Briga, agora, será pela distribuição de forças entre aliados e rivais de Bolsonaro dentro da CPI
Rafael Moreira*, O Estado de S.Paulo
Na política brasileira, o timing de cada novo fato político define qual será a consequência daquele determinado acontecimento. Nesse sentido, a criação da CPI da Covid chega no pior momento possível para o governo federal, no qual os índices de popularidade do presidente Bolsonaro estão em queda, o isolamento político do País já se tornou um fato consumado (com desdobramentos inclusive sanitários), e o dilema economia versus saúde no combate à pandemia já se mostrou falso, pois a recuperação econômica só virá após a vacinação em massa. Se o Brasil estivesse em um governo dentro da normalidade democrática, as consequências seriam mais previsíveis, e a instauração de um processo de impeachment seria algo esperado dentro do horizonte de possibilidades, considerando as inúmeras evidências de que o governo federal atuou para a disseminação do vírus, e não para o seu combate.
Entretanto, o revezamento entre reuniões presenciais e virtuais por parte da CPI irá dificultar a capacidade de articulação política dos parlamentares que a integram. Ademais, o medo da pandemia impede que haja um movimento de massa nas ruas, seja exigindo um avanço no processo de vacinação, seja pressionando os parlamentares para que os crimes de responsabilidade por parte do Presidente da República e dos integrantes do seu governo durante a pandemia sejam apurados.
É fato que alguns analistas têm repetido que “trata-se do começo do fim do governo Bolsonaro”, mas é preciso cautela nessa leitura, que reaparece de tempos em tempos, desde a saída de Sérgio Moro do governo federal. O bolsonarismo tem uma alta capacidade de reorganização interna e de criação de novas narrativas para combater qualquer ameaça que abreviem o atual mandato. O potencial de estrago, porém, está dado. A briga, agora, será pela distribuição de forças entre aliados e rivais de Bolsonaro dentro da CPI.
*DOUTOR EM CIÊNCIA POLÍTICA PELA USP
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