Sem gringos, leilão derruba a Bolsa e divide analistas sobre Petrobras
Tais Laporta
© Germano Lüders/EXAME Ibovespa fechou em queda de
0,33%, em 108.360 pontos.
Era para ser mais um dia de recordes na Bolsa, mas
terminou em decepção. Desprezado por estrangeiros, o megaleilão do pré-sal
frustrou o investidor que esperava uma arrecadação maior, deixando a Petrobras quase sozinha na disputa. O Ibovespa
foi penalizado e fechou em queda de 0,33%, em 108.360 pontos, ao passo que as
ações da estatal sofreram forte oscilação. Mas não houve um consenso entre os
analistas sobre como o resultado afeta o futuro da companhia.
Após arrematar os blocos de Búzios e Itapu, a Petrobras reverteu os ganhos na Bolsa em poucos
minutos. Chegou a cair mais de 4% e até teve os negócios suspensos por volta
das 13h, mas em seguida ficou instável pelo resto do dia. Os papéis ordinários
(PETR3) fecharam em baixa de 0,31%, em 32,45 reais, e os preferenciais (PETR4)
em alta de 0,07%, em 29,67 reais, segundo dados preliminares.
A companhia entrou com 90% de participação junto
dos consórcios chineses Cnooc e Cnodc pela área de Búzios, onde já operava, e
levou sozinha o bloco de Itapu. Os dois custaram 70 bilhões de reais valor que
deve ser pago ao Tesouro até 26 de junho de 2020. Além do bônus de assinatura,
a estatal vai compartilhar parte do lucro com a União.
Para o estrategista-chefe da Eleven Financial,
Adeodato Netto, o mercado “reagiu com o estômago” ao ser surpreendido com a
baixa competição, mas não levou em conta os aspectos positivos da aquisição
para a Petrobras. “Ela tende a capturar benefícios futuros ao adquirir áreas
que já estavam no ‘core’ de seus negócios”, diz.
Analistas apontaram que a Petrobras enfrentava um
dilema difícil neste leilão: por um lado, se via na obrigação de demarcar
território e conquistar áreas estratégicas para exploração futura. Por outro,
existe a preocupação de que o tamanho de sua participação na disputa possa
comprometer a trajetória de seu endividamento.
O ponto de atenção ficou no fato de que, para
comprar as duas áreas, a estatal pode deixar de pagar dívidas e não conseguir
atingir a meta financeira do ano que vem. Também havia expectativas de que a
disputa poderia ajudar a Petrobras a pagar suas dívidas, caso houvesse outras
petroleiras vencedoras. Isso porque elas teriam que indenizar a estatal pelos
investimentos antecipados.
A equipe de research da XP calculou que, excluindo
o reembolso de R$ 34,1 bilhões do governo como parte da revisão do contrato
original da cessão onerosa, a Petrobras deve fazer um desembolso líquido de R$
29 bilhões no leilão, implicando um aumento da alavancagem para 2,22 vezes sua
dívida líquida sobre o Ebitda (lucro antes de impostos, juros, depreciação e
amortização), ante o nível de 1,96 vezes no terceiro trimestre.
Com isso, a XP acredita que a Petrobras terá poucos
ganhos com a compensação do atraso da produção. “Na nossa visão, isso deve
levar a um desapontamento das expectativas do mercado quanto à possível redução
do endividamento da companhia com a entrada de tais recursos”, escreveu a
equipe em relatório.
Estrangeiros, por
que fugiram?
A falta de interesse dos estrangeiros na disputa
contribuiu para que o dólar fechasse em alta de 2,22%
nesta sessão, a maior em sete meses, para 4,0818 reais. O
economista-chefe da Necton, André Perfeito, escreveu que, sem entrar no mérito
da Petrobras, o leilão deixou muito a desejar neste quesito. “O fato de áreas
não terem tido nenhuma proposta deixou um gosto amargo entre os investidores
isso sem contar que não houve ágio algum sobre as propostas mínimas
obrigatórias”, escreveu a clientes.
O sócio-fundador da Nord Research, Bruce
Barbosa, avalia que o baixo interesse dos estrangeiros no leilão pode indicar
que eles não estão dispostos a correr risco em mercados emergentes no momento.
Para ele, seria menos pior que se o motivo fosse o preço elevado dos blocos. “O
fato de eles não virem para a economia real é negativo porque teremos várias
privatizações pela frente”, diz.
Netto, da
Eleven, defende no entanto que os 70 bilhões de reais arrecadados não
representam uma quantia desprezível. Já se esperava que dois campos ficariam
para 2020. A surpresa mesmo foi com o menor interesse internacional, mas no
geral o resultado foi positivo”, diz.
O que é o leilão da cessão onerosa
A questão
surgiu em 2010, quando o governo concedeu à Petrobras o direito de produzir 5
bilhões de barris em áreas do pré-sal, uma camada rochosa localizada nas
profundezas do oceano.
Contudo,novas
explorações da região deram conta de que a área possuía até o triplo do volume
a ser explorado, um excedente que passou a ser chamado de cessão onerosa.
Como a Petrobras só tinha acesso
aos 5 bilhões iniciais, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e
Biocombustíveis (ANP) decidiu realizar um leilão para que mais empresas
pudessem ter direito a explorar o pré-sal – incluindo a própria estatal.
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