retomada do programa de estímulo ao emprego (BEm), mais crédito subsidiado, suspensão de pagamento de impostos…

O ministro Guedes tem tentado segurar a pressão com medidas de antecipação de recursos, com a antecipação do abono salarial, que injetam recursos na economia. É pouco, mas tenta ganhar tempo.

Depois do auxílio, que já está dado, a queda de braço de fato com o Congresso é que vai começar. O Centrão virá com tudo para cima de Guedes. A votação acachapante do projeto de autonomia do Banco Central mostrou força, mas tem seu preço.

A aprovação da PEC de orçamento de guerra para dar o auxílio é inescapável e vai abrir a porta para mais pedidos de estímulos. O que sabemos de antemão é que a PEC vai ficar só na liberação das regras fiscais para gastar mais fora do teto de gastos. As medidas compensatórias cobradas por Guedes e Roberto Campos Neto, do BC, não vão rolar.

*É REPÓRTER ESPECIAL DE ECONOMIA EM BRASÍLIA

BANCO CENTRAL TEM A MISSÃO DE ZELAR PELA ESTABILIDADE DE PREÇOS

 

Análise: A missão do BC de zelar pela estabilidade de preços será reforçada na nova lei

Embora importantes, demais objetivos ficam em segundo plano, para que não se ponha em risco a estabilidade tão apreciada pela população

Arminio Fraga*, O Estado de S.Paulo

Bancos centrais não possuem o poder de afetar de maneira permanente o nível de atividade ou seu crescimento, que dependem de investimento, educação, produtividade, etc. Bancos centrais têm sim o poder de criar o caos da inflação, como bem sabemos.

Decorre naturalmente daí atribuir ao banco central a missão de zelar pela estabilidade de preços, hoje entendida nos principais países com sendo algo em torno de 2% ao ano, e que caminha aqui para 3%. Assim reza o modelo de meta para a inflação consagrado internacionalmente.

Lei deixa claro que Banco Central deve focar nas prioridades. Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Em boa hora essa missão será reforçada na nova lei, que deixa claro que o principal objetivo do BC deve ser a estabilidade de preços.

A lei sabiamente deixa claro também que os demais objetivos, embora importantes, são secundários, para que não se ponha em risco a estabilidade tão apreciada pela população tentando o impossível.

Por fim, para que o BC possa perseguir seus objetivos sem as tentações dos ciclos políticos, a nova lei dá à diretoria do BC mandatos fixos e intercalados com o mandato do Executivo federal.

Parabéns ao Congresso!

*EX-DIRETOR DO BANCO CENTRAL E FUNDADOR DA GÁVEA INVESTIMENTOS

QUEREM RECRIAR O IMPOSTO CPMF

 

A ideia de nova CPMF. Desta vez, ‘provisória’

Retorno do tributo, extinto em 2007, deve ter a finalidade de cobrir as despesas de uma nova rodada do auxílio emergencial

Celso Ming, O Estado de S.Paulo

A proposta de criação de um “imposto temporário”, com as características da antiga CPMF (o imposto do cheque), para enfrentar as despesas de um novo auxílio emergencial, não passa de uma tentativa de aproveitar a emergência e a confusão da pandemia para “passar a boiada”. Certas áreas do Congresso e do governo parecem pretender decretar um estado excepcional “de guerra” ou um estado de calamidade pública, para justificar mais esse avanço sobre o bolso do contribuinte.

São várias as cercas que pretendem pular. O plano é travestir o tributo de contribuição social para escapar do princípio da anualidade. De acordo com esse princípio, um imposto não pode ser cobrado no mesmo exercício financeiro (art. 150 da Constituição). A exceção é para a contribuição social.

A outra cerca a ser invadida é a reiterada garantia do presidente Jair Bolsonaro e do ministro da Economia, Paulo Guedes, de que não haverá aumento da carga tributária. Se viesse, esse imposto seria compensado com a remoção de outros. O plano do ministro era  que esse tributo substituísse a desoneração da folha de pagamentos das empresas, de modo a ajudar na manutenção e na criação de empregos. Como sabe que se fosse temporário esse imposto mataria o projeto de substituição da desoneração, talvez, o Ministério da Economia acabe por vetá-lo.

