quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

DÍVIDA PÚBLICA (1)



  

José Antônio Bicalho



Sempre ouço o seguinte vindo de leigos bem-intencionados: “governo é igual à casa da gente, só pode gastar o quanto ganha. Do contrário, quebra”.

E sempre tenho paciência para explicar que não é bem assim. Aliás, que não é nada assim. Governo não é como a gente e não precisa gastar apenas o que ganha.

Tenho paciência porque, como disse, a falácia normalmente é repetida por pessoas íntegras, que merecem ser despertadas. O raciocínio parece essencialmente verdadeiro na sua simplicidade, mas é falso e demagógico.
Também é conservador, mas isso não vem ao caso.

A diferença fundamental entre orçamento doméstico e de governo é que o segundo conta com uma máquina de fazer dinheiro. E não estou falando da Casa da Moeda, mas da capacidade de emissão de títulos públicos da dívida.

Na nossa casa, o ideal é que não tenhamos dívidas, principalmente bancárias. Se, ao contrário, conseguirmos amealhar uma bela poupança, então seremos apontados como exemplo de boa gestão financeira.

Com o governo não é assim. Governo está sempre endividado e é importante que assim seja. Os títulos públicos da dívida são instrumento imprescindível para que o governo possa captar a poupança interna. Captada, essa poupança deve ser investida em projetos que gerarão desenvolvimento e, consequentemente, mais poupança interna.
Neste círculo virtuoso, o crescimento nominal da dívida não é problema. Quando bem aplicados os recursos captados, o aumento da dívida é acompanhado pelo crescimento Produto Interno Bruto (PIB), o que permitirá que o governo volte ao mercado para tomar volumes ainda maiores de crédito, num ambiente de estabilidade e confiança. Portanto, o que interessa é o equilíbrio da relação entre dívida e PIB, e não o controle nominal da dívida.

Flutuações nessa relação entre dívida e PIB são naturais e, normalmente, administráveis. Nos momentos em que a economia desacelera (e todos sabemos que a economia é feita de ciclos), o governo pode se endividar mais para aumentar sua capacidade de investimento em projetos indutores do crescimento (as chamadas políticas anticíclicas). Quando a economia volta a crescer, o governo pode colocar o pé no freio e trabalhar na redução da relação entre dívida e PIB, tomando fôlego para voltar a puxar a economia no próximo ciclo de baixa.

Foi assim que funcionou durante o primeiro mandato de Dilma. E é o contrário o que está funcionando nesse segundo mandato. Podemos questionar a qualidade do investimento público realizado no passado recente, mas hoje nem isso.
A questão atual é que a dívida está crescendo sem a correspondência com a economia e sem o amparo de políticas anticíclicas. O problema passou de conjuntural a estrutural. O círculo virtuoso citado acima se transformou em círculo vicioso, com perda da confiança dos entes do mercado na capacidade do governo de honrar seus compromissos, o consequente aumento dos juros para a tomada de novos créditos e, claro, mais dívida.

E o resultado é que a dívida pública federal saiu absolutamente do controle e, nessa toada, ameaça levar o país à bancarrota mais cedo ou mais tarde. Amanhã analisaremos os números da contabilidade federal que corroboram o raciocínio acima.

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