Demissões crescem entre
trabalhadores com maior grau de escolaridade
Bruno Porto - Hoje
em Dia
Luiz Costa/Hoje em
Dia
O engenheiro Ewaldo
Mansur teve a demissão homologada na semana passada.
A crise econômica no Brasil entrou em um novo patamar. Agravado pela
falta de reformas estruturais e pela aceleração do processo de desindustrialização,
o desemprego passou a atingir de forma mais crítica trabalhadores com maior
nível de escolaridade. Dados do IBGE revelam que, do contingente de desocupados
no país, 63,3% são pessoas com 11 anos ou mais de estudo. No início de 2014, esse
percentual era de 61,4%, em 2010, de 56%, e em 2005, de 45%.
Atingir trabalhadores com escolaridade mais elevada e em níveis hierárquicos altos na estrutura das empresas é um indicativo de que a crise econômica entrou em outro estágio no mercado de trabalho.
Diante de uma conjuntura hostil, empresas estão promovendo amplas reestruturações, o que exige um realinhamento também dos profissionais e da forma com encaram a carreira. Empresas especializadas em Recursos Humanos apontam que os cortes chegaram ao nível da gerência, sobretudo em setores como mineração, siderurgia, indústria automotiva e construção. A flexibilidade para aceitar cargos hierarquicamente mais baixos e, por consequência, salários menores pode ser um passo atrás estratégico. A recolocação no mercado passa a desafiar profissionais que há pouco tempo eram disputados pelos empregadores.
Compasso de espera
A falta de grandes obras de infraestrutura e o ambiente desfavorável para novos projetos desencadearam no setor de engenharia consultiva, por exemplo, um fluxo de demissões poucas vezes visto. Até o fim de 2015, o mercado de trabalho para esses profissionais em Minas terá um número de ocupados menor do que a metade computada em meados do ano passado.
Em julho de 2014, o setor empregava 20 mil pessoas em Minas Gerais. Até setembro deste ano, foram demitidos 8 mil engenheiros, e a previsão é de mais 2,6 mil desligamentos até dezembro. Desta forma, um mercado de 20 mil vagas deve ser reduzido a 9,4 mil postos de trabalho em 18 meses. Os dados são da regional mineira do Sindicato Nacional de Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco-MG).
A engenharia consultiva, além do desenvolvimento de projetos, atua no gerenciamento, supervisão e fiscalização da execução de projetos e de serviços agregados.
“Em um primeiro momento, o impacto é no ‘chão de fábrica’, mas a persistência do ambiente ruim leva ao corte de mão de obra qualificada, o que indica o aprofundamento da crise. Ao fechar postos de trabalho com remuneração maior, acelera-se a queda da renda média da população, da massa salarial e do consumo”, apontou o coordenador do curso de Economia da faculdade Ibmec, Márcio Salvato.
A Pesquisa Mensal de Emprego, do IBGE, mostrou que o rendimento médio real dos trabalhadores em setembro deste ano foi 4,3% menor do que em igual período de 2014.
Para Salvato, “o novo patamar da crise” também significa um período mais longo de retração. “Podemos ter um ‘respiro’ no Natal, mas ele será pior que nos anteriores, e o início do ano é sempre um período de baixa atividade econômica”, disse.
Momento econômico ruim exige flexibilidade do profissional em busca de recolocação
Seja uma “otimização de custos”, como dizem os empregadores, seja uma “limpa”, no linguajar informal dos funcionários, a onda de cortes vem subindo escada dentro das empresas. A execução dos planos de reestruturação interna das companhias passa inevitavelmente pelo clichê do “fazer mais com menos”, e vai atingir muitos postos de trabalho de analistas, coordenadores, gerentes e outros cargos de média e alta posição na hierarquia.
“Se determinado departamento de uma empresa tem uma equipe de três pessoas, sendo dois analistas e um gerente, um analista será promovido a gerente, e o gerente vai perder o emprego. É basicamente isso o que temos visto”, diz o diretor do Grupo Selpe, Hegel Botinha.
“Vi caso de um gerente que tinha salário de R$ 12 mil. Ficou desempregado e durante seis meses não conseguiu outro emprego do mesmo nível. Acabou aceitando uma vaga de analista sênior por R$ 8 mil. Esse prazo de recolocação era de três meses, passou para seis e pode chegar a nove”, afirmou Botinha.