A ideia de que essa contribuição seria “provisória” sempre foi um embuste. A CPMF tinha “provisória” até mesmo no sobrenome: Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira. Mas a provisória foi ficando, virou permanente. Só foi revogada dez anos depois da sua criação, em 2007, graças às pressões da sociedade.

Outra marotagem conhecida é a de que o novo tributo teria destinação exclusiva. No caso, a arrecadação dessa nova contribuição seria usada apenas e tão somente para cobrir as despesas da nova ajuda aos brasileiros afetados pela pandemia do novo coronavírus. A velha CPMF também começou com essa conversa. O então ministro  Adib Jatene defendia a CPMF como inevitável “para cobrir despesas com saúde”. Mas, logo se viu, o que foi arrecadado se destinou ao caixa comum. Virou um imposto como outro qualquer.

Governo estuda a volta da CPFM para bancar as despesas com uma nova rodada do auxílio emergencial. Foto: Wilton Junior/Estadão

Ou seja, mais uma vez, o governo ou os políticos pretendem se aproveitar da situação difícil da população mais pobre para criar mais um imposto fácil de arrecadar, que não exige declaração prévia, nem cálculos sofisticados, nem mesmo auditorias. É surrupiado automaticamente da conta bancária pelo sistema de informática do banco, a cada movimentação financeira.

E não se trata de um imposto indolor destituído de efeitos colaterais nocivos. Incide em cascata (tributo cumulativo), que onera cada etapa da produção. Por isso, é proibido pela Constituição.

Além disso, sobrecarrega as exportações, na medida em que o tributo não pode ser extraído do preço final do produto exportado, como se fosse um IPI ou um ICMS.

Essa proposta pode não passar de balão de ensaio. Nesse caso, serve para testar a capacidade de resistência da sociedade a essas esquisitices.

CONFIRA

>>>  Colapso

Não foi apenas um simples recuo. A queda das vendas no varejo em dezembro, mês do Natal, de 6,1%, na comparação mensal, reflete o colapso do poder aquisitivo de uma sociedade confinada pela covid-19, que enfrenta um desemprego de 14,1% e não pode mais contar com a mesma ajuda emergencial.

Como as incertezas eram então enormes, o consumidor adiou suas compras. O início da vacinação tende a mudar esse estado de espírito, mas ainda restam dúvidas se haverá vacina suficiente para todos.

INDEPENDÊNCIA DO BANCO CENTRAL

 

‘A independência formal reforça a independência no uso dos instrumentos’

Por uma feliz coincidência Roberto Campos – o neto – é o primeiro presidente da instituição sonhada pelo avô

Affonso Celso Pastore*, O Estado de S.Paulo

Foi somente em 1966, sob a iniciativa de Roberto Campos, que no Brasil foi criado um banco central. No texto da lei seus diretores teriam mandato fixo e não coincidente com o do Presidente da República. A ilusão durou pouco.

Quando Campos tentou convencer Costa e Silva de que a independência era importante porque o banco central era “o guardião da moeda”, ouviu dele: “o guardião da moeda sou eu”. Tinha início um longo período de “superinflação”, que jogou o país na armadilha do lento crescimento.

Roberto Campos Neto é o primeiro presidente da instituição sonhada pelo avô. Foto: Marcos Correa/PR

Plano Real deu um primeiro passo à frente conferindo à instituição a independência no uso dos instrumentos, e hoje o Congresso aprovou a Lei que dá independência formal aos seus diretores, que passam a ter mandato fixo e não coincidente com o do Presidente da República.

Por uma feliz coincidência Roberto Campos – o neto – é o primeiro presidente da instituição sonhada pelo avô. A Lei estabelece que sem prejuízo de seu objetivo fundamental – atingir a meta de inflação -, a instituição tenha também por objetivos: zelar pela estabilidade e eficiência do sistema financeiro; e suavizar as flutuações da atividade econômica e fomentar o pleno emprego.

A independência formal reforça a independência no uso dos instrumentos. Comemoremos este importante avanço!

*EX-PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL E SÓCIO DA A.C. PASTORE & ASSOCIADOS.

