quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

CORTAR GASTOS INÚTEIS




José Antônio Bicalho


 
Se você toma um dinheiro de terceiro, paga juros e prevê devolvê-lo, você contraiu uma dívida. Com base nas leis estadual e federal aprovadas no segundo semestre do ano passado, o governo de Minas pegou, entre setembro e outubro do ano passado, R$ 4,875 bilhões que estavam depositados em juízo no Banco do Brasil. É dinheiro que não é do Estado e, um dia, terá que ser devolvido. Deveria, portanto, ter sido lançado como ‘dívida’ no balanço do governo de 2015. Mas foi lançado apenas como crédito.
Conforme mostra o repórter Bruno Moreno (leia matéria na página 8), não existe norma publicada, mas já há entendimento jurídico dos corpos técnicos do Tesouro Nacional e do Tribunal de Contas da União (TCU) de que a tomada de recursos dos depósitos judiciais pelos estados precisa ser escriturada como dívida contraída. O secretário de Fazenda, José Afonso Bicalho, sabe disso e poderia ter se adiantado na correção do balanço. Se não o fez foi para ganhar tempo e evitar que a dívida consolidada líquida do governo ultrapassasse o limite legal de 200% da receita corrente líquida.
Vamos a uma conta rápida. O governo fechou o ano passado com um estoque da dívida consolidada líquida de R$ 102,592 bilhões. Ela cresceu 20,3% na comparação com o fechamento do ano anterior, apesar do governo ter pago quase R$ 6,814 bilhões entre juros e amortizações. Ao final de 2015, a dívida equivalia a 198,7% da receita corrente líquida. Por muito pouco não ultrapassou o limite dos 200%, a partir do qual o governo do Estado fica impedido de contratar novos empréstimos e de receber transferências voluntárias da União.
Estratégia
Se os R$ 4,875 bilhões tivessem sido lançados no estoque da dívida, o governo teria chegado ao fim do ano passado com uma dívida total de R$ 107,460 bilhões. Isso equivaleria a 208,1% da receita corrente líquida, que foi de R$ 51,643 bilhões. Ou seja, o governo mascarou o balanço, empurrando o problema do estouro do limite até que o TCU estabeleça oficialmente e com clareza como a tomada dos recursos dos depósitos judiciais deva ser contabilizada. Não incorreu em ilegalidade, mas manobrou espertamente os números.
Essa estratégia faz sentido se lembrarmos que o governo deverá assinar em breve com a União o acordo de mudança do indexador da dívida, de IGP-DI para o IPCA mais 4% ou Selic, o que for mais baixo. Como a renegociação das dívidas dos estados é retroativa a 2013, a expectativa é que o acordo represente um abatimento no estoque da dívida de Minas de algo entre R$ 7 bilhões e R$ 9 bilhões. Ou seja, quando o secretário Bicalho for obrigado pelo TCU a escriturar a tomada dos recursos dos depósitos judiciais como dívida, provavelmente já terá o abatimento salvador do novo acordo da dívida para não ultrapassar a meta dos 200%.
O problema, no entanto, fica apenas adiado. As receitas do governo mineiro, como se sabe, estão caindo por conta da crise e do fechamento das torneiras do governo Federal com os repasses. E, apesar da troca do indexador, nunca os encargos da dívida foram tão altos, já que a Selic, mesmo abaixo da alternativa que seria o IPCA mais 4%, está em estratosféricos 14,25%. Então, se a dívida cresceu 20,3% no ano passado (basicamente por incorporação ao principal de juros não pagos), a expectativa é que cresça ainda mais neste ano de vacas magras e juros altos. Ou seja, o que o governo fez foi apenas atrasar um pouco os ponteiros da bomba-relógio.
Governo gasta muito e gasta mal
Apareceu na primeira página da Folha de S. Paulo, em 23/5/2014, a seguinte manchete: “Copa custa só um mês de gastos com a educação”.
Ainda se discute muito se o problema do Estado brasileiro é que os governos gastam muito ou que gastam mal. Contudo, até onde me é dado ver, os governos gastam muito e gastam mal.
Não disponho de dados quantitativos, mas tenho a impressão de que os governos do PT foram os que mais gastaram até hoje em ambos os sentidos.
Gostaria mesmo que economistas dedicados à Econometria confirmassem ou refutassem minha impressão.
Apareceu na primeira página da Folha de S. Paulo, em 23/5/2014, a seguinte manchete: “Copa custa só um mês de gastos com a educação”.
Ao me deparar com essa manchete, pude surpreender o subentendido: Os gastos com a Copa não são tão extravagantes quanto se propala, se os compararmos com os gastos com a educação.
Segundo a Folha, os gastos com a Copa equivalem a 9% dos gastos com a educação.
