Trump insulta prefeito de Londres no início de sua visita ao Reino Unido
Rafa de Miguel
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ISABEL INFANTES (AFP) Donald Trump e a primeira-dama, Melania Trump, descem do
Air Force One na chegada ao aeroporto de Stansted, em Londres, nesta
segunda-feira
Se o tamanho de uma figura pública se
mede pela importância de seus inimigos, o prefeito de Londres, o trabalhista e
muçulmano Sadiq Khan, encontrou um filão em Donald Trump.
O presidente dos Estados Unidos, que inicia uma visita de Estado de três dias
ao Reino Unido
nesta segunda-feira, usou o Twitter minutos antes de aterrissar no aeroporto de
Stansted para lançar uma de suas diatribes usuais contra o político londrino.
“Sadiq Khan, que tem sido terrível
como prefeito de Londres,
criticou estúpida e desagradavelmente a visita do presidente dos Estados
Unidos, de longe o mais importante aliado do Reino Unido.
É um perdedor irrecuperável que deveria se concentrar no combate à onda de
criminalidade em Londres”, escreveu Trump em alguns tuítes incendiários que
terminou destacando seu entusiasmo com a visita: “Acabamos de aterrissar!”,
finalizou o texto.
Khan, que arrasta sua particular
batalha contra Trump há vários anos, tinha dado as boas-vindas ao dignitário
norte-americano com um artigo no jornal The Observer no qual comparou sua
linguagem com a dos “fascistas do século XX”, e não poupou esforços para
denunciar à imprensa o racismo e a misoginia do político, “que o Reino Unido
não deveria receber com tapete vermelho”, disse.
A chegada de um presidente norte-americano, mesmo o
mais popular deles, sempre garante uma dose mínima de controvérsia. Mas o caso
de Trump ultrapassa as expectativas, graças em parte à sua tendência de
interferir nos assuntos internos com gatilho fácil e verbo pouco diplomático.
Nas horas anteriores à sua chegada,
apoiou publicamente o eurocético Boris Johnson na corrida para suceder Theresa May na
liderança do Partido Conservador; sugeriu ao governo britânico que envie seu
amigo, o ultranacionalista Nigel Farage, a Bruxelas, para negociar – impor, na
verdade – à UE as condições de um Brexit duro; chamou Meghan Markle,
a duquesa de Sussex, de “desagradável” em uma entrevista ao The Times,
embora mais tarde tenha dito que não havia usado essa palavra (nasty, na
língua original); e finalmente afirmou que foram vários os candidatos à
sucessão de May que o procuraram para pedir seu apoio, mas não quis dar nomes.
Espera-se que centenas de milhares de
pessoas encham as ruas de Londres na terça-feira para protestar contra a visita
de Trump, e se verá sobrevoar novamente a capital o balão gigante do Baby Trump, uma caricatura do político norte-americano com
corpo de bebê e de fraldas. Cerca de 10.000 policiais serão mobilizados em
torno da avenida Whitehall e do número 10 de Downing Street, a residência
oficial e local de trabalho da primeira-ministra, para evitar que os manifestantes
estraguem a festa de Trump.
O líder da oposição trabalhista, Jeremy Corbyn,
e o dos liberais democratas, Vince Cable, recusaram o convite para o jantar de
Estado que a rainha Elizabeth II oferecerá nesta segunda-feira à noite a
Trump no Palácio de Buckingham.
Os principais meios de comunicação
britânicos insistem em seus editoriais que se faça distinção entre a pessoa e a
instituição. Não lhes resta outro remédio a não ser admitir, implicitamente,
que Trump não é exatamente um “líder do mundo livre” afável e carismático, mas
apontam para a necessidade de preservar a todo o custo a “relação especial” que
o Reino Unido e os Estados Unidos mantêm desde o fim da Segunda Guerra
Mundial. Em um momento em que a credibilidade e a reputação dos
britânicos estão em frangalhos graças ao desastre Brexit, o establishment
do país se esforça para preservar a dignidade das instituições diante da
insolência e dos boicotes esperados durante a visita.
Trump não ajudou. Tanto ele quanto sua equipe
presidencial não disfarçaram as simpatias pela ala mais dura dos conservadores,
e pregaram de longe a ruptura com a UE. Promessas de um tratado comercial
vantajoso foram lançadas constantemente como isca para que o Governo britânico
pisasse no acelerador e decidisse seguir adiante com o Brexit.
A visita terminará com uma cerimônia
oficial na cidade costeira de Portsmouth para comemorar o 75º aniversário do Dia D,
o desembarque das forças aliadas na França. A importância desse momento
histórico, lembram políticos e historiadores, deveria bastar para que
transcorressem com mais tranquilidade os três dias da visita do líder
norte-americano, embora Trump não seja Eisenhower nem May seja Churchill.