Crise de pânico e depressão refletem temor de
rompimento de barragem em Barão de Cocais
Malú Damázio
Vale havia
estipulado prazo para queda do talude até o último sábado (25), o que não
ocorreu; estrutura permanece se deslocando
À espera do rompimento
do talude, que pode provocar um colapso na barragem Sul Superior, a vida de
muitos moradores de Barão de Cocais, na região Central, está estagnada. Fora de
casa, angustiados e sem perspectivas, eles começaram a enfrentar, inclusive,
problemas de saúde.
Desde fevereiro, já
foram 6 mil atendimentos a mais nos postos do município, se comparado ao mesmo
período do ano passado, conforme o prefeito Décio Geraldo dos Santos. As
principais queixas estão relacionadas a fatores psicológicos: pensamentos
suicidas, estresse, depressão, hipertensão, crises de pânico e até infarto.
O chefe do Executivo
não soube precisar o total de passagens pela rede pública nos últimos quatro
meses, mas disse que a demanda explodiu desde que o risco na mina Gongo Soco
chegou ao patamar máximo. Dormir uma boa noite de sono, sem acordar de
madrugada ou ter pesadelos com a queda do reservatório, parece uma realidade
distante até para o prefeito, que começou a ter crises frequentes de
labirintite.
Aparecida das Dores tem dificuldades para dormir e se alimentar devido à
angústia
Quem também tem
sofrido é a produtora rural Aparecida das Dores, de 56 anos. Ela não consegue
descansar e ficou sem apetite após sair da casa em que vivia e plantava
hortaliças para vender. O imóvel fica na área de perigo e foi desocupado em
fevereiro.
Sem ter onde tirar o
próprio sustento, já que a roça está interditada, Aparecida começou a trabalhar
na propriedade de um conhecido, no bairro Santa Cruz, onde está morando
provisoriamente com o namorado. “Meu terreno ficou abandonado, morro de medo de
sair de casa. Essa situação abalou demais meu psicológico. Não durmo, fico
nervosa e ansiosa o tempo todo”, afirma.
A pressão
psicológica é tanta, que, às vezes, Aparecida pensa que seria melhor se o
talude caísse logo, para saber se a barragem irá se romper. “É horrível falar
isso, mas tem dias que, sinceramente, estou pedindo a Deus que estoure rápido
para acabar com essa angústia”, revela a moradora.
Turismo afetado
Com cachoeira, sítio
arqueológico com pinturas rupestres e santuário que reúne obras atribuídas ao
mestre do barroco Aleijadinho, Barão de Cocais vive um enfraquecimento do
turismo. A recepcionista de um hotel da cidade, Jaqueline Pádua, de 33 anos,
explica que a maior parte dos hóspedes agora é composta por funcionários que
vão ao local prestar serviços ligados à mina.
Jaqueline lembra
que, desde que a Vale anunciou que o talude deveria se romper entre os dias 19
e 25, uma empresa que havia feito reservas para funcionários cancelou o
contrato e os transferiu para uma pousada em Santa Bárbara, município vizinho.
“O pessoal não está ficando aqui, ainda mais que estamos no leito do rio”, diz.
Outra preocupação da
recepcionista, que vive no município, é que a rede de saúde não tenha número
suficiente de profissionais para absorver a demanda. O prefeito de Barão de
Cocais pediu à Vale, no início de abril, reforço psicológico e médico. Segundo
ele, a mineradora se comprometeu em resolver a situação dentro de uma semana,
mas o prazo não teria sido atendido.
Resposta
Em nota, a empresa
informou que, desde 8 de fevereiro, foram realizados cerca de 1,4 mil
consultas, 5,7 mil atendimentos psicossociais e distribuídos 1,4 mil
medicamentos. “A Vale mobilizou sete médicos, sete enfermeiros, oito técnicos
de enfermagem, 15 psicólogos, três assistentes sociais, entre outros
profissionais destacados para o atendimento aos moradores evacuados, além de
sete ambulâncias. No momento, a Vale está priorizando a segurança e a qualidade
de vida da comunidade”.
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