Luiz Hippert
“Me explica como se eu fosse uma criança de sete
anos”. Este bordão foi repetido várias vezes pelo advogado interpretado por
Denzel Washington no filme “Filadélfia”. Ele dizia isso sempre que procurava
entender, com certa ironia, os argumentos dos seus oponentes. Aliás, grande
filme, viu, um marco na conscientização do drama da Aids.
Pois é, hoje sou eu essa criança de sete anos, que
escreve pra falar do que não quer e nem gosta, mas precisa. Tem muito assunto
que evito. Por um motivo simples: gosto de falar de coisa boa. Ah não, mentira.
Tem mais de um motivo. O outro é que fico me perguntando de que adianta malhar
num ferro que tantos outros estão malhando. O que tenho a acrescentar? O que
pode representar minha pequena voz em meio a milhares de outras, muitas de
gente que entende do assunto bem mais do que eu? Não tenho nenhuma dessas
respostas, só um sentimento de que, qualquer coisa que diga aqui hoje, fora
desse tema, vai soar esquisita.
Pra quem ainda não pescou, o tal tema é o
“acidente” envolvendo as barragens rompidas e o inacreditável mar de lama que
escapou. O acidente vai com as aspas mesmo, porque me parece que uma coisa tão
provável de acontecer, quando acontece, não pode ser classificada exatamente
como acidente.
Aqui entra a criança de sete anos, e é com esse
total desconhecimento que pergunto: Não parece meio óbvio que estas barragens
são feitas para romper, mais dia menos dia? Que demore dez anos, ou 50, mas uma
hora essa lama toda não vai ser cuspida pra fora? Aí meu amigo, engenheiro,
conhecedor dessa tralha toda de barragens e processos industriais, me diz que
não, que elas são seguras. Ah, tá bom, são seguras, mas os fatos não estão
dizendo exatamente o contrário? Ou todas são seguras, menos estas?
Bom, tem também aquelas que (ainda) não se
romperam, ou que talvez nem se rompam durante a sua utilização. Aí a criança de
sete anos tem outra dúvida. A capacidade delas é infinita? Não, né? Depois que
estão lotadas, o que acontece? Parece que são “desativadas”. Desativar um troço
desses quer dizer o que? Deixar uma montanha de lixo tóxico eternamente
represada? Vai aguentar 10 anos? 100 anos? E depois desses 100 anos, quem
estiver no caminho faz o que, pratica o velho, e não tão bom, salve-se quem
puder?
Nossa! Não, pera aí, tava me esquecendo. Já
explicaram mil vezes que essa lama não é tóxica. O que ela é então? Adubo pra
terra? Comida pros peixes?
Enfim, vamos falar de coisa boa. Em meio a tanto
caos, teve uma ação que me chamou a atenção em especial, pelo inusitado e pela
prova de coragem. Li que trilheiros e jipeiros, acostumados a se aventurar na
região, enfiaram suas motos e jipes lama adentro, em busca de sobreviventes nos
lugares onde ninguém mais conseguia chegar. Isso fora as tantas manifestações de
solidariedade, um povão mobilizado pra minimizar o sofrimento de quem nem
conhece.
Tá certo que existem os responsáveis, e eles é que
precisam dar um jeito no estrago que fizeram. Mas, enquanto eles discutem no
bem bom do ar condicionado, com muito rabo preso pela força da grana, as
vítimas têm fome e precisam de lugar pra dormir. Nessas horas, só a empatia do
ser humano pra dar jeito. E é sempre ela que dá.

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