Patrimônio da
Humanidade, Pampulha aguarda intervenções prometidas em 2016
Malú Damázio
Demolição do prédio
anexo ao Iate Tênis Clube é principal entrave para a adequação do Conjunto
Moderno da Pampulha às exigências da Unesco
No aniversário de um ano do título de
Patrimônio Cultural da Humanidade, celebrado hoje pela Pampulha, não há muito o
que se comemorar. Seguem paralisadas as promessas de reformas, obras de
readequação e preservação da estrutura original. Os compromissos firmados foram
fundamentais para o reconhecimento global pela Organização das Nações Unidas
para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Dentre as modificações recomendadas,
que devem estar encaminhadas em até três anos, estão a demolição do prédio
anexo ao Iate Tênis Clube, restauração da fachada da Casa do Baile e do
paisagismo de Burle Marx na praça Dino Barbieri e o tratamento da água da Lagoa
da Pampulha. Dessas quatro, somente a última foi cumprida.
Engenhosa construção do arquiteto Oscar Niemeyer é um dos espaços mais
visitados na região
“O pior problema,
para mim, é a qualidade das redes de esgoto. Os critérios que tinham atendido
para que a lagoa estivesse limpa para esportes náuticos estão, aos poucos,
sendo abandonados. Infelizmente, os próprios moradores deixam sujeira,
principalmente nos finais de semana. Nas épocas de chuva, o lixo é arrastado
para a água”
Ariel Plaza
39 anos, engenheiro químico
Ariel Plaza
39 anos, engenheiro químico
Além disso, a reforma da Igrejinha se
arrasta desde 2014, quando o edital para as obras foi publicado. Com início
previsto para o primeiro semestre do próximo ano, as alterações, orçadas em R$
1,4 milhão, já têm recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) das
Cidades Históricas, conforme a Superintendência de Desenvolvimento da Capital
(Sudecap).
No entanto, o restauro ainda não
ocorreu porque a Arquidiocese de BH agendou casamentos na capela até novembro
de 2017. As obras no Museu de Arte da Pampulha também ficaram para o próximo
ano, em agosto, e contarão com uma verba federal.
Entrave
Todas as intervenções estão dentro do
prazo previsto e devem ser concluídas até o fim da atual gestão, diz o diretor
do Conjunto Moderno da Pampulha, Gustavo Mendicino, da Fundação Municipal de
Cultura de BH. Porém, o responsável pelo complexo admite que a demolição do
prédio anexo ao Iate – construído em período posterior ao do conjunto – é ainda
o principal entrave.
Ornamentado por vidros e espelhos, Museu de Arte foi erguido para
abrigar um cassino
“No início, achei
que iam ocorrer as reformas prometidas, mas depois vi que não existem muitas
chances de demolirem a academia do Iate. Acho difícil. E a prefeitura teria que
fazer muitas adequações, principalmente aqui na orla, porque precisa voltar ao
paisagismo original. A lagoa está completamente suja, igual ao jeito que sempre
esteve. É uma pena, porque a Pampulha é um dos poucos espaços de Belo Horizonte
que conecta lazer e esporte”
Júlia Machado
19 anos, estudante
Júlia Machado
19 anos, estudante
“É uma obra cara e envolve muitas
pessoas. Nosso objetivo é conseguir conciliar da melhor maneira”. Por
atrapalhar a visibilidade total do complexo, a área do clube foi desapropriada
pela prefeitura em fevereiro do ano passado. A medida foi tomada para que o
sítio pudesse pleitear o título da Unesco. Mas, desde então, as discussões
entre a diretoria do Iate e a PBH, mediadas pelo Ministério Público de Minas
Gerais (MPMG), estão paradas.
O projeto arquitetônico da reforma
ainda não foi feito e o Iate afirma, em nota, que “aguarda, com alguma
ansiedade, que administração municipal, Iepha (Instituto Estadual do Patrimônio
Histórico e Artístico de Minas Gerais), Iphan (Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional) e Ministério Público retomem os estudos e
negociações iniciadas em 2016”.
Forro da Igrejinha apresenta infiltrações
“A única coisa que
melhorou bastante foi a limpeza da lagoa, a água está com mais qualidade e mais
clara. Para mim, isso foi bem significativo, só não sei se continuam cuidando
dela. Eles também tiraram a pichação da Igrejinha. Mas aqui, onde fico com
minha barraquinha, não sinto muita melhora porque o parque está fechado e deu
uma reduzida no comércio”
Bruno Barbosa Canela
62 anos, comerciante
Bruno Barbosa Canela
62 anos, comerciante
Negociação
Conforme Mendicino, o projeto deve
ficar pronto nos próximos meses. No anexo, o Iate mantém uma academia e um
salão de eventos, importantes fontes de renda para o clube. “A prefeitura pode
contribuir para que um outro terreno seja entregue ao Iate? Pode. Está na base
da negociação, desde que isso se justifique para um bem coletivo”.
Visitas ao complexo turístico da
capital crescem após chancela internacional
O reconhecimento internacional
aumentou em quase 20% as visitas ao complexo. Os dados são da Fundação
Municipal de Cultura. O número se refere às visitas à Casa Kubitschek, ao Museu
de Arte da Pampulha e à Casa do Baile, entre janeiro e maio deste ano. Foram
67.132 contra 56.167 do mesmo período de 2016, antes do título.
Na semana passada, o jornalista Kevin
Furtado, de 26 anos, esteve no local. O paranaense aproveitou as férias para
conhecer o cartão-postal. Na opinião dele, o conjunto moderno está “bastante
integrado” à vida dos moradores de BH.
Apesar disso, Kevin sente que faltam
espaços de lazer na região. “A Pampulha é um bom lugar para caminhar, correr e
praticar esportes, mas faltam incentivos para isso”, diz.
Há duas situações
que podem comprometer o título: a perda das características originais do
patrimônio e a falta de intervenções solicitadas pela Unesco
Manutenção
Para verificar a conservação e as
obras de adequação, a Unesco pede que os países enviem relatórios anuais ao
comitê mundial. O documento deve reportar o estado de preservação dos sítios.
Caso isso não ocorra, é necessária uma justificativa para que o local não perca
a chancela, explica a coordenadora interina de Cultura da Unesco no Brasil,
Rebeca Otero.
Em casos extremos, locais degradados
podem compor a lista de patrimônios em perigo. Os espaços são acompanhados de
perto pela Unesco, inclusive com a realização de visitas técnicas. No fim do
ano, o Brasil deverá enviar um relatório para a organização. Rebeca descarta,
porém, a possibilidade de a Pampulha integrar essa lista de risco.
“Por enquanto, a Pampulha está bem.
Faz só um ano que foi transformada em sítio cultural. Há um trabalho do país na
questão da preservação. Estamos acompanhando”, diz.
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