Eis nossa democracia
Manoel Hygino
No primeiro dia (e noite) de votação pelo Senado pela continuação, ou
não, do processo de impeachment da presidente afastada, pôde-se formar ideia da
posição dos oradores, além da pequena competência de alguns até na leitura de
textos que lhes haviam redigido.
O jurista Adilson Abreu Dallari, em artigo em outra ocasião, sob o
título “Democracia à Brasileira”, fora claro e peremptório. Faz a afirmações
objetivas: “Não obstante as diferenças ideológicas ou partidárias, o Brasil
está em uma profunda crise econômica e política... Os tempos mudaram, mas o
déficit democrático permanece”.
Adiante: “Louve-se, ao máximo, a Constituição Federal em vigor, mas é
preciso lembrar que ela teve origem espúria. O preâmbulo da Constituição começa
com uma falsidade, pois não houve eleição de uma Assembleia Nacional
Constituinte”.
O Congresso Constituinte “foi composto com base em “negociação política,
mediante eleições realizadas com observância das regras impostas pela ditadura,
sabidamente destinadas a falsear a representatividade”.
Em seguida: “Não é de se estranhar que tais representantes do povo
estivessem mais preocupados em preservar suas posições e interesses, do que
implantar uma verdadeira democracia. O fato é que o sistema político, eleitoral
e partidário, que nasceu ruim, só foi piorando ao longo do tempo. Apontam-se
como “conquistas” o voto dos analfabetos e dos menores e a liberdade de
organização partidária. Será que tais coisas fortalecem a democracia?”.
Para Dallari, “o voto dos analfabetos tem remédio: (basta) acabar com o
analfabetismo”. Quanto ao problema dos menores, os efeitos podem ser minorados
pela restauração do ensino aos jovens de educação moral e cívica, indispensável
ao sadio exercício da cidadania. Na atual ordem judiciária, menores – entre 16
e 18 anos – não saberiam discernir o que é, e o que não é crime, mas “estão
habilitados para a dificílima tarefa de escolher as pessoas que vão decidir
sobre os destinos do país. É visível o atentado à lógica e ao simples bom
senso”.
Leiamos, juntos, o trecho seguinte: “A desmedida pluralidade dos
partidos ultrapassa os limites da liberdade adentra o campo da libertinagem. A
hipocrisia campeia. A quase totalidade das siglas nada representa, mas serve
para negócios espúrios no tocante ao fundo partidário e ao tempo de propaganda
eleitoral”.
Reingressemos no quadro atual: “A elaboração e a execução do Orçamento
sob regência de lei de 1964. “O resultado disso é que o Orçamento no Brasil é
uma obra de ficção, tanto em sua elaboração, quanto, principalmente na sua
execução, pois a preocupação dominante é com a obtenção de dividendos
eleitorais (e, às vezes, financeiros, ilícitos).
Consequência:... “a utilização de recursos públicos para proveito
pessoal, ou seja, a corrupção, é algo entranhado na administração pública, não
obstante as mutações dos sistemas de governo”.

Nenhum comentário:
Postar um comentário