Tempos Incertos
Paulo Haddad
Iniciamos o ano de 2017 com a economia brasileira em estado simplesmente
deplorável. Há inúmeros indicadores macroeconômicos que ilustram essa condição
desalentadora da economia.
A taxa de desemprego ampliada, que inclui o desemprego aberto, o
subemprego e aqueles que desistiram de procurar emprego, já atinge cerca de 22
milhões de brasileiros. A dívida pública caminha para cerca de R$ 3,5 trilhões,
um valor absolutamente impagável no atual contexto e resultante direto e
indiretamente dos déficits nominais acumulados no passado e ainda sem solução
no presente. O setor público, nos três níveis de governo, se encontra em grande
parte insolvente financeiramente e prestando serviços essenciais à população de
forma errática, intermitente e de má qualidade.
A experiência histórica mostra que esses problemas são menos difíceis de
resolver quando a economia está crescendo, quando há um conjunto de reformas de
base em processo de negociação e quando o governo tem legitimidade política
junto à opinião pública, desde que conquistada através da eficácia
administrativa e através do combate sistemático aos desperdícios e às práticas
de corrupção. Trata-se de um campo de observação recorrente e preferencial da
opinião pública que ainda está em processo de avaliação ética e política da
nova administração federal.
A dívida pública caminha para cerca de R$ 3,5 trilhões, um valor
absolutamente impagável no atual contexto
A retomada do processo de crescimento da nossa economia passa, no curto
prazo, por três caminhos batidos. Em primeiro lugar, há um amplo espaço para a
redução da taxa básica de juros a qual, ao facilitar a expansão da moeda e do
crédito, permitirá superar a atual fase da política monetária que convive com
uma espécie de agiotagem oficializada. A queda da taxa básica nominal de juros
de forma mais acelerada não é nenhuma aventura heterodoxa pois, mesmo que essa
taxa caia para um dígito, ainda assim a taxa real de juros ficará em torno de
4%, um valor ainda absurdamente elevado para os padrões internacionais.
O segundo caminho pode vir a ser uma consequência intencional da queda
na taxa básica de juros. Trata-se de induzir o sistema financeiro a
reestruturar as atuais dívidas das empresas e das famílias para níveis
civilizados através de linhas de financiamento que não sejam próximas das
práticas de agiotagem. Com suas dívidas reestruturadas, famílias e empresas
podem voltar a pensar em reaquecer suas despesas de consumo e de investimentos,
ampliando a demanda agregada não inflacionária numa economia dominada pelo
excedente de capacidade ociosa de homens e máquinas.
O terceiro caminho é o de mais difícil implementação devido à inércia e
à morosidade dos gestores da administração pública federal. Refere-se aos
processos de privatizações, de concessões e de parcerias público-privadas, as quais,
ao transformarem alguns segmentos da infraestrutura econômica e social do país
em áreas de negócios privados, podem estimular intensamente os investimentos ou
a formação bruta de capital fixo.
A sinergia dessas três trajetórias que estão ao alcance decisório das
autoridades políticas e econômicas do governo federal é capaz de gerar frutos
do crescimento econômico ainda no segundo semestre de 2017, desde que
implementadas com intensidade estratégica e persistência doutrinária, ainda
nesses primeiros meses do ano. A oxigenação da economia abre espaço para que as
reformas microeconômicas e macroeconômicas possam ser discutidas num contexto
social e político com menos estresse emocional e mais racionalidade técnica.
A maior dificuldade de se promoverem as discussões sobre as reformas
tributárias, previdenciária, trabalhista, etc., num contexto de recessão
econômica está na percepção da maioria da população que acredita que somente
ela terá perdas ao final de mais um capítulo, que somente ela pode ser socialmente
marginalizada e que as políticas econômicas somente trazem perdas e danos para
sua qualidade de vida.
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