Luiz Carlos Louzano
Desde que o mundo é mundo é natural
que uma nova tecnologia seja vista com receio pela sociedade e combatida pelos
céticos ou mal informados. Por exemplo, em 1904 aconteceu no Rio de Janeiro a
Revolta da Vacina. A manifestação popular teve como causa principal a
obrigatoriedade da vacinação associada ao uso de métodos violentos para a
realização do procedimento, gerando medo e incredulidade na população quanto às
propriedades científicas da vacina contra a varíola. Outra celeuma se deu com a
fertilização in vitro na década de 70. O procedimento foi referenciado na época
como uma transgressão às leis naturais. Entretanto, após algumas décadas, essa
tecnologia permitiu o nascimento de cerca de cinco milhões de bebês, segundo a
Sociedade Europeia de Reprodução Humana e Embriologia.
Embora levado à mesa de milhões de
pessoas há mais de 20 anos, o alimento produzido a partir de grãos transgênicos
ainda é visto por alguns consumidores como algo inapropriado, que pode causar
malefícios à saúde e uma ameaça ao meio ambiente. Vale lembrar que já faz muito
tempo que não comemos mais as plantas do jardim do éden. A domesticação
(melhoramento) das plantas começou na pré-história e não parou mais. Em outras
palavras, a nossa dieta é composta por plantas que foram selecionadas e
geneticamente melhoradas num processo contínuo. Neste sentido, a moderna
engenharia genética e a técnica da transgenia são ferramentas nesse processo.
Como consumidores devemos muito ao domínio e evolução da agricultura que
possibilitou o melhoramento ininterrupto das plantas, adequando-as às demandas.
Do contrário não teríamos chances de sobrevivência.
Então qual a diferença entre a
agricultura na pré-história e a moderna agricultura? Hoje a engenharia genética
permite que as plantas sejam melhoradas. No jargão científico significa
transformada pelo uso de métodos precisos que conseguem, por exemplo, inserir
um ou mais genes na espécie agrícola de interesse. A agricultura moderna tem um
desafio colossal: segundo dados da agência da ONU para Alimentação e
Agricultura (FAO), até 2050 será necessário aumentar em 60% a produção de
alimentos. A engenharia genética ou biotecnologia vegetal coloca-se entre as
principais tecnologias que ajudarão os agricultores nessa jornada. Um exemplo
evidente é o das plantas resistentes a temperaturas mais elevadas ou à seca,
que já estão nos laboratórios e irão contribuir de maneira significativa para
minimizar os possíveis impactos gerados pelas mudanças climáticas.
Há de se levar em consideração que as
principais academias de ciências do mundo e instituições como a FAO e a
Organização Mundial da Saúde se preocupam com a segurança alimentar dos
alimentos produzidos a partir de plantas transgênicas e fazem análises
constantes de dados científicos. As conclusões são unânimes: as plantas
transgênicas aprovadas são equivalentes às convencionais. Portanto, não
representam risco para o consumidor ou para o meio ambiente.
Muitos ignoram o fato de que os
organismos geneticamente modificados (OGMs) são regulados por legislações
específicas e que a análise de risco é feita caso a caso, ou seja, cada produto
é examinado separadamente. No Brasil, a regulação é de responsabilidade da
Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), composta por especialistas
de diversas áreas do conhecimento científico, que avalia estudos sobre a segurança
dos OGMs e recomenda ou não seu uso comercial. Nosso marco regulatório,
reconhecido mundialmente, segue os princípios de equivalência nutricional e é
relativamente funcional. Contudo, há uma sobrecarga de procedimentos
burocráticos. O Brasil deveria ser um dos protagonistas nas discussões
internacionais sobre os processos de aprovação de transgênicos, já que estamos
entre os maiores produtores de alimentos. Com isso, teríamos mais chances de
evitar os entraves internacionais que dificultam ou impedem as exportações dos
grãos produzidos em terras brasileiras.
Agrônomo, diretor de Biotecnologia da
Unidade de Proteção de Cultivos da Basf para a América Latina
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