MINAS GERAIS FECHA COM A VALE DO RIO DOCE ACORDO INÉDITO

 

Dia histórico

A Vale fechou com Minas Gerais o maior acordo indenizatório de todos os tempos realizado no Brasil, provavelmente no planeta

O acordo com a Vale, fechado no dia 4 de fevereiro de 2021, muda a história de Minas Gerais.

Dia do maior acordo indenizatório de todos os tempos realizado no Brasil, provavelmente no planeta, em decorrência de danos socioambientais.

Ao longo dos últimos dois anos, defendi em todos os lugares em que me foi dada a palavra e a escrita, em reuniões oficiais com o governo de Estado, com o presidente da República, com órgãos do Judiciário e do Legislativo, federal e estadual, a imprescindibilidade de um acordo “real e substancial” de indenizações materiais e morais pelo desastre de Brumadinho. Não apenas pelos danos do terrível episódio, mas pelos decorrentes dos passivos ambientais rotineiros e pelos econômicos, gerados pelo exaurimento de reservas minerais, sem que a população do Estado participasse dessa festa.

Estou gratificado pela condução exemplar dos negociadores escalados pelo Estado e pelo Judiciário. O governador Romeu Zema, comandante da expedição, reconhece mérito “em especial ao secretário (de Planejamento) Otto Levy, que esteve à frente das negociações desse acordo”. Pois é, Otto Levy se ergueu no contexto mineiro como um herói, um benemérito da pátria, por ter alcançado o que parecia impossível e que, ainda, marcará as próximas gerações. Contrariou a calcificada submissão que cerca, de regra, esses acordos.

Pode parecer exagerado o valor de R$ 37,7 bilhões? Não, é até pouco. A conta do passivo desproposital que a Vale acumula em Minas e, ainda, o dever de deixar um legado que vá além de crateras e destruição, de devastação de rios e montanhas, sob o amparo da inércia culposa dos poderes constituídos, precisavam ter uma resposta volumosa e marcante. Era preciso dar um basta às malandragens que ocorriam nos porões políticos e governamentais.

Comboios infindáveis de minérios saindo, crateras se abrindo, barragens arranhando o céu, ameaças sobre vales inteiros e seus moradores, sem que uma resposta digna fosse dada em décadas de extração. Atividades submetidas ao império do lucro, que em nenhum outro quadrante do mundo é tão elevado.

O valor de R$ 37,7 bilhões, aparentemente incrível, que poderia arrasar centenas de empresas ao mesmo tempo, não gerará qualquer problema à companhia Vale, ex-Rio Doce. Aliás, a própria Vale e seus acionistas terão ganhos diretos e indiretos muito superiores a esse valor indenizado. No momento em que “a maior produtora de minério de ferro do planeta” recebe o bônus da maior valorização de seus produtos, concordou em renunciar, com o acordo, ao ganho líquido de caixa (Ebita) de apenas um dos próximos 16 trimestres, que representam o prazo de pagamento da indenização. A Vale recuperará, ainda, R$ 15 bilhões de Imposto de Renda.

O desembolso torna-se irrelevante, tanto é verdade que as ações (como previ nesta coluna em dezembro último) deram mais uma disparada de 4% na última sexta-feira. O acréscimo do valor de capitalização da Vale em apenas um dia corresponde quase ao acordo inteiro selado com o governo de Minas.

Resta agora entender o que poderá render o acerto para a população de Minas. Pode-se prever um progresso nunca visto nem imaginado. Isso sempre que o bom senso, a competência e a probidade forem adotados para manobrar essa enorme massa de finanças.

Distribuindo-se o valor em quatro anos, implicará, a cada exercício, um aumento de 5,5% do PIB em Minas, que em 2019 foi de RS 171 bilhões. No quarto ano, Minas poderá ter um ganho de produção interna acumulada e real de mais de 22%. Nisso não estão considerados os efeitos secundários, que podem dobrar os já significativos 5,5%. E mais: aumento de oportunidades, de emprego, de impostos, de circulação de finanças decorrentes dos investimentos no Estado. Temos todos os ingredientes para provocar um crescimento “chinês” em Minas, independentemente da sorte nacional.

