Apenas 3,3%
dos estudantes brasileiros querem ser professores
Agência Brasil
Professores de
escolas públicas ganham, em média, 74,8% do que ganham profissionais
assalariados de outras áreas
“Meu sonho mesmo é
dar aula para o ensino médio, pode ser em escola estadual, municipal ou
particular”, diz Lucas dos Anjos Castro, 16 anos, estudante do 2º ano do ensino
médio da Escola Estadual Professor Botelho Reis, em Leopoldina, Minas Gerais.
“Eu me vejo como professor, igual aos meus, na correria, rodando para lá e para
cá, entrando em uma sala e outra. É o que eu gosto”.
O sonho com a
carreira docente, como o de Castro, é cada vez mais raro. De acordo com
levantamento feito pelo Interdisciplinaridade e Evidências no Debate
Educacional (Iede), com base nos dados do Programa Internacional de Avaliação
de Alunos (Pisa) de 2015, apenas 3,3% dos estudantes brasileiros de 15 anos
querem ser professores. Quando se trata daqueles que querem ser professores em
escolas, na educação básica, esse percentual cai para 2,4%.
Nesta
segunda-feira (15), no Dia do Professor, a Agência Brasil, mostra as
ideias de quem quer seguir a carreira docente e de professores que não abrem
mão da profissão.
“Quando eu contei
para a minha mãe, ela me disse: ‘você pode ganhar mal, como será o seu futuro?’
Eu falei que queria e que se eu não trabalhar no que quero, não vou ser feliz”,
diz Castro.
Um dos professores
que influenciou a decisão do estudante foi João Paulo de Araújo que, além de
lecionar história na Escola Estadual Professor Botelho Reis, trabalha também na
Escola Estadual Doutor Pompilio Guimarães e no Colégio Equipe, que é
particular. “Acho que no primeiro momento, os alunos não escolhem porque a
própria família recrimina, a sociedade julga muito. Eu tenho buscado ser um
professor melhor, que inspire, que mostre que a profissão é tão boa quanto qualquer
outra, que tem desafio como qualquer outra”.
Araújo foi um dos
vencedores do prêmio Educador Nota 10, em 2013. “É a forma que posso retribuir
tudo que educação fez por mim. Venho de família humilde. Meu pai é
ex-presidiário e minha mãe era doméstica. A oportunidade que eu tive foi graças
à educação”.
Carreira pouco
atrativa
O estudo elaborado
pelo Iede mostra que a carreira docente não atrai os alunos que têm um melhor
desempenho no Pisa. A avaliação internacional da Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é aplicada a estudantes de 15 anos que fazem
provas de leitura, matemática e ciências. Entre os 70 países e regiões
avaliados, o Brasil ficou na 63ª posição em ciências, 59ª em leitura e 65ª em
matemática. Os estudantes que disseram que pretendem ser professores obtiveram
18,6 pontos a menos da média do país em matemática, 20,1 pontos a menos em
ciências e 18,5 a menos em leitura.
Dentre os países
participantes do Pisa, a Alemanha é o que apresenta a maior diferença entre a nota
dos alunos que esperam ser professores e a média geral do país. Aqueles que
querem seguir a carreira docente obtiveram 42,9 pontos a mais em matemática,
52,5 em ciências e 59,1 em leitura.
Os países com os
maiores percentuais de estudantes que querem ser professores são Argélia, onde
21,7% dos estudantes querem ser professores, e Kosovo, onde esse percentual
chega a 18,3%. Nesses países, no entanto, o desempenho desses alunos não é bom,
"mas é muito similar ao desempenho geral dos estudantes do país, que é
baixo", diz o estudo. Coreia e a Irlanda estão também entre os países com
os maiores percentuais, respectivamente 13,8 e 12,6%. Ao contrário da Argélia e
Kosovo, o desempenho dos alunos é bom, chegando, na Coreia, a ser superior à
média nacional.
“O que o dado
brasileiro revela é o fato que a ocupação de professor está com problemas de
atratividade. As pessoas que têm notas mais altas escolhem outras profissões”,
diz o professor de economia da Universidade Federal Fluminense (UFF) Fábio
Waltenberg, um dos autores do estudo Ser ou não ser professor da Educação
Básica? Salário esperado e outros fatores na escolha ocupacional de concluintes
de licenciaturas. Segundo Waltenberg, o salário é um dos entraves para a
escolha da profissão.
Equiparação salarial
Professores de
escolas públicas ganham, em média, 74,8% do que ganham profissionais
assalariados de outras áreas, ou seja, cerca de 25% a menos, de acordo com o
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
(Inep)Essa porcentagem subiu desde 2012, quando era 65,2%.
Por lei, pelo Plano
Nacional de Educação, esse salário deve ser equivalente ao de outros
profissionais com formação equivalente até 2020.
De acordo com o
diretor do Iede, Ernesto Martins Faria, três aspectos contribuem para a
atratividade da profissão. “Planos de carreira para professores e educadores,
ações específicas de valorização, que geram estímulo e permanência, e coesão
escolar. O funcionamento da escola tem a ver com visão consistente, semelhante
de gestor, coordenador pedagógico e educadores”, diz.
Segundo ele, o fato
de os professores serem muitos e estarem ligados a estados e municípios, muitas
vezes com orçamentos restritos, dificulta sobretudo a existência de planos de
carreira atrativos. “Estamos falando da carreira de 2 milhões de professores,
[não apenas o Brasil], o mundo sofre para oferecer uma carreira atrativa”.
Apesar das
dificuldades, a estudante de licenciatura em ciências sociais Aniely Silva, 20
anos, não desiste do sonho de ser, assim como Castro, professora de ensino
médio. Ela conta que a vontade ficou mais forte após participar
das ocupações de escolas em São Paulo.
“Durante as
ocupações das escolas, percebi o quanto de informação não chega para nós, que
somos de periferia e de escola pública. Queria conseguir levar informação para
as pessoas. Quando a informação chega como conhecimento, muda a realidade das
pessoas, como mudou a minha”.
Aniely arremata:
“Não escolhi a profissão pelo salário e não me desmotiva. Quero estudar muito
para ser muito boa no que eu faço e lutar para melhorar a educação, por mais
investimento e valorização dos professores”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário