quarta-feira, 24 de junho de 2015

O GOVERNO NÃO DEVERIA SER CONIVENTE COM A USURA



  

José Antônio Bicalho


A formação da burguesia e a Revolução Comercial na Idade Média se devem, em boa medida, à usura, ou seja, ao empréstimo a juros. Um homem que desejasse comerciar ou montar um negócio contratava um empréstimo junto a outro homem mais rico para adquirir mercadorias ou matérias-primas. Decorrido o tempo necessário para a produção, venda ou revenda dos produtos, o empréstimo, acrescido de juros, era pago. Cada parte saía feliz com seu quinhão de lucro.

O sistema funcionava bem e fazia florescer na Europa a Revolução Comercial, alçando, dia após dia, mais empreendedores à classe burguesa. O problema é que entre os usurários existiam espertalhões que cobravam exorbitâncias de juros de pobres coitados endividados. A eles não interessava dividir lucros de uma jogada comercial bem sucedida, mas matar financeiramente o tomador do empréstimo e despojar-lhe de suas posses.

Esses malandros foram usados pela igreja católica para uma condenação generalizada à usura. Foi no Concílio de Viena de 1331 que a igreja autorizou que a Inquisição julgasse e condenasse os praticantes da usura, que poderiam ser sentenciados a morte e terem seus bens tomados em troca da salvação de sua alma. Dessa forma, colocava-se um freio numa burguesia que ameaçava a antiga estrutura de poder, constituída por rei, senhores de terras e igreja. E também conseguiam uma desculpa para perseguir judeus, que eram os maiores praticantes da usura.

A justificativa teológica era a de que o usurário ganhava dinheiro com o tempo, e não com seu trabalho. E como o tempo a Deus pertence, ninguém poderia vendê-lo.

Mas, o fato é que nem mesmo a igreja teve forças para acabar por completo com os empréstimos a juros. E os usurários acabaram por cumprir papel importantíssimo no financiamento de praticamente todas as mudanças radicais posteriores: as grandes navegações, a colonização dos novos mundos, o iluminismo e a revolução francesa, a revolução industrial, a independência e a Guerra Civil Americana, o fascismo e (até) o comunismo, o bem- estar social europeu, a revolução tecnológica e a digital.

É interessante notar que o Brasil, que nunca teve uma estrutura de crédito a favor da produção, ficou à margem de todas essas grandes mudanças. Nossa colonização foi exploratória, a experiência iluminista acabou na forca de Tiradentes, a industrialização não se completou, entre o fascismo e o comunismo veio um arremedo de capitalismo que nos dividiu em classes de desiguais e nossa economia continua baseada na produção de bens primários em um mundo digital.

Por que não fizemos como o resto do mundo? Qual o motivo da nossa incapacidade para transformar crédito em desenvolvimento econômico e social? Os juros cobrado por meia dúzia de bancos que monopoliza nosso sistema de empréstimos é a resposta.

Nesta terça-feira (23), o Banco Central divulgou nova pesquisa de juro, referente a maio. No empréstimo rotativo do cartão de crédito, a taxa média subiu 13,1 pontos percentuais na comparação com abril, e agora está em (incríveis e absurdos) 360,6% ao ano. No cheque especial, a taxa subiu 6 pontos percentuais, para 232% ao ano. E a taxa média do crédito para as empresas subiu 0,3 ponto percentual, para 26,9% ao ano.

Lembra do malandro do exemplo acima, que foi a desculpa para a inquisição condenar a usura? Pois é, no Brasil todos os bancos cabem nesse exemplo.


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