Radiotelescópio feito no
Brasil ajudará cientistas a conhecer "energia escura"
Agência Brasil
O radiotelescópio montado na cavidade abandonada de uma mina de ouro
Equipamento construído no Brasil vai auxiliar cientistas no conhecimento
da chamada “energia escura”, que representa cerca de 70% da composição do
universo. O radiotelescópio vai medir as oscilações na distribuição de matéria
no universo, conhecidas como Oscilações Acústicas de Bárions (em inglês, BAO).
O projeto é desenvolvido por um consórcio internacional formado por
pesquisadores do Brasil, Reino Unido, da Suíça e do Uruguai. O Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) lidera o projeto, com a responsabilidade
da construção, do desenvolvimento, da calibração, dos testes e análise de
dados, bem como do comitê gestor do projeto. A coordenação-geral, do lado
brasileiro, está sob a responsabilidade do Instituto de Física da Universidade
de São Paulo (USP).
Segundo o pesquisador do Inpe Carlos Alexandre Wuensche, responsável
pela construção da instrumentação do projeto, o objetivo é medir as oscilações
acústicas de baríons quando o universo era muito jovem. O equipamento permite a
investigação da energia escura, tema de estudo da física, e ainda considerado
um mistério para os cientistas.
Tecnologia
O radiotelescópio Bingo (da sigla em inglês para Oscilações Acústicas de
Bárions em Observações de Gás Neutro) fará a medição da distribuição de
hidrogênio neutro a distâncias cosmológicas, utilizando uma técnica chamada
Mapeamento de Intensidade. Ele foi concebido por cientistas do Reino Unido, da
Suíça, do Uruguai, da China e do Brasil para fazer a primeira detecção de BAO
nas frequências de rádio.
Operando na faixa de frequência que vai de 0,96 GHz a 1,26 GHz, o
equipamento contará com dois espelhos de 40 metros que iluminarão cerca de 50
cornetas de 4,7 metros de comprimento e 1,90 metro de abertura. O custo total
estimado é de US$ 4,9 milhões.
Do lado brasileiro, o projeto tem financiamento de R$ 12 milhões pela
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Os recursos são
investidos no desenvolvimento dos componentes para módulos receptores e a
construção e montagem de antena. A equipe brasileira é composta de 25 pessoas,
entre pesquisadores, técnicos, engenheiros e estudantes.
De acordo com o pesquisador, o projeto é um desafio para o país. “A
indústria brasileira nunca construiu nada desse tamanho e com essa precisão”,
afirma.
O radiotelescópio tem previsão de ser instalado em 2018, no Noroeste do
Uruguai. A posição para instalação do equipamento considera aspectos como área
despovoada, sem a contaminação de ondas de rádio e instalações de torres de
celular para evitar, assim, qualquer tipo de interferência. As primeiras
análises, em caráter preliminar, devem ser divulgadas um ano após a instalação
do equipamento.
As Oscilações Acústicas de Bárions são utilizadas em astrofísica para
entender os processos de formação de aglomerados de galáxias, medir a expansão
do universo e a quantidade de matéria escura. A escala de BAO é uma das sondas
mais poderosas para investigar parâmetros cosmológicos, incluindo a energia
escura.
O QUE É ENERGIA
ESCURA?
Tipo misterioso de energia pode corresponder a nada menos que 73% de tudo o que existe no Universo.
Reinaldo José Lopes
A maior parte dos modelos que tentam
explicar a origem e a evolução do universo hoje parecem concordar que a energia
escura é o principal componente da somatória da matéria e energia do cosmo, os
tais 73% da conta universal que faltavam. Daí a saber exatamente o que é essa
força, no entanto, vai uma grande distância.
A existência dessa energia misteriosa
ganhou status mais ou menos seguro em 1999, quando observações de galáxias
confirmaram que o universo não apenas está se expandindo, como aparentemente o
faz desde o Big Bang, mas também está acelerando sua expansão – “em um ritmo
praticamente constante”, diz o físico Paul Steinhardt, da Universidade de
Princeton, nos Estados Unidos.
“Ela pode ser considerada tanto como um
novo aspecto da gravitação, uma gravidade repulsiva, quanto um novo tipo de
matéria-energia. Ainda é cedo para uma decisão”, afirma Laerte Sodré Júnior. “O
efeito dela não é uma nova força. É apenas gravidade”, diz Steinhardt. De
qualquer maneira, alguma característica especial da energia escura faz com que
ela vire o papel típico da gravidade (fazer com que as coisas atraiam umas às
outras) de ponta-cabeça, de forma que ela se manifeste inesperadamente como
repulsão – o que propele a expansão do universo, lançando as grandes
estruturas, como galáxias e aglomerados de galáxias, umas para longe das
outras.
A possibilidade de que a gravidade se
comportasse desse jeito maluco já tinha sido prevista em trabalhos de Albert
Einstein de 1917. Como o célebre físico alemão acreditava que o universo tinha
de ser finito e estático, ele criou a chamada constante cosmológica, uma força
que contrabalançava a gravidade e impedia que planetas, estrelas e galáxias
grudassem uns nos outros.
Hoje, no entanto, muitos pesquisadores
acreditam que a energia escura não deve ter agido durante toda a história do
nosso cosmo, já que ela teria impedido a formação de estruturas aglomeradas e
complexas no passado remoto.
Falta, é claro, provar essa teoria. Se
for descoberto que a ação da energia escura muda ao longo do tempo, pode ser
que ela não conduza o universo a uma expansão sem fim.