Os recursos, conforme prevê o acordo assinado, estão direcionados e carimbados para áreas de grande impacto social, como saúde, saneamento, abastecimento, infraestrutura, apoio ao desenvolvimento e à produção, além de mais de R$ 9 bilhões para atender o assistencialismo da população.

Minas, neste momento, não pode jogar fora a “maior oportunidade de sua história”. Impõe-se a responsabilidade de empregar correta e proficuamente essa indenização. Caberá zelar para que a aplicação correta e sustentável evite farras e desperdícios que ocorreram no Brasil com Olimpíadas, Copa e investimentos da Petrobras. Isso não pode acontecer.

Como já escrevi nesta coluna, no horizonte se enxerga uma oportunidade ímpar, grandiosa, irrepetível, que pode devolver a Minas uma importância e um protagonismo que pareciam ter sido perdidos durante décadas de mediocridade.

O reflexo eleitoral do acordo deixa o governador Zema praticamente reeleito.

Primado dos números

Pouco conhecida é a vida das pessoas, não gananciosas, que atuam na missão de ajudar a evolução da humanidade

O indivíduo ganancioso procura aumentar a quantidade da sua fortuna e perde muitas vezes a oportunidade de conquistar a felicidade. O bilionário rei do petróleo, na década de 70, Jean Paul Getty, referindo-se ao dinheiro, disse: “Quando não se tem, pensa-se sempre nele. Quando se tem, pensa-se somente nele”. A quantidade, dessa forma, pode ser também um grave problema.

Pouco conhecida é a vida das pessoas, não gananciosas, que atuam na missão de ajudar a evolução da humanidade e “se ocultam atrás de sua obra”. Mas não pensem que a falta de homenagens e badalações deixe o “místico” contrariado: é no silêncio que ele mais aproveita a felicidade de suas realizações.

Quem é substancialmente materialista, o tipo mais comum entre os homens, precisa de ruídos; o místico, mesmo sem subir a montanha, é silenciosamente solitário, dinamicamente solidário, não procura notoriedade, tem a missão de aliviar sofrimentos onde lhe é possível, com inabalável compaixão.

Já sabiam os antigos gregos que uma cadeia de insaciabilidade perturba o homem comum, sempre com renovados “desejos”, enquanto a águia dilacera de Prometeu o fígado, que não para de se regenerar.

O mais incrível conflito é exatamente aquele que o homem traz dentro de si mesmo, entre o ego mental-materialista da sua personalidade e o eu espiritual da sua divina individualidade. Se o primeiro supera em importância o segundo, como é mais comum durante a vida terrestre, a existência humana passa a ser triste, impedindo ao indivíduo se encontrar com sua “divina eternidade”.

Quem chegou a vislumbrar uma realidade superior, explica o sábio, está serenamente ao reparo de ataques. Ninguém pode prejudicá-lo, ninguém pode ofendê-lo, ninguém pode empobrecê-lo, ninguém pode obrigá-lo a perder o que ele é interiormente, mesmo tirando-lhe todas as posses.

Parece vã filosofia falar de paz para quem não teve oportunidade de experimentá-la. Fez notar o filósofo Ralph W. Emerson a quem falava de paz sem saber o que é: “Não posso ouvir o que dizes, porque aquilo que tu és troveja muito alto”.

Quem não traz consigo a serenidade da paz interior não será um pacificador, apenas um semeador de desastres. Um perturbado que procura ficar alienado da realidade.

Homens e mulheres que não suportam a solidão evitam estar a sós consigo, temem a si mesmos. Costumam com frequência se perder na irrealidade de entorpecentes e substâncias tóxicas para iludir a infelicidade.

Os milionários da felicidade são, quase sempre, grandes anônimos, os “não existentes” da história. Acabam invisíveis. Como disse Descartes: “Vive bem quem bem se esconde”. São os irmãos sem nome dos círculos mais evoluídos, que se eclipsam no anonimato da benevolência universal; indiferentes aos louvores como aos vitupérios, porque eles vivem na invisível e silenciosa verticalidade do bem, incompreendidos pelos habitantes da ruidosa e palpável horizontalidade do mal.

O homem justo, ainda, precisa prestar atenção, pois sua presença “diz silenciosamente”: “Você deveria ser como eu sou, mas não é, e isso é culpa sua”. Vale dizer que a simples presença do justo é quase uma provocação para o injusto, o desnorteado.

