A tragédia venezuelana
Manoel Hygino
Há quase dois anos, o escritor e diplomata chileno Jorge Edwards, hoje
com 85 anos, publicou um artigo muito interessante sobre a Venezuela inserida
nas Américas. Embaixador em Cuba e na França, autor de “A Origem do Mundo”,
vencedor do prêmio Miguel Cervantes de Literatura, é lúcido e objetivo em suas
considerações. Até porque sabe das coisas.
Edwards comentou, então, que o castrismo ressurgiu sob a forma de
chavismo, as políticas bolivarianas, seguindo o prognóstico de Fidel de que os
Andes seriam a Sierra Maestra da América. Imaginando os heróis da independência
do continente como Bolívar, Fidel reconheceu que seus projetos em só uma ilha
estavam condenados; necessitavam expandir-se.
Chávez mudou o panorama: homem de armas, orador popular e populista, era
dirigente de uma fábrica de petrodólares. Em consequência, Castro e Chávez
formaram uma aliança astuta, a ALBA – Alternativa Bolivariana para a América,
que pretendia mudar o hemisfério. Mas o diplomata chileno se perguntou em
seguida: “Como a antiga Venezuela se transformou na atual? É um processo que
exige longa explicação, mas não é pura literatura, não é realismo mágico. O que
se demonstra uma vez mais é que as ditaduras pertencem à esfera das soluções
falsas”.
Não é difícil constatar a verdade na afirmativa do parágrafo anterior. A
falsidade das ditaduras se pode identificar em todos os lugares e tempos, não
só na Venezuela, em que não poucos foram ditadores. O próprio Bolívar temia e
chegou a declarar que “este país cairá, infalivelmente, nas mãos da multidão
desenfreada, para depois passar ao controle de tiranetes de todas as cores e
raças”. Lamentavelmente, tem sido assim.
E o povo paga, como sempre. Quem acompanha pelos veículos de comunicação
o que ora acontece no vizinho ao Norte, divide as dores de um período lúgubre
em carências, em que falta desde a energia para abastecer desde os lares e
repartições públicas até o papel higiênico. Nenhuma solução à vista, enquanto o
presidente Maduro briga com seus fantasmas político-ideológicos (?).
Li reportagem de Nicholas Cosey, do “The New York Times”, em que se
relata minuciosamente a luta do sistema de saúde para pelo menos suportar as
adversidades cotidianas. Chega a dizer que, sem água, luvas e remédios,
hospitais da Venezuela entram em colapso. A crise econômica do país explodiu na
emergência da saúde pública que vem custando a vida de inúmeros venezuelanos. E
isso é apenas parte do desmoronamento do país, tão grave que levou o presidente
a decretar “estado de emergência”, levando a população a crer que o governo
entrará em coma. Mas convocou simultaneamente a mobilização de 520 mil homens
das Forças Armadas para exercícios militares... Sob pretexto de ameaças
externas.

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