A cereja podre no bolo de
Dilma
Vinicius Torres Freire
O descrédito já nos custava caro fazia tempo, cortesia de Dilma
Rousseff. Na prática, já havíamos sido rebaixados quando os donos do dinheiro
grosso sentiram o cheiro de queimado da besteirada econômica e passaram a
cobrar mais para emprestar ao país.
Vai custar algo mais. A gota d'água suja foi o "Orçamento
transparente" de 2016, na verdade roto e furado de deficit, causa imediata
do rebaixamento da nota de crédito do Brasil mesmo segundo a "ala
ortodoxa" dos economistas do governo.
Vai haver mais estragos. De óbvio e imediato: real ainda mais
desvalorizado, juros algo mais altos, recessão mais longa ou profunda. Dúvida
maior é o que será da política.
Vai começar o período da Regência? Dilma Rousseff vai entregar a
rapadura, se não de direito, pelo menos de fato? A quem? A Joaquim Levy,
segundo a versão do burburinho palaciano da noite de ontem? Será uma regência
trina provisória (Levy, Temer, Congresso)? O PMDB vai antecipar a fritura final
da presidente?
Como um governo ainda mais desmoralizado será capaz de coordenar um
acordo entre lideranças políticas e sociais para dar um jeito mínimo nas contas
públicas? Até agora, não era capaz de coordenar nem mesmo sua desordem
intestina, a barafunda palaciana que cria mixórdia política e desbarata qualquer
programa econômico coerente e durável.
O descrédito começou bem antes que nos dessem nota vermelha, a
medalhinha de potencial caloteiro, como o fez a S&P ontem (aliás, o que
será da endividada Petrobras?). Mesmo assim, foi inesperado levar agora o
rótulo de "investimento especulativo", grau "caloteiro
mirim", "especulativo, mas nem tanto". Imaginava-se, governo e
"mercado", que seria possível enrolar até janeiro, por aí.
Por que a S&P rebaixou o país? Porque o crescente tumulto político
reduziu "a capacidade e a vontade do governo de elaborar um Orçamento
coerente" com as promessas do início de Dilma 2. Porque o governo baixou
de novo a meta de superavit "seis semanas depois de ter cortado a meta
anterior", seguindo o método confuso de desempenho reverso, o método Dilma
Rousseff (não tem meta e, quando piora, dobra a meta degradada). Porque se
previa um triênio de deficit primário.
A dívida crescerá, na avaliação da S&P, pois o deficit nominal será
de 8% tanto em 2015 quanto em 2016, com a economia encolhendo 2,5% e 0,5%,
respectivamente. Na média do quadriênio 2014-2017, o deficit seria de 7% em
média. Um desastre.
Pode piorar já no ano que vem. A nota de crédito pode cair mais devido à
possibilidade relevante ("33%") de que o deficit cresça mais, dada a
inércia causada pelo tumulto político, ou ao risco de desordem econômica ainda
maior do que a esperada agora, diz a S&P.
Sim, essas agências já foram negligentes, ineptas e mesmo cúmplices de
desastres, como na crise de 2008. Sim, seguem o bonde de euforias dos mercados
financeiros, dão alertas tardios, quando não apenas comparecem para matar os
feridos depois da batalha. Mas, apesar de vexames e erros, tais empresas contam
porque suas notas orientam, mesmo legalmente, muita decisão de investimento.
Desta vez, porém, para nosso vexame e miséria, até as agências de
classificação de risco estão certas.

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