À frente de ministério, Moro deu mais ênfase à segurança pública
Vinícius Valfré
BRASÍLIA – Em seu primeiro ano após abandonar a
toga, o ex-juiz federal Sérgio Moro foi muito mais ministro da Segurança Pública
do que da Justiça. Entre os programas e ações que deram mais visibilidade para
o trabalho do ministro em 2019, estão medidas como a transferência de líderes de facções, o envio de homens da Força Nacional para auxiliar cidades e Estados, a criação
de centros integrados de inteligência e o registro de apreensões recordes de
drogas.
Embora tenha levantado como bandeira da gestão o
combate à corrupção e ao crime organizado, os avanços foram mais visíveis nesta
segunda. O isolamento de chefes de facções, como Marcos Willians Camacho, o Marcola,
líder do Primeiro Comando da Capital (PCC), é tratado pela pasta como um dos fatores que levaram
à redução de índices de violência – a taxa de homicídios caiu 20% em 2019 em
relação ao ano anterior e roubos a bancos foram 36% menores.
A influência da gestão de Moro na queda da criminalidade é contestada por governadores e especialistas, que veem uma
tentativa do ministro de capitalizar os bons resultados da área após não
conseguir avançar com pautas anticorrupção, como o seu pacote anticrime, desidratado no Congresso.
Coube justamente aos secretários estaduais levar a Bolsonaro o pedido para
recriação do Ministério da Segurança Pública, hoje incorporado
ao da Justiça. Se concretizada, a divisão faria Moro perder uma série de
atribuições, inclusive o comando da Polícia Federal. A separação foi, por ora, descartada pelo presidente.
Presidente do Fórum Brasileiro de Segurança
Pública, Renato Sérgio de Lima avaliou que o fato de Moro ter se voltado mais
para ações da Segurança do que para as da Justiça ajudou a alimentar a polêmica
do desmembramento.
“O presidente fez um discurso muito forte de
segurança que interagiu com o sentimento de medo da população. Criou ambiente
favorável para o ministro reivindicar o que os indicadores sinalizam desde
2018. Dá pra dizer que ele (Moro) foi, em 2019, mais ministro da
Segurança do que da Justiça”, disse o especialista. “As medidas de Justiça
esbarraram no Congresso, no Supremo Tribunal Federal e na lógica da política
brasileira.”
Ao aceitar o convite de Bolsonaro e abandonar 22
anos de magistratura para assumir o posto no Executivo, Moro justificou a
decisão à época com a possibilidade de endurecer a legislação anticorrupção no
País. Logo em fevereiro, enviou ao Congresso uma série de projetos, batizada de
pacote anticrime, que previa, como carro-chefe, medidas como a prisão após
condenação em segunda instância, o plea bargain – acordo prévio em que o acusado confessa o
crime para evitar uma ação judicial – e a criminalização do caixa 2.
Nenhuma delas foi aprovada.
Diante de um pacote anticrime desidratado, Moro
apostou no combate às facções criminosas para marcar o primeiro ano da gestão.
Comemorou o crescimento da arrecadação de Fundo Antidrogas, proveniente da
venda de bens de traficantes, de R$ 44,6 milhões para R$ 91,7 milhões;
viabilizou 29 delegacias de combate à corrupção nos Estados; e aumentou em 600%
a coleta de DNA para apontar autorias de crimes.
Especialistas também citam como ação relevante de
Moro para a área de segurança o projeto “Em Frente, Brasil”, medida ainda em
fase de teste que prevê o reforço do policiamento com agentes da Força Nacional
em cidades que apresentam altos índices de criminalidade. Lançado em agosto, a
medida funciona apenas em cinco cidades por enquanto.
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Dida Sampaio/Estadão A Força Nacional de Segurança foi criada em 2004 e desde
então é formada por policiais cedidos dos Estados e treinados em Brasília para
atuação em ocasiões extraordinárias
Por outro lado, em vídeo institucional no qual
apresentou o balanço do ano, o ministério lista como ações que seriam atreladas
à parte “Justiça” do ministério a aceleração na naturalização de estrangeiros,
a expulsão de condenados e o combate tráfico de pessoas. Na peça, a pasta não
apresenta números.
Eficiência
Diretora executiva do Instituto Sou da Paz,
Carolina Ricardo disse acreditar que uma pasta específica da Segurança Pública
poderia dar eficiência às políticas públicas. Contudo, a advogada e socióloga
pondera que o debate que marcou a semana não teve esse propósito, uma vez que a
discussão foi concentrada na retirada ou não do poder do Moro.
“Precisamos ter uma instância governamental com
foco específico. O Ministério da Justiça tem muitas atribuições concorrentes.
Isso dificulta priorizar o tema da segurança. Em nenhum momento se falou de um
impacto disso para a política de segurança”, afirmou.
Já para Rafael Alcadipani, professor da FGV de São Paulo e pesquisador dos temas
relacionados à segurança pública, uma Secretaria Nacional de Segurança Pública
forte, ainda que atrelada à pasta da Justiça, bastaria. Ele também critica os
reais objetivos de uma eventual divisão das pastas.
“A bancada da bala quer um ministério para chamar
de seu. Os indicadores estão caindo e é o Sérgio Moro quem está sendo apontado
como responsável. Essa bancada e o Bolsonaro perceberam que não é interessante
deixar o Moro ser essa figura. É uma questão de protagonismo”, avaliou. /
COLABOROU JULIA LINDNER
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