Bruno Terra Dias*
O cinema e a televisão tornam
conhecidos mitos e lendas de outros povos, apresentando-os com naturalidade, a
mesma com que um povo culturalmente colonizado assume, como própria, a
experiência do dominante. Não se trata de novidade, mas de algo que se constata
na história da humanidade.
É assim que super-heróis do século 20,
em franquias cinematográficas, prevalecem em bilheterias multimilionárias e a
arte autóctone sobrevive em circuitos alternativos. Anti-heróis nacionais
enfrentam, como Macunaíma, adversidades importadas, e o que brota do solo
nacional aparenta distância que se não reconhece no estrangeiro.
A lenda de Beowulf, levada aos cinemas
e às telas dos televisores nos lares brasileiros, se fez assimilar. Nossa
juventude, ignorando tratar-se de poema épico medieval, admira-se com os
valores de bravura em combate contra o sombrio monstro Grendel, em
representação recheada de efeitos especiais do eterno embate entre o bem e o
mal. O reino de Hrothgar, cujos melhores combatentes são mortos pelo sombrio
Grendel, habitante de ermos que desloca protegido pela noite, será defendido
pelo herói vindo de um povo amigo. O monstro será derrotado.
A simplicidade do universal adequa-se
a momentos da vida das Nações, indistintamente. Assim foi na Espanha, com o rei
Juan Carlos sucedendo a ditadura Franco; na Polônia, com o sindicato
Solidariedade e a conquista de uma liberdade ansiada desde a II Guerra Mundial;
na Índia, e tantas Nações colonizadas, com Gandhi e mitos da descolonização
mundo afora.
Herói e monstro contam histórias de
escolhas que os levaram a destinos antagônicos, com enfrentamentos ao final,
reeditando antigas contendas, como sói ocorrer entre ditadura e democracia,
liberdade e cerceio, garantias retóricas e materiais, cultura e opressão,
interditos e violações.
Em momentos definitivos, os
enfrentamentos ocorrem em ambientes ambivalentes e pode ser difícil entender as
razões de cada um dos envolvidos. É necessário ter ideias claras e princípios
bem enraizados na consciência para não se deixar levar por empolgações
superficiais e propósitos contraditórios.
Algo, entretanto, fica claro na
maioria das vezes: violências, argumentativas ou físicas, são recíprocas, todos
ferem e são feridos. A diferença entre o bem e o mal, progressistas e
reacionários, nas perspectivas individual e coletiva, não deve ser questão de
vencedores e vencidos. Valores superiores, que se não confundem com o
imediatismo demagógico e nem com o curto horizonte fascista, prevaleceram entre
povos que fizeram de sua experiência um exemplo.
*Juiz de Direito, ex-presidente da
Associação dos Magistrados Mineiros ( Amagis)

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