Paulo Haddad
Uma recessão muito severa que se
aprofunda e se estende por muitos anos pode se transformar numa Grande
Depressão. A última Grande Depressão registrada foi a crise econômica das
economias capitalistas ocidentais que se estendeu de 1929 a 1939. Destaca-se
também a Longa Depressão de 1873 a 1879. Já se tem denominado a crise econômica
e financeira que se iniciou em 2008, como a Grande Recessão.
Os últimos resultados do desempenho da
economia brasileira em recessão desde 2014, assim como as perspectivas
desfavoráveis para 2016 e 2017, levam a perguntar: há risco desta recessão se
transformar numa Grande Depressão? Os indicadores econômicos e sociais que
caracterizam uma Grande Depressão são assustadoramente dramáticos. As taxas de
desemprego podem oscilar em torno de 15 por cento da força de trabalho
disponível, chegando a superar os 25 por cento para a população mais jovem e
com menor nível educacional. O comportamento dos agentes econômicos mais
dinâmicos passa a ser dominado pelo desânimo, pelo desalento e pela
desesperança, o que impacta negativamente as propensões a consumir e a investir
em novos projetos.
Alguém poderia dizer que são poucas as
chances da atual recessão brasileira desembocar numa Grande Depressão. Afinal,
há setores da nossa economia responsáveis por poderosas cadeias produtivas que
têm condições de manter sua competitividade até mesmo numa conjuntura
macroeconômica carregada de inconsistências, de desconfianças e de
imprevisibilidades. Entre esses setores destaca-se a exuberância do agronegócio
em regiões de nossa fronteira econômica dinâmica. Além do mais, a atual taxa de
câmbio, ao se desvalorizar e tornar-se globalmente competitiva, está
estimulando a economia de diversos setores e diferentes regiões a ampliar e a
diversificar as exportações com seus efeitos multiplicadores. Da mesma forma, o
câmbio desvalorizado ativa a substituição de importações de bens e serviços,
como no caso do turismo.
Entretanto, há muitas dúvidas no
horizonte do próximo biênio. O modelo político de presidencialismo de coalizão
se esgotou e perdeu sua capacidade de gestão dos conflitos de interesses entre
os grupos sociais, os interesses corporativos e as demandas regionais. Na
verdade, a atual distribuição de 39 Ministérios entre 10 partidos representa
nada mais que a formação de territórios administrativos onde se pratica um
fisiologismo político, um balcão de negócios e um financiamento espúrio de campanhas
eleitorais.
Do lado econômico, há dificuldades
para se superarem os desarranjos e os desastres induzidos pela nova matriz
econômica do primeiro mandato de Dilma Rousseff, que desafiou e confrontou as
lógicas da economia mista de mercado e os imperativos de um capitalismo moderno
e inclusivo. Os instrumentos econômicos tradicionais da política fiscal e da
política monetária vêm perdendo eficácia como mecanismos de controle da
inflação e de formação de um novo ciclo de expansão.
Essa combinação da simultânea falência
de um modelo econômico, eivado de contradições em sua concepção e
implementação, e de um modelo político, carcomido pela corrupção
administrativa, faz com que a trajetória de uma Grande Depressão possa estar a
caminho com maior probabilidade. Enquanto isto, vão sendo desestruturadas as
conquistas sociais e econômicas dos brasileiros obtidas nas duas últimas
décadas: as políticas sociais perdem sua força compensatória, a nova classe
média perde sua dimensão e as desigualdades sociais vão se aguçando.



