Síndrome de Campinas
Alexandre Schwartsman
Depois de "o cachorro comeu minha lição de casa", o Oscar de
Desculpa Mais Esfarrapada vai para Márcio Holland (ex-secretário de Política
Econômica), que assim justificou o excesso de gastos, origem da crise atual:
"Passamos quatro anos no escuro, achando que os investimentos no país
estavam caindo porque as estatísticas do IBGE apontavam para taxas inferiores a
20% do PIB".
A culpa pela crise, portanto, seria do IBGE, ou melhor, do governo, que
"vê as estatísticas como se fosse uma coisa secundária e não libera os
recursos necessários para o IBGE fazer bem o seu trabalho".
A hipocrisia, porém, tem perna curta. No final de 2012, Holland
afirmava, em entrevista proclamando as virtudes da Nova Matriz Econômica, que
estávamos "numa fase de expansão muito forte do investimento" e que
"o Brasil [era] um dos poucos países do mundo que [tinham] uma expansão
acumulada de investimento acima de 60% nos últimos oito anos".
É verdade que o IBGE promoveu uma revisão das contas nacionais em 2015,
revelando que o crescimento em 2011 fora maior do que o inicialmente estimado,
mas isso não justifica o erro, ainda mais diante de sinais inequívocos dos
desequilíbrios gerados pela Nova Matriz, como a persistência da inflação, que
registrou média superior a 6%, a despeito do controle de preços administrados e
da nova metodologia no cálculo do IPCA.
Em particular, a inflação de serviços, impulsionada pelo aumento dos
salários acima da produtividade, manteve-se entre 8% e 9% –outro sintoma da
inadequação da política devidamente desconsiderado pela equipe econômica.
Já as contas externas mostravam piora visível desde meados de 2012,
mesmo com preços de commodities ainda elevados, culminando no deficit recorde
de 2014.
Holland quer nos convencer (ou se convencer?) de que o carro foi
dirigido apenas com o olho no velocímetro, sem atenção às trepidações e ruídos,
indicações dos problemas graves que hoje enfrentamos.
Questionado ainda sobre as fraudes contábeis, raiz do processo de
impedimento, afirmou não ter nenhuma responsabilidade, pois "não tinha
controle nenhum do caixa do governo para avaliar a qualidade daquela execução
orçamentária (...). Cada programa do Tesouro Nacional (...) não era a minha
área que olhava. Era a Secretaria do Tesouro que olhava isso".
Esse pretexto também não se mantém. Embora em 2012 Holland ainda se
achasse qualificado para falar de política fiscal, jurando que no ano seguinte
a meta fiscal seria cumprida (o que, claro, não ocorreu), não faltava quem
alertasse para as trapaças cometidas pelo Ministério da Fazenda.
Basta um passeio rápido pelo excelente Blog de Mansueto Almeida para
perceber que as críticas à contabilidade criativa de governo já eram
consensuais entre economistas que acompanhavam as contas públicas. Se o então
secretário de Política Econômica preferiu ignorar os avisos, o fez por sua
conta e risco.
O elemento comum a ambas as afirmações é a dificuldade insuperável de
encarar os problemas de forma adulta. A culpa é sempre de um terceiro; jamais
de si próprio.
Obviamente Holland é irrelevante. Já os sintomas que apresenta são
reflexos de uma síndrome que acomete nossos keynesianos de quermesse, e, por
extensão, o governo: a completa incapacidade de admitir seus próprios erros.

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