O diretor da HM Serviços de RH, Heitor Moreira, aconselha o profissional a ser mais flexível na busca por outro emprego. “A prioridade número um é manter o posto. Se não for possível, é preciso estar aberto a aceitar mudanças na carreira e até trocar de cidade. Há oportunidades em outros lugares”, disse.
Aprofundamento da crise na indústria extingue postos de melhor remuneração
O menor ímpeto da indústria tem consequência direta no aumento do desemprego entre os mais escolarizados. “A indústria tem necessidade de mão de obra mais qualificada e vem ano a ano perdendo espaço no PIB do país. A continuar esse movimento, a tendência é de agravamento desse quadro”, disse o vice-presidente do Conselho Regional de Economia de Minas Gerais (Corecon-MG), Pedro Paulo Pettersen.
A participação da indústria no PIB era de 17,9% em 2004, mas vem perdendo força. Em 2013, estava em 11,5%, e chegou a 10,9% no ano passado. Os dados são da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). A estimativa para 2015 é a de que essa representatividade caia a um dígito.
Sozinhos, os escritórios de engenharia que trabalham junto ao setor de mineração foram responsáveis por metade das 8 mil demissões registradas no setor de engenharia consultiva em Minas Gerais desde julho de 2014. As grandes empresas do setor, responsável pela contratação dos escritórios de engenharia, estão com o pé no freio, e abortaram planos de expansão ou de abertura de novas minas. Uma das justificativas é a desvalorização do preço do minério de ferro no mercado internacional. Desde janeiro de 2014, quando estava cotado a US$ 128 a tonelada, o preço do minério de ferro despencou para próximo de US$ 50 atualmente.
O presidente do Sinaenco, Fábio Krollmann, enxerga um erro estratégico por parte das mineradoras. “No momento de depressão dos preços e demanda mundial por commodities minerais, seria o momento ideal para se projetar. Isso porque uma nova lavra que sai do zero leva de quatro a cinco anos para o início da produção, sem contar o licenciamento ambiental e outros embaraços burocráticos, que podem atrasar um projeto em mais alguns anos”, disse.
Por essa linha de pensamento, projetos iniciados hoje entrariam em operação num momento de preços e demanda muito diferentes do atual. Outro erro estratégico das empresas de mineração, segundo Krollmann, seria o não investimento em projetos para redução de custos e aumento de produtividade.
“As maiores empresas do mundo na área de mineração estão travando uma guerra de redução do preço de produção da tonelada do minério de ferro. Se este movimento não for acompanhado também pelas menores, estas estarão fora do mercado em pouco tempo por falta de viabilidade econômica”, disse.
Atingir trabalhadores com escolaridade mais elevada e em níveis hierárquicos altos na estrutura das empresas é um indicativo de que a crise econômica entrou em outro estágio no mercado de trabalho.
Diante de uma conjuntura hostil, empresas estão promovendo amplas reestruturações, o que exige um realinhamento também dos profissionais e da forma com encaram a carreira. Empresas especializadas em Recursos Humanos apontam que os cortes chegaram ao nível da gerência, sobretudo em setores como mineração, siderurgia, indústria automotiva e construção. A flexibilidade para aceitar cargos hierarquicamente mais baixos e, por consequência, salários menores pode ser um passo atrás estratégico. A recolocação no mercado passa a desafiar profissionais que há pouco tempo eram disputados pelos empregadores.
Compasso de espera
A falta de grandes obras de infraestrutura e o ambiente desfavorável para novos projetos desencadearam no setor de engenharia consultiva, por exemplo, um fluxo de demissões poucas vezes visto. Até o fim de 2015, o mercado de trabalho para esses profissionais em Minas terá um número de ocupados menor do que a metade computada em meados do ano passado.
Em julho de 2014, o setor empregava 20 mil pessoas em Minas Gerais. Até setembro deste ano, foram demitidos 8 mil engenheiros, e a previsão é de mais 2,6 mil desligamentos até dezembro. Desta forma, um mercado de 20 mil vagas deve ser reduzido a 9,4 mil postos de trabalho em 18 meses. Os dados são da regional mineira do Sindicato Nacional de Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco-MG).
A engenharia consultiva, além do desenvolvimento de projetos, atua no gerenciamento, supervisão e fiscalização da execução de projetos e de serviços agregados.
