Márcio Doti
Caso seja concretizado, o acordo entre
a presidente Dilma e o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), vai configurar um indiscutível e indisfarçável símbolo da desonra
nacional. A presidente, rendida diante dos escombros que produziu com a sua
incapacidade para governar, a sua inabilidade política, sua teimosia e a
comprovada tendência para a mentira nos palanques, está posta diante de uma
economia destruída, um dilema entre seguir seu pai político e abrir torneiras
de dinheiro para, de novo, fazer de conta que resolve a questão dos mais pobres
e desse modo faz desmoronar as poucas chances de praticar austeridade e
recompor o quadro da economia. Uma presidente em situação tão delicada e ainda
posta diante da possibilidade de ter seu impeachment votado, de ter as suas
contas rejeitadas pelo plenário do Congresso, é alguém colocada diante de um
personagem que já mostrou ser ardiloso e competente malabarista político. O
presidente da Câmara, que por sua vez está próximo a uma grave ameaça, mentiu
perante a comissão parlamentar negando que tivesse dinheiro no exterior, mas
foi recentemente posto diante das comprovações levantadas pelo Ministério
Público da Suíça, que apurou contas no valor de quase U$ 2 milhões em seu nome
e de sua esposa. Primeiro a mentira, depois a origem do dinheiro que vem das
tramoias praticadas com dinheiro da Petrobras, segundo apurações da Polícia
Federal, na Operação Lava Jato.
A BAIXEZA NAS ALTURAS
São, portanto, duas figuras que ocupam cargos mais elevados da República. A presidente e seu substituto, na falta do vice. Ambos em situações delicadas, graves e incontestáveis. A rigor, não há acordo que possa ser aceito como algo praticável por uma sociedade que seja, de fato, organizada, que seja séria, que esteja trilhando o caminho do bem e que rejeite a qualquer custo o caminho do banditismo, do ilegal, do inconfessável, intolerável e inadmissível.
Tomara não estejamos vivendo à véspera de algo tão sórdido, tão baixo e tão sujo. Sabemos que o Brasil chegou às raias do absurdo, que está vivendo os piores de seus dias, por mais que surjam sempre os apaziguadores e os que se oferecem para minimizar com lembranças e exemplos do passado que por mais frequentados por erros, por errados, por outros escândalos, jamais viveu algo tão tenebroso e inaceitável.
O Brasil dos nossos dias, vivido por nós, patrocinado por nós, está numa encruzilhada cuja direção certa não é questão de escolha, é questão moral e só pode ser uma: a que rejeite tudo que aí está de acordos, de malfeitos, de malfeitores e tome a direção dos consertos e acertos para que possa seguir em frente: readquirir em primeiro lugar o respeito dos próprios brasileiros e em seguida o respeito do resto do mundo. Soerguer o país, trabalhar pela reconstrução, senão em nome e para o bem de nós mesmos, mas principalmente para as gerações do futuro, aquelas que certamente viverão ainda os sacrifícios e as consequências de tudo errado e do mal que se fez agora e que se fez também ontem e anteontem. Os brasileiros precisam acordar e se distanciar de dois grupos distintos: dos anestesiados, que parece nada enxergar e vão em frente como se estivéssemos caminhando pela melhor das vias, e aqueles que mesmo sabendo o quanto estão errados e próximos do precipício, bradam e incitam como se, ao menos, estivessem convictos. Momento difícil. Estratégico. Tristemente histórico se não prevalecer a lucidez.

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