Indignados, com e sem voto
Clóvis Rossi
Timothy Garton Ash, um dos intelectuais mais instigantes da Europa,
conta, em "El País", que muitos de seus alunos da Universidade de
Oxford lhe dizem que "se o voto mudasse as coisas, seria abolido".
Esse desencanto com um instrumento essencial da política parece
universal. Se é encontrado em um centro de excelência como Oxford, nada mais
natural que surja também em ambientes menos privilegiados como é o caso da
Nicarágua.
Sofía Montenegro, diretora do Centro de Investigações da Comunicação,
fez uma pesquisa sobre os chamados jovens pós-revolução [a Sandinista,
vitoriosa em 1979], aqueles nascidos entre 1992 e 2000.
Constatou a socióloga Elvira Cuadra, que fez comentários sobre a
pesquisa, que "esses jovens cresceram escutando os relatos de seus pais,
tios, avôs e demais familiares sobre a ditadura, a Revolução e a era
democrática; escutaram como, uma e outra vez, disseram para que serviu derramar
tanto sangue e tantos mortos, que não vale a pena"¦".
É o relato de Álvaro Navarro para "Confidencial", interessante
publicação nicaraguense. Aí, o desencanto é com o voto e também com outros
instrumentos de luta política, como a via armada.
Aposto que professores de todas as universidades brasileiras terão, em
algum momento, ouvido expressões de desalento com a política, em particular
nestes muitos meses em que o noticiário político é ocupado por ocorrências
policiais.
O que surpreende é que os brasileiros, jovens ou não, não tenham
procurado saídas fora dos partidos tradicionais. Os mais cínicos ou conformados
dirão que é melhor a passividade de que correr para os braços, por exemplo, de
um insuportável Donald Trump, como estão fazendo
muitos norte-americanos.
Mas há exemplos, em países europeus, de que a rejeição aos partidos
tradicionais conduz à busca do novo (o que não quer dizer que o novo seja
necessariamente bom ou melhor que o velho).
Sem juízo de valor, limito-me a constatar dois exemplos recentíssimos de
como os partidos tradicionais estão apanhando.
Primeiro, a Espanha. As duas principais forças políticas caíram,
somadas, de quase 84% dos votos em 2008 a 50,7% em dezembro passado, a mais
recente eleição (a ser repetida dia 26, porque não permitiu a
formação de um governo minimamente estável).
Mais: o centenário PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol), uma
dessas forças, acaba de perder o segundo lugar nas pesquisas, desbancado por
uma nova coligação.
O Podemos, partido surgido do movimento dos indignados, aliou-se à
tradicional esquerda pós-comunista, e tem 25,6% das intenções de voto, atrás
apenas do conservador Partido Popular, com 28,5%. O PSOE ficou com 20,2%, mais
longe do Podemos do que este do PP.
Na Itália, os indignados locais deram origem ao Movimento Cinco
Estrelas, que acaba de fazer uma especular eleição municipal. Sua candidata,
Virginia Raggi, ficou em primeiro lugar em Roma, a complicada mas cosmopolita
capital do país.
No Brasil, os indignados que saíram às ruas em 2013 voltaram para casa.
Depois, reclamam.

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