Filosofia do medo
Simone Demolinari
O medo de tomar decisões deriva da insegurança. Quanto mais inseguro,
mais medrosa é uma pessoa. Medo de errar, medo de perder, medo de fracassar,
medo do desconhecido. Vários medos envolvem a tomada de decisão.
Biologicamente, sentimos medo como reação natural de preservação da
vida. Este medo que nos protege é considerado um “medo bom”, visto que a
ausência dele nos deixa expostos à condição de risco. Entretanto, quando ele
ocorre de forma exagerada ou irracional, pode nos paralisar, acovardar e roubar
nossa liberdade de escolha.
Escolher é, por vezes, um processo desconfortante, uma vez que a decisão
implica numa renúncia. E nessa hora estamos sós. Amigos, cônjuge e família
podem dar suas opiniões, às vezes contribuindo, outras vezes atrapalhando.
Por medo que lhes são próprios, algumas pessoas acabam desencorajando as
outras, através de crítica, pessimismo, previsões futurísticas que mais
amedrontam que motivam. E não é por culpa delas. De uma maneira geral, as
pessoas são treinadas mais para sentirem medo do que para sentirem coragem.
Certa vez, soube de uma moça que tinha um alto posto de trabalho num
jornal americano. Um emprego dos sonhos de muita gente. Bom salário, uma
aparente estabilidade, ótimos benefícios e o respeito conquistado pelos anos de
dedicação. Contudo, mesmo com esse contexto favorável, ela não se sentia mais
feliz e decidiu que não queria mais viver longe do seu país. Depois de quase 15
anos morando nos EUA, queria voltar para o Brasil. Ela já estava certa de que
pediria demissão, porém sua maior dificuldade era convencer sua família e
amigos da sua decisão. Para eles, o fato de ela não estar mais feliz não era o
bastante. Recebeu duras críticas da família que repetia diuturnamente: “emprego
bom igual a esse você nunca mais vai achar”.
Algo semelhante acontece no campo sentimental, quando se relaciona com
alguém considerado como uma “pessoa boa”. Este foi o caso de Inês, uma moça que
namorava um rapaz trabalhador, bem empregado, bonito, educado, bom caráter e
apaixonado por ela. Contudo faltava “apenas” amá-lo, o que ela tentou anos a
fio e não conseguiu. Todas as vezes que ensaiava um término, ela ouvia:
“namorado bom igual a este você nunca vai achar”. O medo de terminar o namoro
fez com que ela insistisse por seis anos numa relação que ela não sentia
firmeza.
A filosofia do medo – “igual a este você nunca vai achar” – pode até ser
bem intencionada, mas não deixa de ser perversa, uma vez que vem embalada de
preocupação e desmerece o estado emocional do outro.
Ficar prisioneiro do medo é uma forma limitada de levar a vida. Ao nos
depararmos com uma situação de insegurança é bom refletirmos à luz da sabedoria
do escritor americano Mark Twain: “coragem não é a ausência do medo, e sim o
enfrentamento dele”.