Neste caso, considerando a notória precariedade da educação no País, infere-se imediatamente que os governos do PT não podem ser acusados de gastar pouco com a educação, mas podem ser acusados de gastar muito mal com a mesma.
E quando falamos em precariedade da educação, estamos baseados em dados fornecidos por instituições que fazem pesquisas internacionais em 180 países.
De acordo com estas mesmas, o Brasil ocupa o 88º lugar no ranking mundial de qualidade da educação básica e o 66º lugar no ranking de qualidade da educação superior.
Além disso, nossa melhor universidade, a USP, está abaixo do 200º lugar no ranking da qualidade das universidades.
Esses dados, por si sós, já são vergonhosos para um país que ostenta o 6º ou o 8º PIB do mundo!
Esse horripilante contraste talvez seja explicável, ao menos em parte:
Se, por um lado, nossa educação vai muito mal das pernas, nossa agroindústria e empresas como a EMBRAPA são um grande sucesso, digno dos aplausos dos mais acerbos críticos das condições socioeconômicas brasileiras.
A matéria da Folha vem acompanhada por um elenco dos gastos do governo no ano de 2014.
E estes gastos foram estimados conforme medições feitas em 2011 com valores atualizados de acordo com o crescimento da economia, segundo o Portal de Transparência do Governo Federal.
Compra da Refinaria de Pasadena (EEUU)
2,8 bi
Transposição do Rio São Francisco
8,2 bi
Um ano de Bolsa Família
24,7 bi
Gasto Total da Copa
25,8 bi
Hidrelétrica de Belo Monte
30 bi
Gasto Anual em Saúde
30 bi
Gasto Anual em Educação
280 bi
Gasto Federal Anual
1,2 trilhão
Gasto Público Total Anual
2 trilhões
Quanto ao gasto com a Refinaria de Pasadena, houve um aumento descomunal do preço inicial pago pela Petrobras, coisa que levantou a suspeita de superfaturamento e corrupção.
Quanto ao gasto com a transposição do São Francisco, parece ter sido dinheiro jogado fora, pois a obra está paralisada e se deteriorando.
[O que nos dá todo o direito de suspeitar que não passou de uma jogada de marquetingue político de Lula, fazendo parte do PAC (Plano para Alavancar a Companheira).].
O gasto com o Bolsa Família não passa de descarado assistencialismo e cínica compra de votos. Aqui quem tem razão é Patativa do Assaré, grande cantador nordestino:
“Esmola na mão de homem são
Ou cobre de vergonha ou vicia o cidadão”.
Podemos dizer dos gastos com a saúde o mesmo que já dissemos dos gastos com a educação, levando em conta o fato de que as condições dos hospitais públicos do SUS são tão precárias quanto às das escolas públicas.
Quanto aos gastos com a Hidrelétrica de Belo Monte, não sabemos dizer se o governo gastou demais ou se gastou mal.
Isto porque carecemos de informações a respeito dos gastos e sobre a prioridade dessa gigantesca obra de infraestrutura.
Mas sabemos muito bem das péssimas condições gerais da infraestrutura do País, das nossas rodovias, dos nossos silos, dos nossos aeroportos e principalmente dos nossos portos.
O Brasil ocupa o 123.o lugar no ranking mundialda qualidade dos portos!
Estamos há tempos recolhendo informações numéricas sobre o Brasil.
Eis o belo resultado das pesquisas internacionais feitas em 180 países. Vejam as posições em que se encontrava o Brasil em 2012. De lá para cá, esses números só podem ter piorado.
88º lugar em educação básica
66º lugar em educação superior
48º lugar em competitividade econômica
78º lugar em qualidade das instituições
99º lugar em liberdade de imprensa
84º em IDH (Índice de Desenvolvimento Humano)
69º lugar em países menos corruptos
123º lugar na qualidade dos portos
107º lugar em qualidade de infraestrutura
91º lugar em expectativa de vida
116º lugar para fazer negócios (lícitos, é claro)
61º no ranking dos melhores países do mundo para aposentados, segundo o Banco Natixis, da França
1º lugar em violência generalizada. Só homicídios são 50.000 ao ano, superando a guerra do Vietnã. Não contando assaltos, estupros, violência doméstica, abortos clandestinos, relações incestuosas com menores, etc.
6º PIB do mundo. Interpretação minha: muito dinheiro circulando nas mãos de muito pouca gente
3º lugar no mundo em venda de cosméticos e perfumes
Este último item – só para contrariar os milhões de Policarpos Quaresmas deste nosso Brasil varonil – é a maior prova de que o povo brasileiro é mesmo superficial e epidérmico.
Se as cirurgias plásticas estéticas – não as reparatórias – fossem um pouco mais baratas, o Brasil seria o campeão do mundo em mudanças de narizes, seios e nádegas.
Bem, não podemos dizer que nada muda em Pindorama, a Terra das Palmeiras…

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