José Eutáquio de Oliveira
O amor acaba. Por causa de uma carícia
negada; da resposta mal educada; em noite de lua cheia, logo depois que ele
mete o pé no freio no auge da discussão, e ela desce do carro batendo porta com
força, mandando um “vá à merda” bem sonoro para o ex-amado.
Termina o amor quando, em um dia
qualquer, dá-se conta de que o encantamento cedeu lugar à indiferença e não há
mais nada a fazer porque o coração ficou murcho; ou quando o sofrimento é tão
insuportável que, por questão de sobrevivência, a gente pede o boné e parte
para outra, deixando tudo para trás – até mesmo a escova de dente; encerra-se o
amor, quando ouvir estrelas em dia de céu enluarado parece somente loucura e
vira pieguice tentar novamente curtir, juntos, aquelas canções de amor melosas;
e fazer cócegas nos pés um do outro como prenúncio de uma boa trepada já não
faz mais nenhum sentido.
Chega ao fim o amor no exato momento
em que a lágrima dorida rola pelo rosto sozinha e se espatifa no chão como
estilhaços de mágoa e ressentimentos; o amor acaba quando não se tem mais
interesse em saber por que as ondas do mar bradam, ou que melodias cantam ao
beijarem as areias da praia; o amor também pode sucumbir abruptamente quando
nos sentimos como o capitão de um pequeno barco navegando só em meio ao mar
revolto; ou quando I can’t get no satisfation... ‘Cause I try
and I try I try, and I try... e nada.
Para no ar o amor no momento em que o
tesão já não mais se insinua no escuro do cinema e tampouco depois das inúmeras
DRs de fim de semana; num bar da Praça da Savassi esperando o garçom servir o
café ele também pode parar; assim como pode acabar num fim de festa, subindo
Bahia e descendo Floresta, com um par de chifres na testa; ou num minuto de
bobeira, na varanda da casa, ouvindo um samba do Noel ou um tango do Gardel; do
mesmo jeito que o amor vira anúncio fúnebre quando passear de mãos dadas na
praça, comendo pipocas e dando piruás aos pássaros vira somente bobagem
adolescente.
O amor encontra-se com a morte numa
topada sem sorte, na bebida que não desce, na tosse do cigarro, na batida do
carro, no jantar à beira-mar; no carnaval o amor costuma acabar em sangue, suor
e cerveja, correndo atrás do trio elétrico que passa por cima de quem já morreu
porque não foi; em noites de muita chuva, raios espantosos, trovões
atordoantes, então, o amor acaba mesmo; mas acaba também nos dias de amanhecer
esplendoroso, tardes magníficas, noites pacíficas, em dias de jogos do Galo,
nas bebedeiras no Mercado Central, nos botecos de Santa Teresa – no balcão ou
na mesa – durante as caminhadas no Parque Municipal, nos passeios na Mata do
Jambreiro, em dezembro, março ou fevereiro; em plena Praça Sete o amor pode
chegar ao fim em meio ao trânsito pesado, ou na espera do semáforo; como também
pode acontecer de o amor falecer de repente, numa noite de São João ao som do
foguetório junino, num bate-coxa xaxado, num foxtrote ou num baião arretado; de
susto o amor encerrar suas atividades no balanço do trem, no tédio do voo
noturno, no movimento dos barcos. O amor sempre acaba. Como tudo na vida. Como
a vida.
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