quinta-feira, 17 de novembro de 2016

SOMOS TODOS BONZINHOS?



Síndrome de ‘bonzinho’

Simone Demolinari  





Algumas pessoas carregam consigo o seguinte lema: “sou feliz fazendo o outro feliz”. Empenham seu tempo em ajudar, cuidar e resolver problemas do outro. Dedicar-se ao próximo é, sem dúvida, uma característica positiva, sobretudo nos dias de hoje onde grande parte das pessoas está cada vez mais preocupada consigo. Contudo, existe outro ponto a ser observado. Muitas vezes, o nobre ato da bondade pode esconder uma carência afetiva, vaidade e desejo de manipulação.
“Tal qual as questões físicas, as psíquicas não são necessariamente aquilo que parecem ser na realidade”, disse Freud. É preciso enxergar além do óbvio.
Não podemos desprezar as pessoas cujo o dom genuíno é o altruísmo. Estes, dedicam-se à alguma causa, abnegando suas necessidades e abstendo-se de qualquer benefício. Não há contra partida. A doação é o próprio retroalimento da reciprocidade.
Já na dinâmica que rege a maioria das relações interpessoais, o “dar sem pensar em receber” é inconscientemente falso. A doação vem sempre acompanhada de uma expectativa de retribuição – nem que seja a gratidão ou o reconhecimento. Porém, sem se dar conta disso, muitos tornam-se exímios doadores acreditando ser despretensiosos. É aquele que na família se oferece para organizar a festa, para dormir no hospital, para buscar e trazer alguém, para cuidar do que precisar.
Viram motoristas, babás, arrumadores. Doam-se excessivamente, muitas vezes em detrimento de si. São pro-ativos na solução do problema alheio – ajudam até quem não quer ser ajudado. Sentem-se responsáveis por levantar o astral dos demais. São, além de tudo, provedores do bem estar e da alegria.
Tamanha bondade e generosidade pode ser muito bem vista socialmente, contudo, psicologicamente a história é outra. Geralmente, os “bonzinhos” são vítimas de suas próprias fraquezas. São elas:
– Carência afetiva: O tamanho da carência é proporcional à doação. Quanto mais carente, mais doador. A oferta é uma tentativa inconsciente de ser retribuído.
– Baixa autoestima: Um “self” fraco tende a se completar no outro. Isso explica a necessidade de ser útil, prestativo, assim como a dificuldade em falar “não”.
– Vaidade: Apesar de parecer contraditório, o “bonzinho” é vaidoso. Ser visto como “salvador da pátria” o faz sentir especial, uma competência que lhe confere status. Gabam-se de sua tolerância excessiva e de ser o provedor da felicidade alheia.
– Vitimismo: De forma sutil, faz o claro papel da vítima, ora se mostrando cansado de ser o ponto de apoio: “faço tudo pelos outros, mas ninguém faz por mim”; ora se colocando como o único responsável pelo bem estar comum: “se eu não fizer, ninguém faz”.
– Passionais: Quando algo não tem a resposta esperada ficam magoados e ressentidos. Passam a tratar o outro como indigno do seu amor. Muitas vezes, tem pensamentos vingativos e torcem para algo dar errado só para sentirem o doce gosto de serem solicitados.
A autoanálise é árdua. A anomalia se desenvolve à espreita: despoja o afetado de lucidez deixando-o acreditar que todos estão errados, menos ele.

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