José Eutáquio de Oliveira
Tudo que eu queria neste dia era
inventar uma noite muito, mas muito enluarada para a minha namorada. Daquelas –
sabe? – que suscitam as mais primitivas emoções poéticas que é exatamente o
estado como me sinto ao vê-las: a lua em noites de alumbramento e a namorada,
meu eterno encantamento. Ninguém não faz ideia do que eu queria também. Conto
agora. Queria ser diretor do departamento de milagres do firmamento, para
desenhar um céu salpicado de estrelas para enfeitar a noite do meu bem. E já
que estou com a mão na massa, mandarei colher nos quatro cantos do universo um
monte de rosas colombianas, daquelas bem bacanas, para adornar nossas camas com
o escarlate dos amores vulcânicos, ardentes; azuis, do meu amor eterno, forte e
raro; amarelas, da felicidade que é amá-la; brancas, da paz que ela me traz;
laranjas, de todo meu sentimento encanto; cor-de-rosa, dos carinhos que lhe
farei depois do amor.
Sossega coração! Estou apenas
começando cantigas piropos para a amada que é um desacato de bonita. E que, às
vezes, briga comigo, fala mal do meu umbigo por alguma irrelevância qualquer.
Então faz beicinho, sai pisando feio como que estreando sapato novo, desliga o
telefone na minha cara, não lê os meus torpedos de arreglo. Me põe de molho a
moça. Tem nada não. A dona que eu amo é assim mesmo, mas gosto de seu jeito de
mulher, arredia e complicada como fugir num rabo de cometa. Abri mão de
entendê-la. Descobrir os mistérios de uma mulher é como esperar caravelas
impossíveis na beira do cais.
Contento-me em saber que minha amada é
toda malícias e é feita de delícias. Ela é como ouvir Noel em Vila Isabel,
emprenhar blues em New Orleans, escutar o som rascante, quase obsceno, do
trompete do Miles Davis numa tarde de chuva. A mulher que manda em mim é jazz,
hip-hop, fox-trote, samba e baião. Flor de maracujá, pé de manacá, cerejeira na
primavera, cheiro de flor de laranjeira. Ela é meu vinho, aguardente dos meus
sábados, champanhes em taça de cristal, licor exótico e sensual. Meu bem, meu
mal.
Eita ferro! Café com pão, manteiga
não, café com pão, manteiga não... Lá vai o trem do meu desejo apitando
piu-iiiiiiií, piu-iiiiiiií mundo afora procurando a estação onde ela me espera
para receber meu coração. Ah, se essa rua fosse minha. Em vez de ladrilhar seu
leito, nela não deixava ninguém passar, a não ser a minha dona desnuda, apenas
calçada de sapatinho de cristal com o qual pisará o chão do seu cantor
destemperado. Toca a música Dj, mas toca ligeiro que não sei dançar tão devagar.
Hoje é o dia da minha namorada. Para
ela comprei os anéis de Saturno, os colares de brilhantes da princesa Diana,
encomendei ao Neruda versos galantes e apaixonados como os que o poeta seduziu
as fêmeas de seu tempo, combinei com o Chico de ele me adiantar letras e
músicas de deixar as mulheres de quatro. Mandei para a casa dela um café da
manhã daqueles bem mineiros que só e mais uns docinhos, quindim, amor em
pedaços. À noite, porém, o meu amor estará inteiro, moleque, faceiro, atento,
sedento. Pronto para a minha namorada. Hoje é o dia.

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