Perdido na fama
Victório Medioli
Quando Jair Bolsonaro nomeou o então
juiz federal Sergio Moro como ministro da Justiça, cometeu, no mínimo, uma
ingenuidade, ou, mais provavelmente, desencadeou uma sequência de erros
O tempo é inexorável em escancarar o resultado das
escolhas. Ótimo ou desastrado que seja.
Ocorrem uniões por uma atração fulgurante e fatal,
como a do noivo a não imaginar que a noiva se transformará na sogra. O freguês
na hora de comprar os sapatos pontudos que não o levarão longe, ou um
carro rebaixado que quebrará no primeiro buraco, ou uma camisa irreal que terá
sucesso apenas em ficar no armário.
Ainda tem quem saia ao sol resplandecente sem
considerar a queimadura, ou quem gosta do cartão-postal com neve e morre
congelado no meio dela.
Escolhas são influenciadas pelo momento, astros,
empolgação, moda, testosterona, considerações ilógicas e mutantes como os
ventos, não suficientemente ponderadas no tempo e no espaço que ocuparão.
Quando Jair Bolsonaro nomeou o então juiz federal
Sergio Moro como ministro da Justiça, cometeu, no mínimo, uma ingenuidade, ou,
mais provavelmente, desencadeou uma sequência de erros. Desconsiderou o
presente e o futuro, a experiência pregressa, a capacidade de colher
resultados, o conhecimento em relação ao mundo político, entre outras carências
inatas de Sergio Moro. Pensou em dar lustro a seu governo explorando a
fama internacional do juiz.
De imediato, desguarneceu a operação Lava Jato, com
a retirada de sua peça fulcral, o juiz, raro e irrepetível, que aparece a cada
50 anos. Tolheu-o daquilo que sabia fazer como nenhum outro. Marcou uma perda
colossal de força para vencer e enterrar o mecanismo de espoliação do erário, a
safadeza política e negocial que no Brasil se ergue como o pior inimigo do
desenvolvimento, do emprego, da saúde, da educação, dos jovens, do futuro
nacional. Concedeu indiretamente uma trégua à maior corrupção já vista
debaixo do sol.
Tirou Moro da cátedra, inalcançável pelos mortais,
e o colocou na arena de Brasília, corpo a corpo, com as feras da velha política
e de um mundo que não o tolera.
Moro aceitou, entrou na selva sem um animal
farejador, como um principiante numa luta marcial.
A perda da toga determinou a perda da blindagem de
magistrado e o fez vestir o véu de ministro, cargo político exposto e sem
intimidade.
Se o juiz necessita de conhecimento e equilíbrio
para julgar, sem correr o risco de perda de mandato, o ministro precisa de
habilidade em situações inusitadas, de capacidade de convencimento, diálogo
para alcançar o melhor possível para a nação; precisa se exercitar em engolir
sapos e evitar mordidas de cobras.
Ministro está dentro de um time e com ele tem que
bater bola ou sair agradecendo a oportunidade da rara e enaltecedora
experiência de servir à nação.
Moro não teve em sua vida como entender de perto o
Congresso Nacional, o cipoal de Brasília, o meio político e seu âmago, de
sentir o bafo da onça e suas práticas boas e ruins.
Moro não viu a sua importância à frente do
julgamento da Lava Jato que enterraria ainda os remanescentes do Congresso. O
Brasil perdeu a recuperação de mais recursos. Como ministro, não conseguiu o
controle do Coaf e não emplacou as operações de relevância que sacudiam a cada
semana os noticiários e empolgavam a população cansada de ser espoliada.
Não se lembra de um juiz mais dedicado e obstinado
na defesa do patrimônio público. Ele será lembrado por isso.
Bolsonaro tirou uma peça imprescindível da Justiça
para colocá-la numa arena comandada pelos investigados e condenados. Ele o deu
às feras, com o próprio consentimento de Moro.
Mas o pior de tudo com Moro se deu na
sexta-feira ao sair do governo. Polemizou e apresentou revelações de foro
íntimo, mensagens de celular de figuras que tentavam apagar o
incêndio. Seu gesto destruiu parte de sua fama, justamente num momento em
que a união, a tolerância e a permanência no cargo mostrariam o interesse maior
pela nação combalida.
O
momento e o modo de sair foram infelizes. Se pensou no Brasil, ele o fez
de forma triste e pessoal, jogando combustível num país em chamas pelas mortes
e pela crise assoladora.
Observação: Não creio que o ex-juiz Sérgio Moro piorou a
situação do país e do Bolsonaro, quando pediu a sua demissão, apenas, expôs a
situação que uma pessoa honesta igual a ele está sujeita quando assume um posto
de Ministro de um governo que não lhe deu sustentação e apoio.
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