Carta aberta a Michel Temer
Júlio Delgado
A história o colocou diante do desafio de comandar o Brasil em momento
no qual a população exige mudanças profundas na gestão dos assuntos públicos. O
país é atormentado por uma crise política gravíssima, pelo declínio econômico e
por uma fratura social que dividiu os cidadãos em grupos absolutamente
antagônicos. Dessa forma, a nação tem pressa para reencontrar os caminhos do
desenvolvimento, a paz social e o orgulho de defender a mesma bandeira.
Também é certo que grande parte dos brasileiros não desejaria vê-lo
sentado na cadeira de presidente da República. Inclusive eu, que sempre defendi
a convocação de novas eleições gerais como única saída realmente democrática e
eficiente para corrigir o desastre político que as gestões PT/PMDB deixaram
como legado para o Brasil. Ainda assim, a mínima possibilidade de mudança que
seu governo pode representar para o país foi o suficiente para gerar uma onda
de otimismo na sociedade. Apesar da desconfiança, depositamos em suas mãos as
esperanças de dias melhores.
Todos entendem o grau de dificuldade de sua missão, e com certeza
ninguém espera milagres nesse tempo que lhe resta de mandato, caso seja
confirmado o impeachment da presidente afastada. Mas existe uma questão que a
população brasileira já deixou claro que vai exigir de seu governo
intransigentemente: respeito aos valores morais e éticos que representam os
princípios fundamentais da nossa sociedade e estão claramente descritos na
Constituição Federal.
Não é menor a expectativa em relação à condução dos assuntos econômicos
e à gestão dos recursos em áreas que estão sendo precarizadas dia após dia,
como a saúde e a educação. Afinal, o aumento do desemprego (já são mais dez
milhões pessoas expurgadas dos mercado de trabalho), a perda do poder aquisitivo
e a deterioração da qualidade dos serviços públicos são as principais causas do
sofrimento aplicado aos brasileiros nos últimos meses.
Uma gestão ética e o combate enérgico à corrupção são as transformações
mais aguardadas e desejadas por todos os que foram às ruas para protestar por
renovação. O histórico das nossas crises nos mostrou que os esquemas de desvio
de recursos públicos, sistematicamente impregnados na administração federal, é
uma das razões da falência moral e econômica do Brasil. Por isso, não pode
existir mais tolerância com essa questão.
Em seu discurso de posse, o senhor ressaltou que pretende fazer um
governo de salvação nacional e que promoverá reformas importantes sem, contudo,
retirar direitos adquiridos pelos cidadãos. A fala conciliadora e afável soa
bem aos ouvidos, mas eu quero lembrá-lo que a retórica populista “paz e amor”
causou danos irreparáveis ao país e dificilmente os brasileiros vão aceitá-la
novamente sem resultados concretos.
Espera-se, também, que a tímida referência à corrupção registrada em seu
primeiro pronunciamento presidencial não seja sintoma do que se transformará
seu governo com o passar dos dias. A Operação “Lava Jato”, bem como outras
investigações em curso, como a Operação Zelotes, não podem apenas “ter
prosseguimento e proteção contra qualquer tentativa de enfraquecê-la”, conforme
dito em seu ato de posse. Elas devem ter seu apoio incondicional e garantias
inequívocas de que continuarão ativas e independentes.
Enfim, senhor presidente interino. Não há tempo a perder. É hora de
deflagrar o processo de mudança. E cabe ao senhor conduzí-lo com transparência
e honestidade. As ruas já deram seu recado e mostraram que a soberania popular
será invocada sempre que necessário. Não nos decepcione.

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