Temer inicia mandato com
decisões polêmicas à vista e base fragilizada
Bruno Moreno
Em meio às feridas abertas pelo impeachment, Temer terá batalhas no
Legislativo a partir desta semana; posicionamento do presidente é observado de
perto pelo país
Nas próximas semanas, o presidente Michel Temer (PMDB) deverá mostrar “a
que veio”. Nem bem tomou posse no cargo e terá que decidir, em meio ao discurso
de controle dos gastos públicos, se permite uma despesa extra de R$ 4,5 bilhões
no orçamento – que pode ser triplicada – e ainda se irá avalizar manobras para
manter o também peemedebista Eduardo Cunha no exercício parlamentar.
Temer enfrentará pelo menos duas pautas bomba junto aos parlamentares a
partir desta semana, que terão a capacidade de medir o apoio político e darão
um sinal aos investidores. Podem ameaçar o ajuste fiscal e a capacidade de
lidar com o Congresso.
Vencimentos
Para a próxima quinta-feira, está agendada a votação no Senado do
aumento dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que poderá criar um
efeito cascata em todo o país, com impacto de ao menos R$ 4,5 bilhões nas
contas públicas, de acordo com a Consultoria de Orçamento do Senado.
Os salários dos ministros passariam de R$ 33.763 para R$ 36.713,88,
retroativo a 1º de junho deste ano. E, a partir de 1º de janeiro do ano que
vem, chegariam a R$ 39.293,32.
Nos bastidores, parlamentares aliados tentam fazer valer o reajuste.
Caso aprovado, caberá ao presidente decidir se enfrenta os parlamentares ou se
leva à frente o desajuste orçamentário.
A encruzilhada é tamanha que o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha,
não embarcou para a China para tentar manter a base unida.
Já para o dia 12 está marcada a sessão que pode cassar o mandato de
Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados, acusado de quebra decoro
parlamentar por ter mentido em depoimento na CPI da Petrobras.
Temer teria uma dívida com Eduardo Cunha, que instalou e encaminhou o
processo de impeachment de Dilma
Manobra
O PL27/16, que dispõe sobre o aumento para o STF, já foi aprovado pela
Câmara e, no Senado, passou por duas comissões e deve ir a plenário ainda
nesta semana.
A resistência no Senado é da bancada do PSDB. Ao mesmo tempo, os
peemedebistas têm trabalhado para que o projeto seja aprovado e o
posicionamento de Temer será decisivo para a autorização ou rejeição.
O presidente retornará da China amanhã e será pressionado a se definir
contra ou a favor do Projeto de Lei.
Se manobrar no sentido de chancelar o acréscimo nos salários dos
ministros do Judiciários, Temer colocará, mais uma vez, sob dúvidas o discurso
da austeridade e de redução dos gastos públicos.
No entanto, na semana passada, ele deu indicativo de que deverá
trabalhar para que Lewandowski e seus colegas recebam a melhoria nos
vencimentos, já que incluiu na proposta de orçamento de 2017 recursos para
pagá-los.
Críticos à PEC 241 acreditam que emenda reduzirá investimentos em
Educação e Saúde, incluindo o aparelhamento dos hospitais e dos serviços de
resgate, como o SAMU
Base frágil pode dificultar aprovação de projetos do Executivo
Michel Temer inicia o governo efetivo com a base rachada e, se quiser
aprovar projetos que entende como prioritários, terá que articular
politicamente para não sofrer derrotas significativas logo no começo da gestão.
“Nós já vimos que essa base parlamentar é sempre muito volátil.
Historicamente, de uma hora pra outra, a base se desfaz. Vimos a rebeldia de
uma parte dela que assumiu uma posição contrária à própria Constituição (no
caso da divisão da votação do impeachment). Uma base que tem de enfrentar
medidas impopulares precisa estar muito unida. Vêm medidas duras pela frente
que vão afetar situações que já existem, como direitos adquiridos no bojo da
reforma da Previdência”, avalia o secretário-geral da Associação Contas
Abertas, Gil Castello Branco.
Ao mesmo tempo, o governo do peemedebista defende medidas contrárias ao
próprio discurso de austeridade, como o aumento do teto do funcionalismo
público, com o reajuste de 16,38% dos vencimentos dos ministros do STF.
Acordo
Acordo
Castello Branco argumenta que o aumento teve origem no governo Dilma
Rousseff.
“A alegação é de que os salários já estavam acordados anteriormente.
Dilma estava fazendo acordos para tentar se manter no cargo. Não é porque ela
fez o acordo, que o governo que sucedeu teria que ir no mesmo sentido. A
promessa é de reequilíbrio das contas. Não pode evidentemente cogitar
aumentos”, avalia.
Na opinião do especialista, o governo deveria dar um basta nos aumentos
para dar credibilidade aos agentes econômicos.
“É por isso que a economia não está dando sinais claros de recuperações.
E não deu porque o governo atua de uma forma errática. Ao mesmo tempo em que
pede compromisso com a questão fiscal, concede aumentos”, critica.
PEC do teto orçamentário deve ser votada no final de outubro
Uma das principais bandeiras do presidente da República é a instituição
do teto dos gastos públicos, projeto que só deve ser votado no fim do mês que
vem. A PEC 241/2016 vincula os reajustes em orçamentos como Saúde e Educação à
inflação do ano anterior e não à arrecadação, como ocorre atualmente.
Na opinião do secretário-geral da Associação Contas Abertas, Gil
Castello Branco, a Proposta de Emenda à Constituição enfrentará resistência,
principalmente de setores estruturados.
“Se usar isso para medidas de menor valor, como telefone, passagem,
diárias, não vai ter efetividade nenhuma. O problema é que esses grupos têm por
trás corporações com base de apoio parlamentar”, argumenta.
O deputado federal Marcus Pestana (PSDB), membro da comissão que analisa
a PEC 241, avalia que esse será, efetivamente, o primeiro grande desafio de
Temer. “O principal problema brasileiro é o grave desequilíbrio fiscal. Tem que
ser uma coisa onde o governo se empenhe”, afirma.
O tucano reconhece que há resistências, mas acredita na adesão ao
projeto. Os críticos avaliam que a PEC acabará com conquistas sociais
asseguradas na Constituição de 1988, que determinou percentuais mínimos a serem
investidos em Saúde e Educação, por exemplo.
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