Dessa forma, quem não alcançou a honestidade moral rejeita a própria inferioridade. A presença de um sábio o irrita. Pode levar a escolher um Barrabás e rejeitar um redentor.

É, assim, de incalculável mérito ajudar os indivíduos orgulhosos e não autênticos (que são os mais necessitados), usando, entretanto, a sábia prudência, já que “o homem – como define M. Yourcenar – é um empreendimento que tem contra si o tempo, a necessidade, a sorte e o imbecil e sempre crescente primado dos números”. A vida terrestre lhe é concedida exatamente para superar essas limitações.

O sucesso que dura

Qualquer esforço na esfera material, por mais intenso que seja para alcançar a meta, deve-se dirigir ao crescimento do indivíduo, de suas potencialidades e da ampliação de sua consciência

“Dando-se apenas o pão, pode-se ajudar somente o indivíduo. O resultado será que, depois de algum tempo, muitos estarão novamente sem pão”. A frase é lida num artigo assinado, em 1905, pelo vulcânico e genial Rudolf Steiner. Depois de 115 anos, continua atual como nunca.

Trata-se de um fragmento da longa análise das relações do capital e do trabalho, da mediação do Estado, das políticas públicas, que procuram identificar no esforço humano as razões da alternância de sucessos e de fracassos.

Steiner realiza uma análise moral e “cármica”, subindo em camadas muito superiores àquelas usualmente limitadas a ganhos e perdas financeiras, para finalizar que o sucesso depende da solidariedade e da harmonia despertadas nas relações humanas. Motivação, coesão, união, equilíbrio, determinação, coerência etc. são os ingredientes a serem usados.

Qualquer esforço na esfera material, por mais intenso que seja para alcançar a meta, deve-se dirigir ao crescimento do indivíduo, de suas potencialidades e da ampliação de sua consciência. É justo e necessário procurar melhores condições materiais, são fundamentais à superação da fome e das restrições de toda ordem prática. Terão, todavia, um valor universal, eternizado e sustentável só se estimularem e enriquecerem indivíduos.

Um homem rico de recursos e de poder, mas moralmente fraco e indigente, pouco serve à humanidade, e seu legado não passará de cinzas espalhadas pela ventania. Será castigado pela sua estreiteza e egoísmo, tropeçará ainda em vida culpando o destino, sem enxergar a sua insignificância e, portanto, a inutilidade dele para aqueles que o cercam. A justiça superior não o deixará triunfar, pois seus propósitos mesquinhos não interessam nem acima quanto menos abaixo dele.

Não há riqueza e progresso marcados pela exploração de seres desfavorecidos, em especial por um governante. Seus feitos não deixarão resultados positivos. Pior quando impunemente se aproveita da ignorância e da miséria. O sucesso se torna imperecível num conjunto que tende ao progresso difuso, sem prejuízos para quem quer que seja, quando o amor à humanidade prevalece sobre cálculos mesquinhos. Mais do que a luta contra o mal, é a imposição do bem pelo seu efeito abarcante. E não poderia ser diferente, já que o mal é apenas ausência do bem; quando o bem impera, não há espaço para o outro se impor, nem sequer parcialmente.

A riqueza pela exploração e pela dor é frágil como castelo de areia, e o esforço, por mais hercúleo que seja, para preservá-la desmoronará.

Para Steiner, já em 1905, era um erro acreditar no Estado filantropo ou imaginar que ele resolveria estruturar a humanidade, deixando seres emancipados e donos de seu destino. Afirmava que “grupos políticos se equivocam… baseando-se num conhecimento insuficiente da vida humana”, em especial quando prometem aos ignorantes o pão sem agregar componentes de educação e de crescimento moral.

As ideias e conceitos divulgados por Rudolf Steiner apresentam o “espírito de integralidade”, o mesmo que leva homens e empresas “amadas” à procura da “função social” como motivação de seus esforços, como principal razão de ser, crescer e se fortalecer exatamente por serem imprescindíveis ao progresso da humanidade.

AS ARMADILHAS DA INTERNET E OS FOTÓGRAFOS NÃO NOS DEIXAM TRABALHAR

  Brasil e Mundo ...