O papagaio de Cajazeiras
Manoel Hygino
Negar que há algo de
errado por aqui é pretender tapar o sol com peneira, ocultar o que todos sentem
e veem, em nível interno e externo – para tristeza e vergonha. O Brasil, como
nação, vive uma crise notória, e que se procura classificar como econômica ou
política, esta mais grave porque influi naquela.
Pior é que se
ampliou tanto o problema que sequer se sabe mais sua real natureza. Em âmbito
estritamente político, tenta-se explicar, argumentando que a corrupção sempre
existiu, embora não se evidenciem novas e eficazes formas e métodos adotados
para combatê-la com sucesso. Acompanhar o noticiário cotidiano, e o que resta
ao cidadão.
Encontrar saída, eis
a questão. Como? Quando? Com quem? A verdade indiscutível é que, a esta altura
do drama ou da tragédia, não são envolvidos apenas políticos ou a classe
política, os gestores da economia, os membros dos três poderes, porque toda a
sociedade está sendo julgada. Mesmo o Judiciário, com alguns de seus
representantes se expondo ostensivamente, inclusive pela discussão, divulgada
pela mídia, de temas doridos da vida brasileira. Não deveria ser assim: não
somos apenas um país, mas uma nação.
Os casos não são
simples. Mesmo os corriqueiros vão aos tribunais, como o de uma senhora de
Cajazeiras, no sertão paraibano, que – há 17 anos – acionou a Justiça para
ficar com seu papagaio de estimação. O Superior Tribunal de Justiça manteve a
decisão do TRF da 5ª Região, assegurando à idosa, de 77 anos, o direito de
posse da ave. O Tribunal, em segunda instância, considerou que o papagaio está
acostumado ao ambiente doméstico e não há indícios de maus-tratos.
Logo... Do papagaio
ao bípede implume, que somos todos nós, há uma longa distância, mas não tanto.
Não nos podemos acomodar. Se a prisão do psitacídeo demorou tanto, há de
admitir-se muitos anos para encerrar a desastrada novela dos erros e vícios
mais recentes, já que os mais antigos não cabe levar a julgamento.
Precisamos de punir
os culpados e responsáveis, levá-los às sanções pertinentes, garantidos
evidentemente, os direitos de cada um e de todos. O jurista e professor Sacha
Calmon resumiu a missão em três palavras: “Refundar a República”. Não basta
conformar-se com a ideia de que todo governo sangra, como declarou o ministro
Moreira Franco. Não se trata apenas de um governo, mas de toda a nação, seu
passado e seu futuro, comprometida com o presente.
No dificílimo jogo
de xadrez desta hora, as peças estão na mesa. Cabe à geração atual a dificílima
tarefa de movê-las e levar a pátria ao melhor destino. Punir seja quem for, em
que ambiente estiver, em que cargo encontrar-se; não somente os que se dedicam
às atividades oficiais, mas também a possíveis delinquentes que operam nas
empresas.
A Lava Jato é
simplesmente um capítulo de uma história longe de terminar, mas imprescindível
à restauração da dignidade nacional. “Numa crise que joga o país às cordas e
ameaça não só a ordem econômica, pois dilacera vidas e expõe cenas recorrentes
de selvageria social; mais importante que denunciar a política que apodreceu é
corrigir o que a fez apodrecer”, como escreveu há dias, Antônio Machado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário