quarta-feira, 22 de julho de 2015

DISSIMULAÇÃO DOS POLÍTICOS ACUSADOS



Entenda truques de retórica que políticos suspeitos usam para negar crimes

Reinaldo Polito



Com a delação premiada, a cada dia, nos últimos tempos, políticos e empresários têm a difícil e nem sempre bem-sucedida tarefa de se defender.  Um conhecido advogado me confidenciou em uma das aulas de oratória que ministrei a ele: "Polito, nunca vi nada igual na minha vida. Quando você pensa que o cliente já contou tudo o que sabia, aparece um delator com novidades".
Como os acusados, de maneira geral, são bons de oratória, quase sempre orientados por advogados, são eles próprios que se posicionam nas tribunas, ou vão para frente das câmeras e enfrentam os microfones. Usam a eloquência e demonstram indignação na tentativa de refutar as acusações de que foram vítimas, procurando provar sua inocência.
Como veremos esses episódios com frequência cada vez maior, observe quais as táticas mais comuns usadas pelos acusados e tente avaliar, sem prejulgamentos, se estão dizendo ou não a verdade. Não nos esqueçamos ainda de que, por trás das acusações, pode haver também interesses políticos inconfessáveis.
Cabe aqui uma reflexão. Embora todos nós queiramos que bandidos e malfeitores travestidos de representantes do povo fiquem trancafiados atrás das grades, temos de tomar cuidado com as injustiças. Alguns querem aproveitar a onda para enfraquecer adversários e se beneficiar. É bom ter prudência. Em época de caça às bruxas, o risco de excessos pode incluir inocentes no pacote dos condenados.
O susto inicial
Assim que são acusados, a primeira reação é a de se mostrarem surpresos, incrédulos, como se não entendessem os motivos que levaram alguém a contar todas aquelas mentiras. Essa seria a atitude de uma pessoa inocente. Portanto, tendo culpa ou não, a reação será sempre a mesma. Alguns vociferam, outros demonstram tranquilidade, mas o objetivo é o mesmo – passar a imagem de inocente.
Baixada a adrenalina
Superado o primeiro momento, quase sempre, o acusado procura desqualificar quem o acusou. Seja alguém com culpa comprovada, atuando como delator. Seja um adversário político, um órgão de imprensa. Seja uma autoridade responsável pelo caso, um juiz, um delegado, um promotor.
Como o acusador nem sempre é muito conhecido, a intenção do acusado é mostrar que ele não tem reputação, autoridade moral, competência, imparcialidade, ou passado ilibado. Portanto, não tem credibilidade, e suas palavras não devem ser consideradas.
O momento do contra-ataque
Se os fatos forem contundentes, o próximo passo dos acusados é mostrar que são perseguidos por interesses políticos. Afirmam que suas ações contrariam posições adversárias, e por isso seus desafetos se valem de mentiras para atacá-los. Geralmente o nome dos algozes não é citado. Quanto menos identificado for o suposto grupo que o atacou, menores serão as chances de que sejam contestados.
As estratégias legais
Para as táticas objetivas de defesa, algumas linhas são bastante conhecidas. Se as acusações não puderem ser provadas com fatos concretos (lembrando que corruptos quase nunca deixam rastros evidentes de seus crimes) e se basearem em hipóteses, a defesa é feita pela simples negação.
Ora, quando não há como provar, basta negar que o crime tenha existido, ou, pelo menos, cometido por ele. Alguns condenados no caso do mensalão, por exemplo, só foram presos porque os juízes entenderam que houve o "domínio do fato". Mesmo não encontrando "recibo de culpa assinado", o crime não poderia ter ocorrido sem o conhecimento e a participação do acusado.
Quando, entretanto, a tese contrária se sustenta em documentos, a defesa é feita com a alegação de que as provas foram extraídas de maneira ilegal, que foram adulteradas, rasuradas, o que coloca por terra sua autenticidade. Recurso usado pelos advogados do dono da Odebrecht, que alegam ter sido um bilhete conseguido pela polícia de forma ilegal.
No caso de um documento ter sido produzido por alguém que não pode confirmar se ele é ou não autêntico, por morte, por exemplo, a defesa pode alegar que o estilo do texto é diverso, ou possui diferenças gritantes do usado normalmente pelo suposto autor.
Sendo a acusação feita por semelhanças, a defesa pode argumentar que há impropriedade nas comparações. Por exemplo, alega que os fatos associados com a situação de outros países não podem ser comparados com uma realidade tão diferente como a nossa. Já que possuímos cultura, história, situação econômica e social muito distinta.
Da mesma maneira, os exemplos históricos também são rejeitados, pelo fato de terem ocorrido em outra época e dentro de uma realidade muito diferente da que vivemos hoje. Ainda com relação aos fatos históricos, havendo alguma dúvida quanto à sua veracidade, a defesa simplesmente os considera falsos ou tendo caráter duvidoso.
Seremos observadores
Essas são algumas estratégias utilizadas pelos acusados na tentativa de se livrarem das penas que lhes seriam impostas. Como é possível avaliar, até que alguns desses criminosos sejam privados da liberdade, assistiremos a muitas marchas, contramarchas, provas, argumentos, refutações, e discursos indignados e eloquentes.
Assim, além das decisões judiciais, como os motivos e os detalhes serão divulgados durante todos os processos, nós também poderemos fazer o nosso próprio julgamento. Que seja feita a justiça.

SUPERDICAS DA SEMANA
- Se os argumentos contrários se basearem apenas em hipóteses, basta negar
- Se os argumentos se valerem de documentos, mostre que não são autênticos
- Se a acusação for por testemunhos, a melhor defesa é a desqualificação
- Pessoas inocentes se mostram indignadas com as acusações que recebem


Surpreso com as revelações da Lava Jato? Veja outros casos de corrupção no país

BANESTADO -- O QUE FOI: Investigações localizaram cerca de US$ 30 bilhões em 137 contas do Banestado operadas por doleiros em um esquema de evasão fiscal na gestão de Gustavo Franco à frente do Banco Central. QUANDO: 1996 a 1999. DETALHES DO CASO: O dinheiro saiu do país por meio de offshores --empresas montadas em paraísos fiscais-- nas contas CC5, com depósitos valores inferiores a R$ 10 mil sem identificar o depositante. Celso Pitta (foto), ex-prefeito de São Paulo, foi um dos indiciados. QUE FIM LEVOU? A CPI foi encerrada sem que fosse votado o relatório final do deputado José Mentor, que sugeriu o indiciamento de 91 pessoas. O doleiro Alberto Youssef pegou dois anos de prisão por corrupção ativa --na ocasião ele fez sua primeira delação premiada para redução de pena.

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