terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

DESIGUALDADE SOCIAL DE LÁ É MUITO DIFERENTE DAQUI DO BRASIL




Paulo Haddad





Com o início efetivo do processo eleitoral para a escolha do futuro Presidente dos EE.UU., um dos temas dominantes que influenciará os votos dos eleitores será o das crescentes desigualdades sociais naquele país. A história das democracias ocidentais mostra que o desemprego, a pobreza e a marginalização social são fatores que mobilizam profundamente o processo de escolha de eleitores politicamente conscientes. E, atualmente nos EE.UU, observa-se um conjunto de indicadores que sinalizam a presença de um tripé de desigualdades sociais: desigualdades de renda, desigualdades de riqueza e desigualdades de oportunidades. Há vários estudos e pesquisas que comprovam o aprofundamento dessas desigualdades ao longo das últimas décadas.
É surpreendente constatar os elevados índices de pobreza nos EE.UU segundo os próprios critérios oficiais. Considera-se que uma família americana de quatro pessoas é pobre quando sua renda anual é inferior a 24 mil dólares. Assim, cerca de um terço dos norte-americanos experimentam pobreza ocasional e vinte por cento experimentam o drama da pobreza o tempo todo. As estatísticas indicam que os índices de pobreza diferem por raça, idade e nível de educação, além de fatores econômicos, sociais e demográficos. Os índices são maiores para as minorias afro-americanas.
As desigualdades de renda e de riqueza se atenuaram no período de 1914 a 1973 melhorando as condições de vida dos trabalhadores, segundo a análise recente de Thomas Piketty. Esse período inclui a Crise de 1929 e as duas Grandes Guerras Mundiais, tornando-o peculiar e com poucas chances de se repetir. Para Piketty, desde 1973 a concentração da renda e da riqueza vem aumentando amplamente. Em 2007, seis membros de uma única família de super-ricos no grupo de um por cento da população era possuidora de uma riqueza patrimonial equivalente ao valor acumulado por 100 milhões de norte-americanos situados nos segmentos mais baixos da distribuição.
Finalmente, as desigualdades de oportunidades atuais influenciam os padrões do tripé das desigualdades no futuro. Embora em princípio todos deveriam ter um ponto de partida em condições iguais para realizar seus projetos de vida independentes, oportunidades desiguais e mobilidade social limitada fazem com que os beneficiários das desigualdades de resultados hoje (os mais ricos, os mais poderosos) possam transmitir uma vantagem injusta para os seus descendentes amanhã. Assim, vão se reproduzindo os padrões de desigualdades nas sociedades.
Nos EE.UU., as políticas redistributivas de renda e de riqueza vieram a acontecer tardiamente após a Crise de 1929 e, mesmo assim, de forma intermitente e errática de acordo com a agenda ideológica de um dos dois partidos majoritários no poder. Por exemplo: a indefinição sobre as formas de financiamento público da educação levou a que as dívidas dos empréstimos privados para estudantes mais necessitados cheguem atualmente a mais de 1 trilhão de dólares, o que equivale a um valor superior à metade do PIB brasileiro de 2015.
Não será surpresa, pois, se houver uma inclinação dos eleitores norte-americanos, principalmente os mais jovens e os mais desalentados, para o candidato a presidente que sinalizar um programa de governo com grandes transformações econômicas e sociais. Como dizia Adam Smith em 1776, nenhuma sociedade poderá certamente florescer e ser feliz, se grande parte de seus membros for constituída de pobres e miseráveis.

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