Paulo Haddad
Com o início efetivo do processo
eleitoral para a escolha do futuro Presidente dos EE.UU., um dos temas
dominantes que influenciará os votos dos eleitores será o das crescentes
desigualdades sociais naquele país. A história das democracias ocidentais
mostra que o desemprego, a pobreza e a marginalização social são fatores que
mobilizam profundamente o processo de escolha de eleitores politicamente
conscientes. E, atualmente nos EE.UU, observa-se um conjunto de indicadores que
sinalizam a presença de um tripé de desigualdades sociais: desigualdades de
renda, desigualdades de riqueza e desigualdades de oportunidades. Há vários
estudos e pesquisas que comprovam o aprofundamento dessas desigualdades ao
longo das últimas décadas.
É surpreendente constatar os elevados
índices de pobreza nos EE.UU segundo os próprios critérios oficiais.
Considera-se que uma família americana de quatro pessoas é pobre quando sua
renda anual é inferior a 24 mil dólares. Assim, cerca de um terço dos
norte-americanos experimentam pobreza ocasional e vinte por cento experimentam
o drama da pobreza o tempo todo. As estatísticas indicam que os índices de
pobreza diferem por raça, idade e nível de educação, além de fatores
econômicos, sociais e demográficos. Os índices são maiores para as minorias
afro-americanas.
As desigualdades de renda e de riqueza
se atenuaram no período de 1914 a 1973 melhorando as condições de vida dos trabalhadores,
segundo a análise recente de Thomas Piketty. Esse período inclui a Crise de
1929 e as duas Grandes Guerras Mundiais, tornando-o peculiar e com poucas
chances de se repetir. Para Piketty, desde 1973 a concentração da renda e da
riqueza vem aumentando amplamente. Em 2007, seis membros de uma única família
de super-ricos no grupo de um por cento da população era possuidora de uma
riqueza patrimonial equivalente ao valor acumulado por 100 milhões de
norte-americanos situados nos segmentos mais baixos da distribuição.
Finalmente, as desigualdades de
oportunidades atuais influenciam os padrões do tripé das desigualdades no
futuro. Embora em princípio todos deveriam ter um ponto de partida em condições
iguais para realizar seus projetos de vida independentes, oportunidades
desiguais e mobilidade social limitada fazem com que os beneficiários das
desigualdades de resultados hoje (os mais ricos, os mais poderosos) possam
transmitir uma vantagem injusta para os seus descendentes amanhã. Assim, vão se
reproduzindo os padrões de desigualdades nas sociedades.
Nos EE.UU., as políticas
redistributivas de renda e de riqueza vieram a acontecer tardiamente após a
Crise de 1929 e, mesmo assim, de forma intermitente e errática de acordo com a
agenda ideológica de um dos dois partidos majoritários no poder. Por exemplo: a
indefinição sobre as formas de financiamento público da educação levou a que as
dívidas dos empréstimos privados para estudantes mais necessitados cheguem
atualmente a mais de 1 trilhão de dólares, o que equivale a um valor superior à
metade do PIB brasileiro de 2015.
Não será surpresa, pois, se houver uma
inclinação dos eleitores norte-americanos, principalmente os mais jovens e os
mais desalentados, para o candidato a presidente que sinalizar um programa de
governo com grandes transformações econômicas e sociais. Como dizia Adam Smith
em 1776, nenhuma sociedade poderá certamente florescer e ser feliz, se grande
parte de seus membros for constituída de pobres e miseráveis.