“Em um primeiro momento, o impacto é no ‘chão de fábrica’, mas a persistência do ambiente ruim leva ao corte de mão de obra qualificada, o que indica o aprofundamento da crise. Ao fechar postos de trabalho com remuneração maior, acelera-se a queda da renda média da população, da massa salarial e do consumo”, apontou o coordenador do curso de Economia da faculdade Ibmec, Márcio Salvato.
A Pesquisa Mensal de Emprego, do IBGE, mostrou que o rendimento médio real dos trabalhadores em setembro deste ano foi 4,3% menor do que em igual período de 2014.
Para Salvato, “o novo patamar da crise” também significa um período mais longo de retração. “Podemos ter um ‘respiro’ no Natal, mas ele será pior que nos anteriores, e o início do ano é sempre um período de baixa atividade econômica”, disse.
Momento econômico ruim exige flexibilidade do profissional em busca de recolocação
Seja uma “otimização de custos”, como dizem os empregadores, seja uma “limpa”, no linguajar informal dos funcionários, a onda de cortes vem subindo escada dentro das empresas. A execução dos planos de reestruturação interna das companhias passa inevitavelmente pelo clichê do “fazer mais com menos”, e vai atingir muitos postos de trabalho de analistas, coordenadores, gerentes e outros cargos de média e alta posição na hierarquia.
“Se determinado departamento de uma empresa tem uma equipe de três pessoas, sendo dois analistas e um gerente, um analista será promovido a gerente, e o gerente vai perder o emprego. É basicamente isso o que temos visto”, diz o diretor do Grupo Selpe, Hegel Botinha.
“Vi caso de um gerente que tinha salário de R$ 12 mil. Ficou desempregado e durante seis meses não conseguiu outro emprego do mesmo nível. Acabou aceitando uma vaga de analista sênior por R$ 8 mil. Esse prazo de recolocação era de três meses, passou para seis e pode chegar a nove”, afirmou Botinha.
O diretor da HM Serviços de RH, Heitor Moreira, aconselha o profissional a ser mais flexível na busca por outro emprego. “A prioridade número um é manter o posto. Se não for possível, é preciso estar aberto a aceitar mudanças na carreira e até trocar de cidade. Há oportunidades em outros lugares”, disse.
Aprofundamento da crise na indústria extingue postos de melhor remuneração
O menor ímpeto da indústria tem consequência direta no aumento do desemprego entre os mais escolarizados. “A indústria tem necessidade de mão de obra mais qualificada e vem ano a ano perdendo espaço no PIB do país. A continuar esse movimento, a tendência é de agravamento desse quadro”, disse o vice-presidente do Conselho Regional de Economia de Minas Gerais (Corecon-MG), Pedro Paulo Pettersen.
A participação da indústria no PIB era de 17,9% em 2004, mas vem perdendo força. Em 2013, estava em 11,5%, e chegou a 10,9% no ano passado. Os dados são da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). A estimativa para 2015 é a de que essa representatividade caia a um dígito.
Sozinhos, os escritórios de engenharia que trabalham junto ao setor de mineração foram responsáveis por metade das 8 mil demissões registradas no setor de engenharia consultiva em Minas Gerais desde julho de 2014. As grandes empresas do setor, responsável pela contratação dos escritórios de engenharia, estão com o pé no freio, e abortaram planos de expansão ou de abertura de novas minas. Uma das justificativas é a desvalorização do preço do minério de ferro no mercado internacional. Desde janeiro de 2014, quando estava cotado a US$ 128 a tonelada, o preço do minério de ferro despencou para próximo de US$ 50 atualmente.
O presidente do Sinaenco, Fábio Krollmann, enxerga um erro estratégico por parte das mineradoras. “No momento de depressão dos preços e demanda mundial por commodities minerais, seria o momento ideal para se projetar. Isso porque uma nova lavra que sai do zero leva de quatro a cinco anos para o início da produção, sem contar o licenciamento ambiental e outros embaraços burocráticos, que podem atrasar um projeto em mais alguns anos”, disse.
Por essa linha de pensamento, projetos iniciados hoje entrariam em operação num momento de preços e demanda muito diferentes do atual. Outro erro estratégico das empresas de mineração, segundo Krollmann, seria o não investimento em projetos para redução de custos e aumento de produtividade.
“As maiores empresas do mundo na área de mineração estão travando uma guerra de redução do preço de produção da tonelada do minério de ferro. Se este movimento não for acompanhado também pelas menores, estas estarão fora do mercado em pouco tempo por falta de viabilidade econômica”, disse.
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